PITADAS DE SAL – 22
GAFOS NA ILHA DE SAMA
Caríssima/o:
Já aqui no “Tecendo …” tive ocasião de escrever:
«Brumas do tempo!
Brumas da Ria!
Quem é destas terras e aqui tem as suas raízes, conhece bem os nevoeiros da vida e da Ria. Ainda mais quem algum dia penetrou profundamente pelos canais e neles deambulou perdido por nada ver à sua frente!...»
João Pereira de Lemos escreveu um livro: «Os Gafos da Ilha de Sama». E como que em subtítulo afirma: "Narrativa quase verdadeira do que se passou na vila de Aveiro, entre 1525 e 1581, porque o mais se não acha pois está no guarda-roupa del-Rei".
Estamos, pois, no mundo da ficção… A ilha de Sama é povoada… e daí parte a colonização da Chave…
“Um dia, quando sentado no beiral de areia do lado poente, admirava o sol rubro que se encaminhava para o ocaso, [Pedro] pensou que talvez o areal em frente onde não se via vegetação, fosse a chave para a solução do excesso de pessoas na ilha de Sama. Virou-se para Filipa que estava a seu lado e disse:
- Parece que encontrei a chave para os nossos problemas aqui na ilha. Vou convidar alguns daqueles em quem mais confio e vamos estabelecer-nos no outro lado. Pedirei a Yssuf para descarregar lá tábuas e troncos e outros utensílios e procuramos um lugar para nos instalarmos.
Em Sama ninguém era tratado pelo nome ou pelo apelido, todos eram iguais e, por isso, usavam alcunhas. Pedro de Lemos o “Samarrão”, alcunha que advinha de à noite andar com uma grande samarra – vestimenta pastoril de pele de ovelha com lã, e que os médicos aconselham a não usar sobre a epiderme, pois julgam ser a causa de epidemias -, passou palavra ao Jorge “Fidalgo” porque assim o era, ao André “Cravo” porque parecia ter muitos cravos na cara, ao Belchior “Sardo” porque pareciam sardas as pústulas já secas, ao Simão “Gafanhão” porque ele era forte, ao Sebastião “Lázaro” porque era lazarento do corpo e alma sofredora diga-se, ao Pedro “Vaz” diminutivo apressado de Alvaraz, Gaspar “Casqueira” porque passava o tempo a fazer barcos das cascas que encontrava e pedia a toda a gente para lhas arranjar, e o António “Conde” porque se dizia como tal e todos sabiam que assim não era e não passava dum pobre diabo!
Combinaram, em segredo, no dia 16 de Julho de 1545, dia de N.ª S.ª do Carmo, e à noite, …»
Será que a realidade navega por águas distantes?
Manuel