Mais que retângulo político ou feira da ladra
António Rego
O mundo de hoje não é um mapa cor-de-rosa. Anda sacudido por violentas convulsões políticas no norte de África e médio oriente, restos de sismos, chuvas descontroladas, tornados avassaladores em vários pontos do globo. E esse recente abalo três vezes trágico acontecido no Japão que nos acentua a fragilidade e impotência perante as forças descontroladas da natureza em terra e mar. Mas nos lembra alguns erros crassos dos nossos cálculos de resistência face às forças lógicas e cegas de falhas tectónicas, aluimentos de terras, ondas alterosas que parecem fazer voltar contra nós todas as suas fúrias. A isso se associa a maior força que criámos até hoje – a atómica – que contra nós se voltou quando se lhe pedia um serviço pacífico de energia para os nossos gastos úteis e inúteis. Afinal repetiu-se Hiroshima.
Para os nossos lados vamos esmorecendo em crises, multiplicando debates, análises, anatomias, discursos e comícios, sentindo cada dia subir mais a onda dos juros, impostos, falências e desemprego que nos tornam mais pobres, dependentes e possivelmente mesquinhos, resguardando mais os nossos cofres pequenos e grandes com medo de que a miséria dos outros os assalte. Apesar de continuarem as réplicas políticas sobre as culpas deste ou daquele, começa a compreender-se que isso é irrisório face à dimensão dos problemas que vivemos. Alargando o olhar para o grémio mais espaçoso a que pertencemos – a Europa – invade-nos a dúvida. Pertencer à União é mais que pagar na mesma moeda, apesar de sabermos que em negócios, ninguém dá nada a ninguém – amigos, amigos, negócios à parte. Mas a pergunta é esta: que somos para a Europa? Que é a Europa para nós?
E aqui entramos noutra história: o que nos fez entrar na Comunidade Europeia? Por quê e para quê fomos convidados? Que significado têm os discursos e análises de história comum e elementos culturais, políticos e patrimoniais que nos podem agregar num mesmo barco sem perdermos a nossa identidade?
São questões que nos envolvem e onde pode estar alguma saída para o presente impasse. Mas não separadas de outra: a nossa nacionalidade como identidade primeira de povo. Que a todos nos envolve, responsabiliza e lança para mais um desafio que não é o primeiro nem será o último da nossa história. Assim entendido, o país exige justamente outro olhar, aberto, solidário, comprometido. Onde o todo é mais que a soma das partes, o país é mais que uma pessoa, um chefe, um partido. O facto de termos matriz e vida cristã em muitos pontos da nossa terra e do planeta acentua o empenhamento onde a solidariedade se torna urgente e eficaz. Isso só é possível se definirmos Portugal como um povo e não como um retângulo político ou feira de compra e venda.