quinta-feira, 14 de julho de 2005

Um artigo de D. António Marcelino

Este país onde tudo chega mais tarde…
Tudo, isto é, a feira internacional da pornografia, o desfile público dos homossexuais e das lésbicas e o casamento dos mesmos, o aborto “a la carte”, a informação sexual sem tabus, os jornais mais respeitáveis a fomentar a prática da prostituição fina e segura…
O que pode passar sem lei ou torneando a lei, não se atrasa. O que se julga ser exigência de uma modernidade arbitrária e sem regras, vai aparecendo, mais ou menos como facto consumado. O que tem interesses a explorar de qualquer ordem, se tarda, já vem a caminho.
Entretanto, os pobres aumentam, os casamentos desfazem-se mal nascem, o aproveitamento escolar não melhora, a tentação do supérfluo leva a perder o necessário, as relações sociais encrespam-se e edificam-se, por todo o lado, estátuas com pés de barro.
Entre nós, a diferença vai deixando de ser riqueza. Rico passou a ser o que é igual ao de lá de fora, e chegou aí por força de um mimetismo empobrecedor, das misérias que destroem pessoas e já desagregaram povos. Cada vez se faz mais importação daquilo que não presta, e se deixa, sem préstimo, o que, de seu natural, é bom.Em relação ao que afecta as pessoas por dentro, pensa-se cada vez menos e cresce o número dos que vão fugindo ao incómodo de ser livres e de reflectirem e optarem por si. Alguns meios de comunicação social ajudam, cada dia, este empobrecimento colectivo, calando o que vale e dando valor ao lixo. Muitos dos que escrevem, também já não pensam. Parecem autómatos teleguiados, dependentes de quem lhes dá o pão a ganhar. Ou, se pensam, é sempre e só numa direcção.
Há actividades em que a liberdade é cada vez mais cara e a subserviência mais evidente. O plano está muito inclinado e o deslize, ainda que imperceptível, é permanente e inevitável.
Quem comanda o processo? Os papagaios do regime, que dizem, desdizem, contradizem e dançam conforme a música; os grupos de pressão, normalmente minoritários, comandados por interesses que já são mais do que conhecidos; os dirigentes de organizações de classe, que perderam o sentido do conjunto nacional e só olham para dentro; os “videirinhas” que se sabem aproveitar das situações para subir ou acumular bens. Há ainda os instalados que não querem perder nada e estão sempre de acordo com quem os favorece. Por fim, os críticos profissionais, que nada fazem para dar novo rumo ao “sistema” de que fazem parte e os vai minando.As consequências desastrosas de tudo isto são abafadas, o bem comum deixa de ter sentido, o que resta de bem vai-se a pouco e pouco esfumando, os incompetentes ganham terreno, os mais capazes emigram, a gente nova prefere o mais fácil, os adultos encostam-se onde parece mais seguro e ninguém os cala, quando o seu encosto começa a oscilar.
É preciso pintar o quadro com pouca luz, que também não tem muita, para ver se as pessoas acordam, se organizam e assumem um papel activo em relação ao rumo deste país, onde há “mais problemas para além do deficit”. Não falta gente capaz, inquieta e séria, mas são poucos os que se dispõem a lutar na linha da frente.

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