Por Maria Donzília Almeida
Família de D. Duarte Pio
“Onde há galos, não cantam galinhas!”
Era esta a ideologia dominante, na
sociedade portuguesa, até ao 3.º quartel do século passado. Vivia-se numa
sociedade patriarcal, em que o homem, como único angariador do sustento da
família, era o detentor da autoridade. Num meio, predominantemente rural, em
que o nível de literacia era baixo e a informação chegava a passo de caracol,
era comum, a mulher acatar, até de bom grado esta supremacia masculina! O “galo”
impunha o seu domínio e ninguém ousava, sequer contestá-lo. Parece que aqui,
nas Gafanhas, num sentido vanguardista de elevação da mulher, este domínio não
era assim tão literal, já que o homem nomeara a esposa de sua “patroa”! Era ela
a gestora doméstica, a quem ele entregava, religiosamente, a”féria” do seu mês
de trabalho.
Na
família semi-numerosa, onde cresci, as “frangas”, debaixo da asa protetora da
mãe-galinha, eram em número suficiente para urdir, na surdina, a sua contestação
e, aos poucos, iam saindo das cascas! Lembro-me, ainda que uma das conquistas
desta “maçonaria” foi a idade de 18 anos, como permissão oficial do início do
namoro! Comparado com os tempos de hoje, em que os putos quase começam a
namorar de cueiros, é um atraso de vida, mas havia alguma maturidade, nesse
passo que se dava na juventude.
Apesar do lapso de tempo transcorrido,
desde o declínio desse modelo de família patriarcal, palpita-me que ainda hoje,
no século XXI e segundo milénio, há ainda famílias onde, anacronicamente, se
pratica este regime autocrático! Resistência à mudança!
Com os treinos e as estratégias para
“fintar” o galo, que não fazia mais que cumprir o seu papel de autoridade
familiar, adquiri um know how
precioso! Posso dizer, que a emancipação conquistada, me permite hoje, ser
completamente invulnerável a qualquer tipo de jugo galináceo!
Antigamente os papéis do homem e da mulher,
num lar, eram muito bem definidos. Cabia ao homem o sustento do lar e à mulher,
a manutenção do mesmo. Com o passar do tempo, a mulher parte em busca da sua
realização profissional, uma vez que também sente a falta de um complemento, no
sustento da família. Perante este quadro, as relações familiares sofrem
profundas mudanças. A mulher passa a ocupar diversas funções, dentro da
dinâmica familiar. Ela continua responsável pelos cuidados da casa e dos
filhos, e na maioria dos lares, colabora para o sustento familiar. Para
sobreviver a esta situação, a mesma passa a delegar noutras pessoas: empregadas
domésticas e até no próprio cônjuge.
No Século XIX, com a Revolução Industrial
Inglesa, ocorre um enorme desenvolvimento tecnológico voltado para a produção
de mercadorias e acumulação de capital. Neste processo há uma maior inserção
feminina.
Durante
muitos anos, a figura da mulher, como esposa e mãe é valorizada nos seus
aspetos de submissão e fidelidade ao homem, chefe de família! A hierarquia
familiar está bem definida: acima de todos, o marido que decide e governa o
lar; abaixo dele a esposa, fiel e submissa, no último lugar os filhos submissos
e obedientes às decisões paternas.
O
Estado Novo exaltava a figura da mulher, mãe em exclusividade! Para isso, criou
um curso, na antiga Escola Comercial e Industrial, onde, a par da formação
profissional de eletricistas, serralheiros, mecânicos e comerciantes, fornecia
uma primorosa Formação Feminina, às raparigas, aspirantes a donas de casa e a devotadas
mães de família. A suprema realização da mulher, ser a fada do lar! A figura da
mulher culta, não entrava nestes parâmetros de organização familiar e social.
A
mulher tem uma caminhada de luta até alcançar a vitória. Os preconceitos
estavam enraizados. Até Aristóteles diz: “A mulher é por natureza inferior ao homem,
deve pois obedecer!” Com o tempo, a mulher começa a rejeitar esse
modelo e a lutar pele igualdade de direitos, perante o homem. O próprio facto
de começar a trabalhar fora, (o trabalho doméstico não era contabilizado/era
desvalorizado) contribuiu em muito para essa emancipação.
A família é uma referência essencial para o
indivíduo. É o primeiro e mais importante grupo social onde se desenvolve e
autonomiza, permitindo ao mesmo tempo criar um sentimento de pertença. Em todas
as culturas, a família assume uma função socializante, facilitadora da
integração do indivíduo na sociedade Hoje em dia, as famílias são constituídas de forma diferentes de antigamente.
Antes, eram apenas compostas de pai, mãe e filhos, pessoas de sexo diferente. Hoje
em dia, existem diferentes formas de se constituir uma família: indivíduos do mesmo
sexo; apenas um progenitor, monoparentais, entre outras. Há mulheres que querem
ter filhos, mas não querem constituir família – coabitar com o pai, a chamada
produção independente!
A Família como expressão máxima da vida
privada é lugar da intimidade, construção de sentidos e expressão de
sentimentos, onde se exterioriza o sofrimento psíquico que a vida nos traz. É
um campo de mediação por excelência. Surgem nas relações familiares, inúmeros
conflitos, pois nem sempre há entendimento, quanto à atribuição de papéis.
Vivemos numa sociedade hedonista, onde a
busca desenfreada do prazer, não casa bem com o espírito de tolerância,
respeito e fidelidade, alicerces duma sólida estrutura familiar.
A família atual atravessa uma crise de
estrutura e de valores. A condição sine
qua non, para se estabelecer uma família, é a união entre duas pessoas que
se amam, a que antigamente se chamava... casamento. Hoje, este está em
notória decadência e os jovens de hoje, não casam! Preferem “juntar os
trapinhos” sem papéis, isto é, sem compromissos. Quando a convivência pacífica
se esgotar, partem para outra, sem quaisquer gastos adicionais. Um divórcio
fica muito caro! P’ra quê assinar o “contrato”, se daí a pouco se vai desfazer
com tão grande dispêndio de energias e dinheiro? O casamento, outrora, tinha entre
outras funções, participar à sociedade, a mudança de estado daqueles jovens que
tinham decidido viver em comum e constituir família. Hoje, os casamentos que
ainda sobrevivem à derrocada da instituição, fizeram florescer e medrar(!!!) a
indústria de organização de eventos! Os casamentos, da nova era, são um ritual
de ostentação, revestida de fausto e espavento, numa fraca imitação dos
casamentos reais!
Para ajudar ao desmoronamento da família,
surgiu, nesta era da modernidade, a chamada “amizade colorida”, que numa relação
de tête à tète é o expoente máximo do
descartável!
Atenta à crise de que enferma a família,
hoje em dia, a pastoral da igreja para as famílias, tem envidado esforços no
sentido de promover, estimular e acarinhar a coesão familiar. Neste sentido,
vai organizar uma mega concentração de famílias, em Calvão, no próximo domingo,
20 de maio.
Hoje, mudaram-se os tempos, mas não os
traumas e desequilíbrios que sempre acompanham os filhos do divórcio. Estes ficam
órfãos de afeto, de orientação, enfim da estabilidade psicológica de uma família
estruturada. Mas, vou ter a ousadia de deixar aqui, referência, ao meu modelo
de família, àquela de que faço parte por direito, a Sagrada família! Sou... de Jesus....
15.05.2012
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Nota: É natural que alguns leitores se questionem sobre a imagem que ilustra este texto. A sugestão partiu da minha colaboradora assídua, atenta e amiga Donzília, lembrando que, das famílias mediáticas, a família de D. Duarte pode ser considerada exemplar, no respeito pelas nossas tradições e pelos valores em que fomos educados e nos enformam. Trata-se de uma família unida, longe dos escândalos, solidária e preocupada em difundir e viver o amor à pátria e aos outros, na diversidade das opões de cada português. Como muitas outras, certamente.