Reflexão de Georgino Rocha
Busca o caminho |
Jesus vive horas decisivas da sua missão. Acaba de fazer a ceia de despedida dos seus amigos e está prestes a entrar no processo da paixão. As circunstâncias são especiais e os momentos geradores de expectativas. Os discípulos sentem-se incomodados e perplexos. Não se imaginam sozinhos. Estão confusos. Não “engolem” o falhanço da aposta de terem deixado tudo e, agora, verem ruir os projectos tão intensamente alimentados. Acham estranho que Jesus lhes acene com novos horizontes. O realismo começa a pesar e o sonho a desfazer-se. A perturbação instala-se e o coração “chora”. E as perguntas surgem pela boca de Tomé e de Filipe, porta-vozes do grupo apostólico.
“Senhor, como podemos saber o caminho, se não sabemos para onde vais”?, adianta Tomé como reacção às declarações de Jesus. Pergunta coerente pois o “vaivém” de Jesus, o seu “até breve”, o vou partir, mas voltarei “para vos levar comigo”, na casa de meu Pai há muitas moradas, quero preparar-vos um lugar, “soariam” a estranhas e provocantes. E a afirmação conclusiva, ainda mais: “Vós conheceis o caminho para onde Eu vou”.
Este breve diálogo evidencia modos diferentes de compreender a novidade do projecto de Jesus. Tomé deixa perceber o seu lado humano, vitorioso face aos adversários, triunfante nos últimos confrontos. Finalmente, todos como no Jardim das Oliveiras cairão por terra. E será Jesus a dar-lhes ordem de se erguerem. Outra é a realidade: a denúncia de Judas, a prisão de Jesus e todo o processo da paixão que culmina na ressurreição, depois da morte. Tudo por amor de salvação. Tudo por decisão de consumar o caminho iniciado na Galileia. Tudo com determinação livre, firme e corajosa, expressa progressivamente nos passos dados rumo a Jerusalém.
E nós, por que caminho avançamos na vida? “Quero que estejais onde eu estou”, continua a dizer-nos como outrora aos discípulos. O Papa Francisco, alerta-nos para as tentações de andarmos por atalhos individualistas, sem apreço pela comunidade nem pelo compromisso, para experiências subjetivas sem rosto, para o refúgio em zonas de bem-estar pessoal, indiferente e insensível a tudo o que acontece à sua volta. (Alegria do Evangelho, 90).
O caminho de Jesus é claro. Nele se encontra a verdade. Por ele se alcança a vida. Com ele se vai ao Pai. Há outros que brilham em tantas luzes de sedução; mas esgotam-se depressa e, quase sempre, deixam o coração vazio e insatisfeito. Ganham em intensidade o que perdem em fugacidade. De sede em sede, aspiram sempre mais, desejam a fonte que jorra água viva, sacia agora e tem em reserva um manancial para muitas outras ocasiões. É o próprio Jesus.
Santo Agostinho diz-nos num dos seus sermões: “Seguindo o caminho da sua humanidade, chegarás à Divindade. Ele te conduz a Ele mesmo. Não procures por onde ir fora Dele. Se Ele não tivesse querido ser caminho, sempre andaríamos extraviados. Ele se fez, pois, caminho, por onde ir. Portanto não te direi: Busca o caminho. O caminho mesmo é quem vem a ti. Levanta-te e anda! Anda com a conduta, não com os pés. Muitos andam bem com os pés e mal com a conduta. E inclusive os que andam bem, mas fora do caminho. Correm, mas não pelo caminho, e quanto mais andam, mais se extraviam, pois se afastam mais do caminho… Sem dúvida, é preferível ir pelo caminho, embora mancando, do que ir fora do caminho” (Sobre o evangelho de São João, XIII). Sim, Cristo é caminho estreito em comparação com os caminhos espaçosos do mundo. Porém estes últimos são atalhos sem saída. Pelo mesmo caminho veio e voltou, para nos mostrar-nos a direção da verdadeira rota.
“Quero que estejais onde eu estou”. É desejo apelo a que sigamos Jesus na sua doação ao Pai, no amor à Igreja e à comunidade a que pertencemos, no desempenho das funções e serviços que são indispensáveis à realização da missão, na promoção do bem comum das pessoas e da sociedade, na atenção aos sem voz nem vez. Ouvir e seguir Jesus, como os pastorinhos de Fátima, hoje santos da Igreja universal, que à pergunta da Senhora de branco: Quereis oferecer-vos a Deus? Respondem: sim, quero.
E o Papa Francisco deixa-nos este pedido familiar: “É nas vestes de Pastor universal que me apresento diante Dela, oferecendo-lhe um bouquet das mais lindas flores que Jesus confiou aos meus cuidados. Ou seja, os irmãos e irmãs do mundo inteiro, resgatados pelo seu sangue, sem excluir ninguém. Vedes? Preciso de vos ter comigo. Preciso da vossa união — física ou espiritual, importante é que seja do coração —, para o meu bouquet de flores, a minha rosa de ouro, formando um só coração e uma só alma. Entregar-vos-ei todos a Nossa Senhora, pedindo-lhe para segredar a cada um: O meu imaculado coração será o teu refúgio, o caminho que te conduzirá até Deus”.