Poucas pessoas terão notado que o actual Papa, cerca de vinte dias antes de ser eleito, se havia deslocado ao Mosteiro Beneditino de Subiaco, para proferir uma conferência sobre a “Europa na crise das culturas”. Recebeu, nessa altura e nesse local, o prémio “S.Bento pela promoção da vida da família na Europa”. Poucas pessoas se terão apercebido, na hora do Habemus Papam, a razão íntima por que Ratzinger escolheu o nome de Bento XVI. Não foi uma inspiração circunstancial. Há muito que S. Bento e a Europa têm uma grande proximidade na percepção histórica e na sensibilidade do actual Papa.
O chumbo do Tratado Europeu, em França, não sendo uma catástrofe para a União Europeia, constitui um bom momento para relançar algumas questões sobre o nosso Continente, que alguma sofreguidão política e económica terá levado a diversos “saneamentos” históricos. O laicismo mórbido que se concretizou na negação da matriz cristã europeia, mina, sem o notar, a cultura da liberdade e da democracia, ao abjurar as suas raízes ou considerando-as, por mero oportunismo, apodrecidas. E, por essa via, definindo quem deve ou não pertencer à Europa.
“A Europa – disse Ratzinger em Subiaco - foi um continente cristão, mas também um ponto de partida para uma nova racionalidade científica... Foi na Europa que o cristianismo recebeu o seu impulso cultural e intelectual mais eficaz... mas foi, também, na Europa que se desenvolveu uma cultura que constitui a contradição mais radical não só do cristianismo mas também das tradições religiosas e morais da humanidade. Por isso a Europa está a atravessar uma autêntica prova de fogo... Daqui emerge a responsabilidade que nós, Europeus, temos de assumir neste momento histórico: no debate sobre a definição da Europa, não está em jogo uma batalha nostálgica de retaguarda da história, mas uma grande responsabilidade para a humanidade de hoje.”
Na crise da Europa não estará, visivelmente, o problema religioso. Mas quem risca do seu bilhete de identidade o nome de seus pais, parece não estar interessado em ser reconhecido como filho de boa gente.