Um muro que se levanta
1. Se alguém ousasse escrever a história dos muros escreveria das páginas decisivas da história humana. O erguer de muros con-tém em si uma busca de separação, no mí-nimo desconfiada, no máximo…mortífera. Na história dos muros (se as pedras falassem!) está inscrito muito do sofrimento humano. Os muros da separação, quer de origem ide-ológico-política, quer do simples estremar a fronteira da propriedade, espelham a dis-tância entre o ideal sonhado de convivência humana e as realidades tão cruéis e longínquas da sua não realização.
2. Se poderíamos, simbolicamente, pensar que com a queda do famoso Muro de Berlim (9 de Novembro de 1989), aberta a era da globalização, já não veríamos mais o betão dos grandes muros divisórios, então, estávamos bem enganados. Na Europa de hoje, quase que parece que o Muro que dividia Berlim pertenceu a outra história de outra humanidade: no centro da Europa pós-guerra, foi concluído na madrugada de 13 de Agosto de 1961, tinha 66 km de gradeamento metálico, 127 redes metálicas com alarme, trezentas torres de observação e 255 pistas de corrida para os cães de guarda… Muro que terá provocado a morte a 80 pessoas, sendo muitos milhares os que foram presos na tentativa de fuga.
3. Esses muros “da vergonha” humana, noutros locais e porventura com outras fundamentações, continuam a ser erguidos. Um dos quais, gigante muro em construção, procura vedar as fronteiras entre os EUA e o México. Imponente investimento que em géneros alimentares daria para mundos e fundos! Esse muro procura ter pelos 5 metros de altura, passando cuidadosamente por diversos terrenos, entre areias desérticas e possíveis inundações. Tudo previsto, numa construção que procura a todo o custo evitar e entrada de emigração ilegal, e ainda com a preocupação de uma estética (?!) que seja agradável a olhar. Grotesca ironia humana que percorre já os 112 km erguidos este ano e acompanhará mais 360 km planeados para o ano 2008.
4. Enquanto algum debate norte-americano se vai divertindo sobre as possibilidades estéticas do muro separador, vão-se usando painéis da guerra do Vietname, “chaminés” de ferro e cimento no deserto do Arizona como pilares para as placas separadoras, tudo para não caber o dedo de um pé. Será esta “fuga ao mundo” dos pobres e desprotegidos (emigrantes) a solução? Afinal, de que vale a proclamada diplomacia política ou estaremos no seu fim decretado na construção de novos muros na chamada era global? Um “contraditório” da “arquitectura” relacional dos seres humanos bloqueia a ideia de que as construções essenciais deste século, à partida, seriam pontes. Que distância e ao mesmo tempo que proximidade com o séc. XX. Não vá a Europa clonar a ideia de levantar um muro (físico), porque nas ideias persiste num certo mundo faustoso o “lava as mãos” diante das crescentes concentrações de poderes e desigualdades. Também aqui, democraticamente, não seria Ano da Igualdade de Oportunidades?!
Alexandre Cruz
1. Se alguém ousasse escrever a história dos muros escreveria das páginas decisivas da história humana. O erguer de muros con-tém em si uma busca de separação, no mí-nimo desconfiada, no máximo…mortífera. Na história dos muros (se as pedras falassem!) está inscrito muito do sofrimento humano. Os muros da separação, quer de origem ide-ológico-política, quer do simples estremar a fronteira da propriedade, espelham a dis-tância entre o ideal sonhado de convivência humana e as realidades tão cruéis e longínquas da sua não realização.
2. Se poderíamos, simbolicamente, pensar que com a queda do famoso Muro de Berlim (9 de Novembro de 1989), aberta a era da globalização, já não veríamos mais o betão dos grandes muros divisórios, então, estávamos bem enganados. Na Europa de hoje, quase que parece que o Muro que dividia Berlim pertenceu a outra história de outra humanidade: no centro da Europa pós-guerra, foi concluído na madrugada de 13 de Agosto de 1961, tinha 66 km de gradeamento metálico, 127 redes metálicas com alarme, trezentas torres de observação e 255 pistas de corrida para os cães de guarda… Muro que terá provocado a morte a 80 pessoas, sendo muitos milhares os que foram presos na tentativa de fuga.
3. Esses muros “da vergonha” humana, noutros locais e porventura com outras fundamentações, continuam a ser erguidos. Um dos quais, gigante muro em construção, procura vedar as fronteiras entre os EUA e o México. Imponente investimento que em géneros alimentares daria para mundos e fundos! Esse muro procura ter pelos 5 metros de altura, passando cuidadosamente por diversos terrenos, entre areias desérticas e possíveis inundações. Tudo previsto, numa construção que procura a todo o custo evitar e entrada de emigração ilegal, e ainda com a preocupação de uma estética (?!) que seja agradável a olhar. Grotesca ironia humana que percorre já os 112 km erguidos este ano e acompanhará mais 360 km planeados para o ano 2008.
4. Enquanto algum debate norte-americano se vai divertindo sobre as possibilidades estéticas do muro separador, vão-se usando painéis da guerra do Vietname, “chaminés” de ferro e cimento no deserto do Arizona como pilares para as placas separadoras, tudo para não caber o dedo de um pé. Será esta “fuga ao mundo” dos pobres e desprotegidos (emigrantes) a solução? Afinal, de que vale a proclamada diplomacia política ou estaremos no seu fim decretado na construção de novos muros na chamada era global? Um “contraditório” da “arquitectura” relacional dos seres humanos bloqueia a ideia de que as construções essenciais deste século, à partida, seriam pontes. Que distância e ao mesmo tempo que proximidade com o séc. XX. Não vá a Europa clonar a ideia de levantar um muro (físico), porque nas ideias persiste num certo mundo faustoso o “lava as mãos” diante das crescentes concentrações de poderes e desigualdades. Também aqui, democraticamente, não seria Ano da Igualdade de Oportunidades?!
Alexandre Cruz
Foto: Muro de Berlim em construção