Padre João Gonçalves
“Ceia com Calor” recebe
“Troféu Português do Voluntariado 2010”
Fernando Martins
A Confederação Portuguesa do Voluntariado atribuiu ao projecto “Ceia com Calor”, das Florinhas do Vouga, o “Troféu Português do Voluntariado 2010”. Aquela organização reconheceu o «mérito da sua actuação», nomeadamente, no combate à exclusão social e à pobreza, mas ainda considerou a «capacidade de mobilização de voluntários organizados», o «espírito empreendedor» e o «envolvimento da comunidade empresarial e escolar» no seu trabalho.
“Ceia com Calor” nasceu há três anos como resposta aos sem-abrigo da cidade de Aveiro, havendo a preocupação de motivar a comunidade aveirense e arredores. Trata-se de um serviço complementar de outras valências da instituição fundada em Outubro de 1940 por D. João Evangelista de Lima Vidal, primeiro bispo da restaurada Diocese de Aveiro.
Esta iniciativa mobiliza presentemente 85 voluntários, utilizando uma carrinha com espaço para atendimento individualizado a prestar pelos técnicos da instituição, numa linha, fundamental, de contribuir para a inserção ou reinserção social de pessoas de algum modo marginalizadas ou automarginalizadas.
“Ceia com Calor” surgiu quando se percebeu que os sem-abrigo nem sempre recorriam à “Cozinha Social” para almoçar ou jantar, mas também por se reconhecer que esses utentes ficariam sem qualquer alimento entre o jantar e o almoço do dia seguinte. «Essas pessoas ficavam muito tempo sem comer mais nada; entendemos que era necessário dar-lhes um reforço alimentar durante a noite e assim estamos a fazer, com a colaboração de voluntários e de outras valências das Florinhas do Vouga», adiantou-nos o Padre João Gonçalves, presidente da direcção da instituição.
Todos os dias, entre as 21.30 e as 23 horas, as equipas estacionam em dois sítios, concretamente no Largo da Estação e no Rossio, em Aveiro, esclarece o Padre João, que acrescenta: «As pessoas aparecem, comem e ainda levam um reforço alimentar para o pequeno-almoço; durante o dia podem almoçar e jantar na “Cozinha Social”, onde não faltam voluntários que ajudam e colaboram com as funcionárias das Florinhas.» Refere depois que «alguns sem-abrigo têm a sua auto-estima tão em baixo que nem sequer vão à Cozinha.»
A “Ceia com Calor” não se limita a distribuir alimentos e agasalhos, pois privilegia ainda a promoção da pessoa, recorrendo, se tal for necessário, a outras instituições e serviços oficiais. «A nossa ida onde essas pessoas estão é uma ocasião para se estabelecer uma relação pessoal muito concreta, com vista a ganharmos a sua confiança, fazendo com que lentamente entrem num processo de recuperação e de reinserção social», esclareceu o nosso entrevistado.
Sobre os que se envolvem nesta experiência, o presidente das Florinhas sublinhou que as equipas de voluntários são constituídas por quatro pessoas, havendo a preocupação de as visitas não rarearem, para que a «proximidade e a confiança» com os sem-abrigo se estabeleçam e se desenvolvam, com vista a um trabalho mais profícuo.
Partindo do princípio, compreensível, de que todo o voluntário precisa de formação, o Padre João Gonçalves afirmou que os interessados em viver esta experiência, em horas livres ou em tempo pós-laboral, se inscrevem nas Florinhas do Vouga, onde as técnicas os acolhem. Os voluntários, conforme as suas capacidades e carismas, poderão ser encaminhados para trabalhos com sem-abrigo, idosos, “Cozinha Social”, pessoas doentes e em solidão, e, ainda, para a valência “Mercearia & Companhia”, que distribui alimentos a famílias carenciadas. «Esta valência começou com 80 famílias e já vai nas 200, todas as semanas, como resultado da grave crise que todos sentimos», adiantou-nos.
Os voluntários recebem formação ao longo dos anos, obrigatória pelas leis estabelecidas pelo Secretariado Nacional para a Promoção do Voluntariado. «É um voluntariado a sério; as pessoas têm o seu cartão que as identificam como tal, com todas as suas regalias, direitos e obrigações; assumem compromissos e não podem vir hoje e faltar amanhã; é um serviço gracioso, mas com regras», esclareceu o nosso entrevistado.
«“Ceia com Calor” não alimenta a marginalidade — sublinhou o Padre João — porque é nossa obrigação “dar de comer a quem tem fome”; são casos de fome pública.» E explicou: «Este projecto é totalmente voluntário: são voluntárias as pessoas que colaboram, os bens que distribuímos que são oferecidos pelas padarias, pastelarias e outras empresas, mas ainda pelos particulares; apenas vamos levantar o que nos oferecem com as nossas carrinhas.» Curioso é o facto de os próprios voluntários, de vez em quando e quando podem, confeccionarem alguns pratos, como «sopa forte e até rojões».
Os voluntários e as ofertas não são apenas de Aveiro. Há pessoas da região e até de mais longe, como S. João da Madeira, Oliveira do Bairro e até da Figueira da Foz. Aderiram porque tiveram conhecimento do projecto através da comunicação social. São jovens e menos jovens, estudantes ou trabalhadores, universitários e professores de diversos níveis, padres e médicos, enfermeiros e empresários. E ainda há trabalhadores das Florinhas que fazem parte do grupo de voluntários da instituição, frisou o Padre João Gonçalves.