O desmontar da festa e o depois dos acontecimentos
António Marcelino
Sobre o pano de fundo de uma crise que explodiu para continuar, acontecimentos importantes mexeram com o povo. Com intensidade variada, contagiando esperança, abafando desgostos, derrubando indiferenças, provocando sonhos. Foi a vinda do Papa, a morte de José Saramago e, agora, o Mundial de Futebol. Este ainda com tenda armada.
Os acontecimentos sociais ou deixam marcas nas pessoas ou depressa se desvanecem, como fumo levado pelo vento. O povo, para se consolar das suas amarguras e com o saber de experiência adquirida lá vai dizendo que “tudo passa e tudo esquece”. Já assim dizia Teresa de Ávila. Mas, por fim, acrescentava: “Só Deus basta!”
O desmontar da festa é sempre mais rápido que a sua montagem. Muitas vezes faz-se com pressa de mais e destroem-se, num ápice, as coisas mais belas que ainda restam, como as lindas e trabalhosas ornamentações. Em alguns casos, há legados que se acolhem ou dos quais mais tarde se deu conta. Há que tomar consciência deles para se avaliarem e conservarem vivos.
Neste caso está a visita de Bento XVI a Portugal, como peregrino de Fátima. O que ele disse está gravado na memória do coração de muitos e deixou-o escrito em letras acessíveis a todos. Multidões correram, livremente, ao seu encontro, em Lisboa, Fátima e Porto. Muitos confessaram-se conquistados à sua pessoa, à sua fé serena, ao seu sorriso límpido, mas discreto.
Não falou de generalidades. Sabia que estava em Portugal, recordou a sua história, apontou caminhos, comunicou ânimo e esperança, tocou em pontos de vida fundamentais, sem intromissões e sempre de modo respeitoso e objectivo. Propôs, não impôs. Não foi turista, nem caçador de homenagens. Esteve entre os seus, e os que o não eram, mereceram, também, o seu apreço e respeito. Foram os da sua visita, dias pacíficos e pacificadores. O legado espiritual e cultural que nos deixou é, por demais, valioso. Pertença dos católicos e não só deles. Um país que tem gente alérgica à história que nos identifica, não pode esquecer quem reconheceu e sublinhou o nosso valor pessoal e nacional.
Não falou de generalidades. Sabia que estava em Portugal, recordou a sua história, apontou caminhos, comunicou ânimo e esperança, tocou em pontos de vida fundamentais, sem intromissões e sempre de modo respeitoso e objectivo. Propôs, não impôs. Não foi turista, nem caçador de homenagens. Esteve entre os seus, e os que o não eram, mereceram, também, o seu apreço e respeito. Foram os da sua visita, dias pacíficos e pacificadores. O legado espiritual e cultural que nos deixou é, por demais, valioso. Pertença dos católicos e não só deles. Um país que tem gente alérgica à história que nos identifica, não pode esquecer quem reconheceu e sublinhou o nosso valor pessoal e nacional.
De Saramago, muita gente pensava o desenlace não anunciado, mas esperado para tempo não muito distante. Os discursos pareciam já redigidos, as entrevistas programadas, os artigos rabiscados, os adjectivos escalonados. Aos seus amigos e admiradores foi-se juntando gente ansiosa por ficar na fotografia. Todos o tinham lido ou iam ler, todos com opinião clara, todos com memória selectiva para afirmar e para calar. As editoras rejubilaram. Uma morte agradecida. Houve dele mais publicidade nos dias da sua morte, que em anos de sua vida. Ninguém lhe podia negar o valor que tem, mas podiam sempre acrescentar-se uns “pozinhos”, que a hora era propícia. Desde o momento que o levou ao Nobel, até à prova final da sua contingência, não faltou a Saramago uma retaguarda organizada, determinada a derrubar muros e a levá-lo em ombros. A muitos parece ter faltado a lucidez de ver no quadro a luz e a sombra que o tornam real. Saramago não foi apenas o escritor que uns adoraram e outros criticaram. Foi, também, o homem e o cidadão que edificou casa na praça. Nada, nem pessoas nem ideologias, o podem libertar de críticas e juízos, que louvores e apreços abundaram. De momento, as revistas ainda falam. Precisam de quem, embalado no evento, as compre.
Há sempre um depois na história de cada um de nós, que não se compadece com simpatias ou antipatias. Finalmente, sem apelo, a verdade do que fomos e somos.
E o Mundial de Futebol? Vem vindo às pinguinhas. De oito em oito dias, sem que dele se saiba ao certo o hoje e o amanhã. Para já, o povo anda alegre e entretido à procura de cromos. O poder político agradece. No momento, tocar em coisas sérias, que não faltam a propósito dos desvarios do futebol, é sacrilégio. A este santo sobram devotos. O final ditará o que parece impor-se. Por agora, sorte no campo e alegria nas vitórias.