Alain Etchegoyen, filósofo francês, acaba de publicar um livro sobre a força da fidelidade (“La force de la fidélité dans un monde infidèle”, editions Anne Carrière), onde fala de uma ideia nova.
Interrogado pela revista Psychologies sobre a novidade de uma questão tão antiga como o próprio homem, o filósofo declarou que o facto de ter passado a ser uma escolha faz toda a diferença.
Etchegoyen explica: “A fidelidade não só deixou de nos ser imposta como, pelo contrário, hoje em dia tudo nos convida à infidelidade: a Internet e os encontros facilitados, o Viagra, o individualismo, a aceleração do tempo, a mobilidade geográfica, enfim, tudo apela ao desejo e à satisfação imediata”.
A fidelidade é e será sempre uma decisão pessoal mas, num mundo onde é tão fácil ser infiel, importa perceber onde reside o seu valor e a sua força.
Permanecer fiel a si próprio e aos outros é extraordinariamente difícil. Assumir compromissos, criar laços, estabelecer critérios e viver com prioridades nem sequer apetece mas, na realidade, é a única estratégia que nos permite viver com verdade e coerência.
Talvez para muitos, a verdade e a coerência não sejam valores em alta mas assunto que, para mim, são decisivos. Gosto de amizade com verdade, amo a coerência nas pessoas e valorizo a constância nas relações. Neste sentido, concordo inteiramente com Alain Etchegoyen quando diz que “a fidelidade é essencial para a construção da nossa identidade e ser fiel também é permanecer igual a si próprio ao longo do tempo”.
A fidelidade está, acima de tudo, ligada ao compromisso. Seja numa relação amorosa, de amizade ou outras, o compromisso só é possível se houver muita vontade e verdade. Podia acrescentar ainda a liberdade mas, para não criar equívocos, sublinho que se trata de liberdade interior para decidir, em consciência, o que é melhor para mim, e não da liberdade para fazer hoje uma coisa e amanhã o seu contrário. Aliás, em matéria de relações afectivas esta liberdade de agir confunde-se muitas vezes com leviandade e daí a necessidade de perceber do que falamos quando falamos em liberdade.
Voltando à fidelidade, é interessante ler o que escreve Etchegoyen a este propósito: “A fidelidade protege-nos de nós mesmos e dos nossos excessos; a fidelidade (a nossa e a do outro) é uma vitória do narcisismo na medida em que reforça e assegura o nosso próprio valor; a fidelidade dever ser ‘negociada’ por cada casal pois todos têm circunstâncias e caraceterísticas diferentes.”
Estes três pressupostos são radicalmente importantes para perceber a substância da fidelidade e para tomar consciência de que qualquer forma de traição ao outro começa sempre por ser uma traição a nós próprios.
Todo o livro de Alain Etchegoyen é muito realista e provocador no sentido mais clássico do termo. Provoca a discussão e eleva o pensamento e, neste sentido, revela a sua condição de filósofo.