quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

O direito dos pais e o caminho da democratização


Por António Marcelino

O direito de ensinar e de aprender e o direito consequente de os pais poderem escolher livremente a escola e o projecto educativo para os seus filhos, sem que com isso seja onerados financeiramente, são direitos constitucionais a respeitar e a promover. O dever do Estado é proporcionar o ensino gratuito a todos os alunos, garantir um serviço público de ensino que tal permita. Não leva necessariamente consigo ao facto de ter apenas escolas estatais e, só por necessidade ocasional, algumas escolas privadas. Um serviço público de ensino qualificado, seja ele ministrado pelas escolas estatais ou pelas escolas privadas, é um postulado democrático. Não fora assim e não se encontraria mais justificação para nos dizermos, neste campo, uma democracia plena. Onde se impede a iniciativa privada caminha-se a passos largos para a estatização. A Constituição só será verdadeiramente democrática quando deixar de predeterminar o rumo do país e der espaço, com regras de bem comum, aos cidadãos e às instituições na sua legítima participação no bem público. A democracia não é um acto de generosidade ou de necessidade do governo. Não existe uma semi-democracia que o governo usa quando lhe agrada ou lhe interessa. Em democracia não é aceitável o dualismo “governo e povo” O governo provém do povo e é inseparável dele, como seu servidor, a sua única razão de ser.


O ensino privado, em todas as suas expressões e, mormente por via de contratos de associação, nunca é concorrente do Estado. No ponto de vista educativo ele concorre sim para a formação de cidadãos qualificados, que servem o país em todos os sectores de vida. No aspecto económico, mesmo quando proporciona um ensino gratuito, ele poupa diariamente dinheiro ao Estado; no aspecto educativo e escolar, liberta o Estado dos inúmeros problemas que todos os dias afectam muitas escolas. Não foi por este ensino que se chegou à crise, económica, social e política. Se a gente do sistema, liberta de preconceitos ideológicos, se sentar para pensar a olhar a realidade e também a realidade dos números, depressa poderá verificará o mal que faz ao país quando menospreza ou dificulta o ensino privado.
A atitude antidemocrática do governo, mais marcante ainda no caso actual, de anulação de contratos bilaterais existentes, é unilateral e como tal decidida. Não pode deixar insensíveis outros órgãos da soberania pelo precedente grave que introduz no exercício do poder político. Assim, este aparece mais comprometido com a ideologia que o sustenta e com a pressão dos acontecimentos que criou, que com a justiça e o bem de todos os cidadãos. A ideologia, se vale, é para ser posta, legitimamente, com a sua originalidade, em diálogo com outras ideologias em campo, ao serviço do maior bem de toda a comunidade nacional e não apenas de alguns cidadãos da mesma.
Um governo não democrático torna-se incapaz de ser plural e de promover o pluralismo legítimo. Tudo se manifesta no modo como são tratados os que não concordam com ele, sejam pessoas ou instituições.
Para a plena democracia, o governo, ao respeitar o direito dos pais de escolherem, livremente, a escola e o projecto educativo para os seus filhos só tem, como caminho certo, promover a escola privada qualificada. Só assim haverá escolha, onde ela já é possível, terminando deste modo a via única. As escolas privadas, qualquer que seja o seu estatuto e relação com o Estado, considerado cada caso, são de facto o caminho normal para a democratização. Certamente que nas escolas com contrato simples se agirá de modo diferente do das escolas com contrato de associação, mas o objectivo é sempre o mesmo. Na fidelidade aos princípios e no diálogo sobre a realidade concreta se encontrará sempre o caminho. Mas, também aqui, se o governo democrático quiser ser coerente.

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