Uma reflexão de Georgino Rocha
O padrão de felicidade proposto por Jesus aos seus discípulos adquire novas facetas que dão rosto humano às bem-aventuranças. O ensinamento feito na montanha vai mostrando, por contrastes, a beleza e a elevação a que todos nós estamos chamados. A disponibilidade pronta e radical para ir mais longe e chegar ao fundo do coração é especialmente apreciada e destacada. E, vigoroso e atraente, brota o apelo/convite a viver, sempre, o amor perfeito que dá um novo sentido a situações consideradas positivas sob o ponto de vista legal e saneia completamente as negativas.
A pena de Talião – olho por olho, dente por dente – constituía um avanço civilizacional extraordinário, pois a retaliação ultrapassava a ofensa feita ou o prejuízo causado tantas vezes quantas as tradições preceituavam. Jesus abre novos horizontes a esta maneira de proceder e recomenda a não violência e o perdão sem medida. A justiça de reparação de danos será fruto desta vontade positiva de respeito pela pessoa e de avaliação das suas reais possibilidades. Que revolução pode desencadear esta atitude na gestão das relações humanas e na agilização da administração pública, na tendência a ripostar a cada provocação e a excluir do círculo de amizade o prevaricador.
O relacionamento preconizado por Jesus tem uma fonte original: O amor de Deus e a sua forma de proceder para com todos. Ele não faz acepção de pessoas, “tal como” o sol ou a chuva. Para Deus não há amigos e inimigos. Há pessoas que são seus/suas filhos/as, a quem ama com o desvelo de Pai. Desta fonte original nasce a seiva humanizante dos laços familiares, das regras humanas, da convivência social, da civilização do amor. Nasce e robustece-se, sendo configurada pelas culturas e tradições, valores e opções. Aqui se alicerça a subjectividade da sociedade que somos chamados a organizar de forma humana, ética e funcional.
Os contrastes são provocantes. Expressa-o bem Santo Inácio de Loyola ao desenhar uma nova maneira de se situar no mundo: estar disponível de tal modo que desejemos e escolhamos apenas o que nos conduz ao fim para que fomos criados. Os outros bens devem ser preferidos só na medida em que estão ao serviço desta finalidade: riqueza/pobreza, saúde/doença, honra/desonra.
Jesus reforça os ensinamentos com o recurso a outras situações/limite: dar a manta – agasalho indispensável -, dar a face e “dobrar a parada” – ir além do exigido por lei -, rezar pelos perseguidores, amar os inimigos. E o limitado amor humano será espelho do Amor perfeito de Deus, nosso Pai. Que encanto e apelo!