quarta-feira, 16 de maio de 2012

REVERÊNCIA NÃO É SUBSERVIÊNCIA NEM DEMAGOGIA

POR ANTÓNIO MARCELINO




As relações dos leigos com a hierarquia não dão lugar a atitudes de alternância de poderes. Dada a natureza da hierarquia, por vontade de Cristo um serviço permanente ao Povo de Deus, as relações mútuas estão marcadas por um sentido de comunhão e de fraternidade. São relações de prontidão e obediência cristã, em relação ao que é estabelecido pelos pastores da Igreja, não arbitrariamente, mas como representantes de Cristo, no seu papel de mestres da fé e responsáveis pela comunhão e unidade na Igreja.
Esta relação, diz o Concílio (LG 37), se marca um dever, não pode esquecer, porém, o direito de “os leigos receberem, em abundância, os bens espirituais, sobretudo os auxílios da Palavra de Deus e dos sacramentos; de manifestarem as suas necessidades e os seus desejos com liberdade e confiança”. “Têm a faculdade e até, por vezes, o dever, de manifestar o seu parecer no que se refere ao bem da Igreja”. Para isso existem os órgãos de corresponsabilidade e participação, como os conselhos pastorais e económicos, as assembleias e outros modos de participação, segundo os locais e as circunstâncias. Mas nada disto impede de que o façam pessoalmente, se for caso, sempre “com verdade, fortaleza e prudência, mostrando respeito e caridade para com aqueles que, por motivo do seu ofício sagrado, fazem as vezes de Cristo”.
Estes deveres e direitos dos leigos, obrigam os pastores, como os mais responsáveis das comunidades, diocesanas ou paroquiais, a que “reconheçam e tornem efetivas a dignidade e corresponsabilidade dos leigos na Igreja; aproveitem, de bom grado, o seu conselho prudente; lhes confiem serviços para o bem da comunidade cristã, e lhes deixem liberdade e campo de ação; os animem a empreender outras obras por iniciativa própria; e considerem, diante de Deus e com paternal afeto, as iniciativas, as propostas e os desejos manifestados pelos leigos. Hão de ainda reconhecer e respeitar a justa liberdade que aos leigos compete na sociedade civil”. Um campo difícil, mas que não admite subterfúgios.
Todos reconhecemos que um longo caminho resta para andar. O clericalismo persiste um pouco por todo o lado, e a atitude de muitos leigos, cansados de esperar ou com deficiente formação cristã, torna-se, por vezes, agressiva e intolerante. Quando se vive em clima de mando e de reivindicação, sempre a evitar, as relações mútuas tornam-se impossíveis, e desaparecem as vantagens para a Igreja, um povo de irmãos, sinal novo de uma presença e de uma ação indispensáveis. Quando não são respeitados, assim recorda o Concílio, os leigos perdem o sentido de responsabilidade própria, desaparece o seu entusiasmo, esfuma-se o propósito de unir forças que poderiam tornar mais operoso o trabalho dos que presidem à comunidade.
Ao lermos os resultados da recente amostragem sobre a Igreja e a sua presença na sociedade portuguesa, não podemos deixar de considerar o estilo das relações, hierarquia-leigos, que persiste e leva, por vezes, alguns a abandonar a paróquia e até mesmo a Igreja. Sem o acolhimento capaz, a dignidade reconhecida e o respeito devido, não é possível o diálogo construtivo, hoje necessário, para que se manifeste a verdade do Evangelho, a originalidade da comunhão no seio da Igreja e a presença significante desta na sociedade, que não se opera sem os leigos cristãos.


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