quarta-feira, 11 de maio de 2005

Um artigo de D. António Marcelino

Posted by Hello Pragmatismo e moralismo
Há problemas humanos e sociais, de solução difícil, que todos os dias incomodam. A toxicodependência, o alcoolismo, a sida, as muitas e variadas formas de miséria, o desemprego, a insegurança, a loucura na estrada, a violência em todas as dimensões, a situação de muitos idosos. Estes e muitos outros, os problemas de nós todos.
A procura, a qualquer preço, de resultados imediatos, mostra depressa que é cada vez menos válida e consistente a sua solução. Não há praxis acertada, quando vazia de conteúdos e razões que norteiam um projecto sério, a prosseguir com objectividade, no tempo e com tempo. Mas, entre nós, a tentação de tudo resolver depressa é real.
Já se vai dizendo que o que é preciso é pragmatismo. O moralismo não leva a nada. Porém, os verdadeiros pragmáticos não só não dispensam as ideias e os princípios éticos como sentem necessidade de reflectir sobre eles e o seu alcance, ao avaliar e ao tentar a solução dos problemas. Os primeiros fizeram do seu método filosófico o único critério para julgar a verdade de qualquer ciência e doutrina. Todo o pensamento, assim diziam, existe para a acção e o valor das ideias é apreciado consoante a influência nas atitudes e comportamentos e o modo como os orientam e controlam.
O que se propõe, se é periférico às pessoas, porque não as respeita na sua verdade, capacidade e ritmo, ainda que com algum resultado imediato, não passa de ilusório e passageiro. Os pragmáticos sérios procuram traduzir, em prática exequível, conteúdos a promover e valores a preservar, não se vergando ao êxito fácil e aos louvores.
Uma acção responsável não pode ser fruto de voluntarismo, nem pode ser valorada à base de uma eficiência rápida, nem dos apoios da comunicação social de turno.Hoje vive-se e proclama-se o propósito de ser pragmático em tudo, porque não se pode perder tempo, nem deixar que os problemas apodreçam. É esta uma tendência muito forte dos políticos frenéticos, encaixados nos poucos anos de poder que têm à sua frente. Não se pode perder tempo a estudar nem a avaliar o que já se fez. Há que fazer de novo, mudar os nomes, multiplicar os projectos, esquecer as pessoas. Doença crónica.
Na educação, na saúde, na economia, nos problemas mais prementes, há que saber distinguir o que tem de se resolver já e que ver as causas que produzem e multiplicam os males. Os problemas sérios não se compadecem com soluções de feira, nem com mezinhas que dão para todos os males. O que por aí se lê e se ouve, mesmo por parte de pessoas e serviços oficiais, é confrangedor. A política muda, mas os homens são iguais.
Matar a fome de muitos anos, nem cura o faminto, nem gera riqueza.
A mudança de atitudes é um processo lento, porque é um processo educativo, que propõe valores e estimula novos comportamentos. Se não se enfrenta a realidade, apenas se adiam e escondem os problemas graves, que estão na praça pública.
“Usa o preservativo e acabará a sida; despenaliza o aborto e terminam os abortos clandestinos; multiplica as salas de chuto, dá seringas novas, logo dirás adeus à toxicodependência; promove cursos de formação acelerada e não haverá desemprego; multiplica e agrava as coimas e terás a estrada sem acidentes; aumenta as pensões de velhice e dá passeios aos idosos e sentir-se-ão amados; tira as crianças e os jovens das instituições, dá-os às famílias e logo eles serão felizes; canoniza a homossexualidade e serás moderno; acaba com o ensino privado e o estatal terá mais qualidade; esquece o que disseste ontem e nega se for caso…” Cá está o pragmatismo político, sem ética e sem ideias. Em nome da modernidade. Para bem da pátria. Para subir na tabela dos países evoluídos. Para ganhar votos.
Muitos há que não afinam por este diapasão. Aceitam o incómodo da verdade, respeitam e promovem os direitos das pessoas, são pragmáticos com ideias.
Felizmente.

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