Crónica de Maria Donzília Almeida
Barra |
Do alto do seu pedestal,
sua majestade o Farol da Barra
assistiu, abençoou e piscou o olho
a mais esta cena da vida real
Tomar um banho nas águas bem frescas, do Oceano Atlântico,
na orla que abraça a nossa praia da Barra, é um ato que só os corajosos
empreendem.
Ouço, a cada passo, os banhistas queixarem-se que são águas
geladas, que afugentam a maioria das pessoas. Menosprezam o efeito revigorante
das suas temperaturas baixas em favor de águas mais temperadas e quase mornas,
na costa vicentina do Algarve. Aqui, o mar parece ”caldo”, no dizer de alguns
friorentos.
Apesar de apreciar muito o nosso Algarve por muitas e variadas
razões, não subestimo as nossas praias de areia branca e macia, beijadas pelo
ímpeto de altas ondas que arrojam ao areal as conchas e burgos que muitos
colecionam.
E…depois de um banho revigorante, de jogar uma partida de beach ball, o ritual de sempre –
saborear uma tripa, ali junto ao Café Farol, sob o amplexo do majestoso Farol
da Barra.
Ali, na barraquinha da Dª Elisa, a bicha cresce, mas o
prazer que se desfruta compensa sempre. Os clientes habituam-se e criam uma
certa fidelização a um determinado vendedor. O aroma que se evola da chapa,
onde o polme é colocado espalha-se na atmosfera que rescende a bolacha
americana.
Alinhava eu nesse tempo de espera que se vai gastando com a
conversa aqui e ali, estando no momento, a distrair o Telmo, um garotinho de
três anos, quando vi chegar a Maria. Vinha pela mão de uma jovem e cheia de
energia, queria meter-se com toda a gente. Era lourinha e com um olhar tão vivo
que cativou toda a gente. A jovem sorria extasiada perante a admiração e a
interação despertadas pela Maria, como qualquer mãe que se revê no seu rebento e
segurava-a na mão, não fosse ela fugir-lhe para o meio da rua, ou perder-se na
multidão.
A certa altura, estava toda a gente a acariciar a Maria,
incluindo o Telmo que descera do colo do pai, ainda à espera, na minha frente.
Com a atração que tenho pela pequenada, que me está na massa do sangue, também
fiz uma carícia na cabecita da Maria.
Com estas cenas de convívio intergeracional a ocuparem a
atenção dos aspirantes à famigerada tripa, quase nem se dá conta do longo tempo
de espera.
— É a minha amiga…a minha confidente…até dorme comigo na
cama! — confessou a jovem moça, num assomo de bonomia.
Com todos estes atributos…devo esclarecer… a
Maria era uma cadelinha ainda criança, arraçada de Labrador, já não propriamente bebé, mas situar-se-ia
numa adolescência incipiente. Cativou toda a gente pela sua energia
incontrolável e foi o centro das atenções daquela tarde de verão.
Do alto do seu pedestal, sua majestade o Farol da Barra
assistiu, abençoou e piscou o olho a mais esta cena da vida real.