CHEIOS DE ALEGRIA AO VEREM O SENHOR
Georgino Rocha
Cerâmica de Jeremias Bandarra (Igreja da Costa Nova) |
A alegria surge espontânea no coração dos discípulos e mostra-se exuberante ao verem o Senhor. E São João - o narrador desta cena de aparição de Jesus – anota outros sentimentos e atitudes: o medo cede lugar à confiança, o limite das portas fechadas na memória do passado e sem perspectiva no presente é superado pela novidade de horizontes que se entreabrem, a dúvida tormentosa e asfixiante da situação vivida dissipa-se com a certeza alegre e contagiante provinda da visão do Ressuscitado, a agitação interior serena com a oferta da paz, a sensação de abandono e orfandade é vencida pela doação do Espírito Santo, presença amiga e revigorante, a consciência do pecado da negação e deserção é regenerada pelo perdão sanador e recuperante.
O rosto dos discípulos era o espelho da sua transformação emocional, anímica e espiritual, da sua atitude de vida, da sua decisão face aos acontecimentos. Uma nova etapa começa e com que determinação e vigor. Etapa marcada pela alegria e confiança no Senhor sempre presente, pela certeza de que é o Espírito quem guia a missão de que ficam incumbidos, pela ousadia nas iniciativas de serviço em prol dos “feridos da vida”, pela sementeira da paz em todos os corações, pelo dinamismo do futuro que irrompe no presente de forma germinal.
Ver o Senhor em comunidade e não isoladamente, na celebração dominical e não apenas na devoção privada, na assembleia reunida em seu nome e não somente na intimidade pietista e evasiva. Ver o Senhor que ilumina a realidade envolvente e faz ressaltar os esforços e êxitos humanos como sinais dos valores do Reino ( e tantos são, felizmente!). Faz também identificar aquelas zonas do coração e da convivência social em que predominam as sombras da injustiça, da desonestidade, do individualismo desumanizante, da miopia tacanha face à sorte de tantos irmãos nossos em humanidade e, quem sabe!, nas convicções religiosas e na fé cristã.
Aspirar a ver o Senhor, como Tomé, faz parte do melhor do ser humano. A contemplação mística aponta-nos esse caminho. No entanto, a visão directa só acontecerá quando o tempo ceder lugar à eternidade e o nosso corpo mortal ao corpo glorioso, na comunhão com Deus e no seio da sua família santa. Entretanto, o Senhor deixa-se ver em sinais colocados ao nosso alcance: as feridas de quem sofre o peso da cruz diária e as chagas do mundo, a construção da paz na justiça, o amor que perdoa sem reservas, o encontro amigável e fraterno, a assembleia dominical, a escuta agradecida da Palavra, a celebração da eucaristia, o recurso aos sacramentos, o envolvimento missionário para que todos possam acreditar e ter “a vida em seu nome”. Ver e tocar. Este é o caminho para a autêntica alegria cristã.