O Conselho de Ministros aprovou na sexta-feira a proposta de lei sobre prioridades da investigação criminal. A proposta é algo vaga e deve ser melhorada no Parlamento, aproveitando os contributos dos partidos da oposição. Mas é uma novidade, depois de décadas de alheamento do poder político em relação à justiça. Começará, enfim, a cumprir-se o preceito constitucional que, desde 1997, atribui ao poder político a definição da política criminal.
Segundo o DN de sábado, os procuradores do Ministério Público temem que a sua autonomia esteja em causa, ficando esta magistratura dependente do poder político. Não ocorre aos ilustres magistrados que assim pensam que os cidadãos estão fartos de ver sucessivos e clamorosos falhanços do sistema judicial - da vaga de prescrições às sistemáticas violações do segredo de justiça - sem poderem pedir contas a alguém. O caso das escutas é paradigmático. Cresce na sociedade portuguesa a ideia de que parte dessas escutas serve, não os processos em causa, mas de arma de pressão sobre pessoas e entidades, designadamente da área política, através de fugas cirúrgicas para a comunicação social.
Esta suspeita, que é gravíssima, não parece comover os magistrados. Mas ela leva um defensor das liberdades como Miguel Sousa Tavares a concluir "Prefiro o perigo de uma investigação criminal hierarquicamente subordinada a um poder legitimamente eleito do que entregue aos próprios, sem orientação nem controlo democrático externo" (Público de sexta-feira).
Claro que os juízes têm de ser independentes, não podendo ser legalmente responsabilizados pelas suas sentenças. E o Ministério Público deve ser autónomo na condução concreta dos processos. Mas a impunidade tem limites. A proposta de lei sobre investigação criminal é um primeiro passo.