no DN
Anselmo Borges |
1- No passado dia 27 de Abril, Ban Ki-moon, secretário-geral das Nações Unidas, inaugurou no Vaticano uma conferência sobre o meio ambiente, já no contexto da apresentação da nova encíclica papal sobre este tema, a publicar em fins de Maio, princípios de Junho. E Ban Ki-moon elogiou o Papa Francisco, que assumiu a liderança na luta pela preservação da natureza. Há hoje, disse perante líderes religiosos de várias confissões e assessores do Papa, grande consenso tanto entre líderes religiosos como entre cientistas no reconhecimento das alterações climáticas, que exigem por parte da humanidade um novo comportamento para "proteger o nosso meio ambiente: um urgente imperativo moral e nossos dever sagrado".
O secretário-geral da ONU acabou por repetir as advertências de Francisco: "Quanto às alterações climáticas, há um imperativo ético claro, definitivo e iniludível para actuar." "Para que as pessoas aprendam a respeitar a criação como um presente de Deus". Também neste domínio, Francisco quer seguir o exemplo do seu homónimo, Francisco de Assis, patrono dos animais e da natureza, que olhou para os seres da criação como irmãos, e espera que a sua encíclica contribua para que a humanidade toda tome mais consciência do seu dever de proteger a Mãe Terra, nomeadamente através das conversações sobre as alterações climáticas, em Paris, em Dezembro próximo.
2- No contexto da modernidade e no quadro da subjectividade moderna, que tudo objectiva, a natureza tem sido considerada simplesmente como objecto e reservatório de recursos a explorar pelo homem. Mas os sinais de alarme estão aí e são muitos os peritos a chamar a atenção - vou seguir a obra importante de Leonardo Boff: Sustentabilidade. M. Löwy: "Todos os semáforos estão no vermelho: é evidente que a busca enlouquecida do lucro, a lógica produtivista e mercantil da civilização capitalista/industrial nos levam para um desastre ecológico de proporções incalculáveis; a dinâmica do crescimento infinito, induzido pela expansão capitalista, ameaça destruir os fundamentos naturais da vida humana no planeta." Partindo da ameaça que pesa sobre a vida humana, o famoso biólogo E. Wilson, criador do termo "biodiversidade", escreveu a obra A Criação: Salvemos a Terra. O geneticista A. Jacquard escreveu, na sua obra Le Compte à Rebours a-t-il Commencé?, um capítulo com o título dramático: "A preparação do suicídio colectivo." O bioquímico e médico James Lovelock, autor da teoria de Gaia - a Terra como superorganismo vivo - e da obra Gaia: Alerta Final, prevê para finais deste nosso século XXI o desaparecimento de uma grande parte da humanidade.
Hoje já muito dificilmente se pode duvidar da responsabilidade do homem pelo desastre que se anuncia. Cada pessoa emite por ano quatro toneladas de dióxido de carbono e a humanidade toda 3000 milhões de toneladas. A pergunta é: como poderá a Terra digerir esta carga de veneno? De qualquer modo, os desastres naturais evidenciam a incapacidade de manter o seu equilíbrio. I. Ramonet (Le Monde Diplomatique, 13/05/2012) afirma que, em 2010, 90% dos desastres naturais foram consequência do aquecimento global, causando a morte de 300 000 pessoas e um prejuízo económico de 100 000 milhões de euros.
3- Ecologia, economia, ética remetem, no seu étimo, para casa, morada. Ecologia (de oikos e logos) é o discurso e o tratado da casa; economia (de oikos e nomos) é a lei, o governo da casa; ética (de êthos) é o comportamento que se deve ter para habitar a nossa morada.
Temos cada vez mais consciência de que a nossa morada comum é a Terra e o governo da casa é o da casa comum de toda a humanidade. Somos uma só humanidade e temos uma só casa comum e uma única história e destino comuns. E todos os seres humanos são iguais e, para serem éticos, os princípios pelos quais nos regemos devem poder ser universalizados. Ora, o actual consumo dos ricos não é universalizável. Um norte-americano consome em média seis vezes mais do que um indiano. A humanidade continua dividida entre os que beneficiam dos recursos da natureza e da técnica (uns 20%) e os que estão à margem e abandonados (os outros 80%). Se quiséssemos universalizar o nível de consumo dos países ricos, precisaríamos de três Terras iguais àquela em que habitamos. Aproximamo-nos dos limites da Terra e forçá-la faz que ela reaja na forma de furacões, secas, inundações, tsunamis e todos os tipos de catástrofes, continua Boff. Num mundo limitado, não é possível um progresso ilimitado. Impõe-se reduzir o consumo e entrar na moderação partilhada. Claro que precisamos de desenvolvimento, mas ele tem de ser sustentado e sustentável, pensando também nos pobres e nas gerações futuras.
Precisamos de um novo macroparadigma, para lá do antropocentrismo devorador. No dizer de Bertrand Piccard, "é preciso tender para a "ecomanidade", que alia ecologia, economia e humanismo".
Por decisão pessoal, o autor do texto não escreve segundo o novo Acordo Ortográfico
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