António Redondo
Um ex-emigrante com saudades repartidas
Fernando Martins
António Redondo, 75 anos, alfaiate de profissão, ex-emigrante nos EUA deste os 45, vive com as saudades repartidas, entre o seu torrão-natal e a terra do Tio Sam. Tão-só por ter família direta em ambos os lado.
Depois de reformado, passou a esta situação de pessoa dividida, com o pensamento ora numa terra ora noutra. O mais recente Natal passou-o na América, mas está de volta, até as saudades o convidarem a meter-se no avião, de que não gosta nada, para viver uns tempos com os dois filhos casados e quatro netos que vivem e trabalham nos Estados Unidos. Volta a saltar para aqui, na Gafanha da Nazaré, continuar com o filho, também casado, e neto. Os primeiros gostam da vida americana e o segundo optou pela terra dos seus antepassados.
O António Redonda, alfaiate desde muito jovem, um dia resolveu emigrar, levado pelo sentido de conquistar um futuro melhor para si e para os seus. Na América ainda chegou a exercer a sua profissão, em que era mestre de bom gosto. Os tempos mudaram e viu-se obrigado a seguir outras ocupações. O pronto-a-vestir ia conquistando espaço e não havia volta a dar-lhe. Mas se fosse preciso, por gosto, ainda seria capaz de cortar um fato, alinhavá-lo, prová-lo e cosê-lo, de modo a cair bem ao freguês.
Sempre vimos o Redondo envolvido na comunidade paroquial da Gafanha da Nazaré, com grande destaque em alguns períodos, sobretudo no tempo da JOC, de que chegou a ser responsável pela Pré-JOC. Depois na Comissão Fabriqueira e na Comissão da construção da igreja da Cale da Vila, a que se entregou com afinco. E desta última, lembra, em conversa connosco, os esforços e entusiasmos que todos puseram nessa tarefa. E desafiado a recordar esses períodos da sua vida, não deixou de trazer até ao presente memórias de gente que deu o seu melhor para bem da comunidade católica.
Recorda as dificuldades na compra dos terrenos indispensáveis para a construção da igreja, para juntar ao que fora oferecido pela sua tia Clementina. Esta sua tia, solteira e sem filhos, que viveu como empregada doméstica do capitão João Maria Vilarinho e família, acabou por doar os seus bens à nossa igreja, depois de conversar com os sobrinhos.
O nosso entrevistado lembrou que o Manuel Serra, atual presidente da Junta da Gafanha da Nazaré, fez os projetos da igreja da Cale da Vila, dedicada a São Pedro, incluindo os demais estudos e cálculos, estes elaborados pelos seus amigos, sem qualquer encargo para a nossa comunidade. Falou ainda de um ex-emigrante na Venezuela, de nome Sebastião, que se ofereceu para trabalhar nas obras, gratuitamente, como qualquer operário, desde os alicerces até à conclusão, colaborando também na recolha de fundos. Evocou muitos outros (registados apenas nos livros à guarda de Deus), que nunca regatearam esforços em horas de mais aperto, quer quanto às tarefas a executar, quer quanto a verbas necessárias.
Em dada altura, o Redondo frisa que, ao contrário do que se apregoava, nunca houve a preocupação, da parte da Comissão de Obras, de dividir a paróquia em duas.
Quando emigrou, o nosso entrevistado não guardou em qualquer mala, fechada a sete chaves, o seu amor à Igreja e os seus hábitos de colaborar, muitas vezes em prol da sua e nossa terra. Pertenceu, por isso, a instituições, de que destaca a Associação Recreativa e Cultural Gafanhense, que organizou festas, cujas receitas reverteram para o Lar Nossa Senhora da Nazaré. Neste caso, constituiu-se até uma Comissão com sócios da Gafanha da Nazaré, que conseguiu fundos para o referido Lar e para O Grupo Desportivo da Gafanha.
Em dado passo da conversa que tivemos, o Redondo frisou que na época do Natal apresentaram, em três anos, no salão da igreja, os autos e os cânticos natalícios da nossa terra, cujos papéis e músicas levaram daqui. Não se fez o cortejo, porque o inverno rigoroso não o permitiria. Ainda puseram de pé a Via-Sacra ao vivo, pela rua, graças ao empenho especial de sua filha Lurdes e de outros jovens, iniciativa que continua a ter lugar com a envolvência de muita gente.