O dia de Maio
Helena Garrido
Faz hoje 120 anos que os trabalhadores dos Estados Unidos fizeram uma greve pela redução dos seus horários diários de trabalho de 12 a 13 horas para oito. Uma iniciativa que culminou com os "mártires de Chicago", como foram conhecidos deste lado do Atlântico, com a morte por enforcamento de quatro dos sete condenados pelos tumultos de 4 de Maio em Chicago, onde, em Haymarket Square, explodiu uma bomba que matou sete polícias. Dois anos depois, em Paris, ficou determinado que 1 de Maio seria o Dia Internacional do Trabalhador.
O mundo mudou e voltou a mudar muito desde esse tempo. Entre os dias de Maio do século XIX e este início de século XXI caminhámos de um estrutura organizativa tão bem exposta nos Tempos Modernos de Chaplin para uma rede, em construção, onde cada um funciona quase como uma "empresa" no seu sentido clássico de produtor de bens ou serviços. As novas tecnologias estão a criar essa nova organização que faz desaparecer a "empresa" enquanto espaço onde todos se reúnem para produzir. O trabalhador pode ser hoje um nómada ou estar na sua terra prestando serviços ao vizinho do lado ou a quem está do outro lado do seu mundo.
A tendência de morte do espaço físico único para trabalhar condena a lógica em que se apoiam os sindicatos nascidos na era industrial das fábricas. A baixa taxa de sindicalização em alguns países apenas reflecte a incapacidade de os sindicatos se adaptarem aos tempos modernos, que não os de Chaplin. Estar sindicalizado pode hoje, em alguns casos, prejudicar mais do que defender quem trabalha.
Em Portugal o sindicalismo deixou-se ainda ferir mais fundo quando se organizou por classes profissionais, funcionando como corporações e acentuando as assimetrias em empresas ou na administração pública. Os grupos em posição de fazer parar a organização foram conseguindo mais aumentos que os seus pares.
A CGTP promete repensar-se, tendo já encomendado um estudo sobre o trabalho na actualidade, a debater em Novembro.
Se conseguirem mudar por dentro, talvez os sindicatos possam sobreviver à invasão do seu território por organizações privadas ou da própria sociedade civil em rede. Hoje, para a maioria dos trabalhadores, é mais útil um site com domínio "org" que muitos dos sindicatos.
Mais do que reivindicativo numa lógica por vezes agitadora, um sindicato deste tempo tem de ser uma rede global e funcionar com os instrumentos de um grupo de pressão. O tempo daquele dia de Maio passou.