sexta-feira, 2 de dezembro de 2005

Um artigo de D. António Marcelino

   VENTOS E TEMPESTADES


Todos os dias nos chegam notícias preocupantes. O povo diz, na sua sabedoria, que quando se semeiam ventos se colhem tempestades. A justeza do ditado está à vista. Sempre foi assim e assim continua a ser. Muita gente diz e pensa que uma coisa nada tem a ver com a outra, como se a sementeira fosse indiferente à colheita esperada. Lamentam-se as tempestades que estão caindo sobre o país, destruidoras de vidas, de valores morais e éticos, de convivência respeitadora. É a quebra crescente da natalidade; o aumento preocupante do consumo da droga e a proliferação incontrolável dos traficantes, que envolve milhões de euros; o número assinalável das mães adolescentes; o vergonhoso insucesso escolar; o desemprego injusto de quantos trabalham e sempre trabalharam, não tendo outra fonte de sobrevivência; a criminalidade em todas as idades, até já infantil; os alçapões, jurídicos e sociais, que destroem famílias que o querem ser a sério; o abandono escandaloso dos idosos e de tantos outros feridos da vida; a dramática violência doméstica; a insegurança pública que não respeita nem pessoas nem bens; a arbitrariedade por vezes cega do poder, à revelia do dever democrático; a prepotência de quem é pago para servir e mais se serve a si e aos seus; a linguagem escabrosa que se ouve nas ruas, se vê na televisão e até já entrou, a pretexto científico, num normal dicionário de língua portuguesa… Nada é obra do acaso, mas fruto mais de sementes corrompidas, a que podemos chamar a falta de educação, de respeito, de responsabilidade, de vergonha, de gratidão, de civismo, com os entraves premeditados que se põem a muitas e diversas instâncias educativas, que querem educar e para isso estão qualificadas.
Tudo tem a sua raiz activa em vidas sem equilíbrio nem rumo, apostadas em contagiar outras; em opções cegas pelo mais fácil e pelo mais cómodo que, de muitos modos, se vêm propagando e estimulando; na falsa hierarquia de vida que põe o dinheiro, o prazer e o poder, como os valores mais determinantes na sociedade; na impunidade inconcebível de que goza tanta gente, que pode fazer tudo e não dá contas de nada; na falácia que chama progressismo a coisas tão velhas que já nascem mortas; no medo que se generaliza de ser apodado de conservador e retrógrado e na cobardia de muitos que ficam calados perante situações de consequências socialmente negativas e más; no ataque corrente e no menosprezo de tudo quanto é autoridade, norma ou lei; no testemunho público de muitos que, pelo que são ou se propõem ser, não primam por um exemplo de respeito, civismo e estímulo para o bem. Em todos os sectores há gente boa e séria, mas que se vai cansando de lutar, caindo na tentação de se isolar, fazer o seu caminho honesto e fechar-se no seu cantinho, por pensar que não vale a pena e que já ninguém os ouve. 
Os resistentes que ficam, corajosamente, em campo, são, mais facilmente um alvo a descoberto, para o ataque impune dos novos bárbaros que apontam a outros para desviar a atenção de si próprios. Não sou dos que dizem, mil vezes ao dia, que o país está perdido. Mas não escondo que, mesmo não cruzando os braços, sou dos preocupados que sentem que o retrocesso ao bom senso, à responsabilidade e a valores como a verdade, a justiça e o respeito pelo outro, se torna cada vez mais difícil. Como implementar, sem espírito de cruzada, uma campanha favorável à melhor educação de todos? 
Como, se quem governa e tem por dever fomentar o melhor clima de educação com valores, parece obcecado em apagar os sinais e as referências estimulantes, como acontece em relação ao mais eloquente e estimulante sinal que a humanidade conheceu, o Crucifixo? Pedem à Igreja salas emprestadas para ensinar o inglês e a matemática às crianças e manda-se retirar delas quem melhor as pode ensinar a ser gente!...
Que se espera? Melhor sucesso? Mais educação? Maior responsabilidade?

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