Um texto inédito de Ângelo Ribau Teixeira
Que vida esta!
Começava mais uma época de trabalhos, que era exclusiva dos marnotos da Gafanha já que, os de Aveiro, não tendo terras, se limitavam a consumir o tempo, visitando de vez em quando a salina, acautelando alguma “cambeia” que as marés vivas tenham provocado, ou passeando debaixo dos arcos do Hotel Arcada, local soalheiro e abrigado dos ventos do nordeste, que no inverno enregelavam o corpo até aos ossos…
Enfim, cada qual nasce para o que nasce!
E para o Toino não era nada bom ser filho de lavrador, com terras!
E lá foram na segunda-feira seguinte para os viveiros da “Corte do Paraíso” começar com a apanha do moliço. O pai do Toino com um ancinho e a gadanha ao ombro, o Toino com um ancinho, montam cada um na sua bicicleta e toca a andar em direção ao… “Paraíso”??!!!
Atravessaram a ponte de madeira que liga á estrada que dá a Aveiro e aí foram a caminho dos “moinhos”, onde se localizava o Paraíso. O vento norte corria de mansinho, mas frio como o gelo. As orelhas e as mãos sentiam-no bem. Pior seria quando tivessem, ao chegar ao viveiro, de tirar as calças, ficar em cuecas e entrar na lama. “Enfim, veremos…”, ia cogitando o Toino, tentando meter uma mão no bolso e conduzindo a bicicleta sem mãos.
Chegaram. Calças fora, cuecas arregaçadas e toca de descer para o viveiro.
— É pá! — diz o pai do Toino para um cunhado — Está mesmo frio… Toca a gadanhar para aquecer. Enquanto nós cortamos o moliço, o Toino com o ancinho vai-o juntando em montes pequenos para depois serem “zurrados” para junto da estrada, d´onde mais tarde serão carregados para os carros de bois, que o conduzirão às terras, na Gafanha.
Com o correr do dia, e como o céu se encontrava límpido, o sol ia aquecendo o ar ambiente, mas não a lama onde se enterravam os trabalhadores. O corpo com o trabalho, aquecia. Mas as pernas e os pés, valha-lhes Deus, nem os sentiam…