A velhinha ali estava na ponte-praça à hora de ponta fazendo tentativas após tentativas para atravessar. Estava no lugar que lhe pertencia, na passadeira. O trânsito, intenso como habitualmente, não lhe dava oportunidades. Dum lado e doutro, cada automobilista pensava só em si e nada nos outros.
A cada tentativa, logo os estridentes apitos a avisavam de que ela não tinha hipóteses. Que esperasse, talvez pensassem os apressados condutores. Enervei-me e fui dar uma ajuda. Quase exigi, qual sinaleiro, que houvesse respeito pelos que não podem passar a correr, como qualquer de nós, mais jovens ou de pernas mais lestas.
Todos reconhecemos que vivemos uma época de pressas, de correrias, de e para o trabalho, para os encontros com horas marcadas, para o aconchego da família após muitas horas de trabalho. Mas que isso se faça com muito respeito, sobretudo pelos mais idosos.
Será que ainda não viram aquele anúncio da TV, em que o automobilista pára, solícito, para deixar passar o idoso, trôpego, ao encontro de sua esposa? E nunca repararam como eles, de sorriso agradecido, se dirigiam a quem parou e foi simpático?
Fernando Martins
In TIMONEIRO, Fevereiro de 1989