domingo, 11 de janeiro de 2009

SINAL +

Cortejo dos Reis de 2009
1 – Saí um dia destes de máquina digital em punho à cata dos sinais do frio. Não os vi. Mas confesso que me apetecia tirar uma fotografia à neve, aqui à beira do oceano, onde ela não tem condições para se impor. Que me lembre, só uma vez nevou na Gafanha da Nazaré, por estranho fenómeno atmosférico. Na escola onde leccionava, professores e alunos deixaram o aconchego da sala para se deliciarem com a neve. Como surgiu sem ninguém contar, não preparei a máquina para registar o acontecimento, com pena minha. Agora, que a neve caiu quase em todo o país, sempre esperei que tivéssemos também essa sorte de a ver e de a pisar. Mas pode ser que um dia isso possa acontecer, de novo, ao vivo, na planura gafanhoa. Porquê o SINAL + para a neve? Simplesmente porque ela foi motivo para grandes reportagens das nossas televisões, que nos ofereceram imagens dignas dos melhores postais ilustrados, onde o branco puro se salientava. E se é verdade que o frio é triste, apenas bonito quando o desfrutamos à lareira, a verdade é que a neve dos últimos dias trouxe uma certa alegria. Apesar das contrariedades que provocou e de algum mal que tenha feito, vi o ar feliz das pessoas quando se pronunciavam sobre a neve ou com ela brincavam. Habitual nuns sítios, original noutros, espectacular em todos. 2 – Hoje vivi o Cortejo dos Reis experimentando a proximidade com as pessoas, muitas delas envolvidas na vivência desta antiga e sempre renovada tradição. Para quem gosta da sua terra, o encontro com alguns conterrâneos proporcionou-me a oportunidade de voltar aos tempos em que eu, menino, com meu irmão, mais novo três anos, participámos no Cortejo dos Reis, de uma ponta à outra, cada um com a sua cana às costas. Na ponta da cana lá ia a prenda para o Menino Jesus. Não consigo recordar toda a pequena carga, mas dela fazia parte um chouriço, um pequeno bacalhau e umas laranjas. Tudo o mais se varreu. Mas também é verdade que os nossos frágeis ombros não suportariam muito mais. O meu pai levou-nos até Remelha de bicicleta, como era hábito na altura, entregando-nos ao cuidado de pessoa sua conhecida. Ainda me lembro de ouvir a minha mãe dizer que estaríamos assim a pagar uma sua promessa, coisa que na altura não compreendi. Mas se ela dizia que tínhamos de ir no Cortejo, não haveria razões para discordar. Afinal, as tradições são sempre excelentes motivos para reconstruirmos as nossas histórias de vida. FM

Gafanha da Nazaré: Cortejo dos Reis

Para todos os meus leitores e amigos, em especial para os que gostam das nossas tradições.

Gafanha da Nazaré: Cortejo dos Reis


O mais importante é a alegria
No final do Cortejo dos Reis, depois de todos os participantes terem beijado o Menino, o Prior da Freguesia, Padre Francisco Melo, antes da bênção, louvou o envolvimento do povo nesta manifestação de fé, que é também uma antiga tradição das gentes das Gafanhas. E sublinhou que este Cortejo dos Reis faz parte da nossa identidade, que é preciso preservar. Depois, frisou o facto de muitos intervenientes mudarem de papéis, nos autos de Natal apresentados, durante o Cortejo, “como quem muda de camisa”, por tudo isto lhes estar, decerto, no sangue e na alma. A tradição oral, que se mantém entre nós há mais de um século, está enraizada na memória da nossa gente. Quem como eu presenciou de perto o desenrolar do Cortejo dos Reis, mais na parte final, pôde confirmar o interesse e o carinho com que o nosso povo viveu esta festa. Representando, cantando, animando e valorizando, com os mais diversos contributos, uma festa popular com marcas indeléveis dos nossos antepassados. Como disse o nosso Prior, o mais importante não será o dinheiro que se recolhe das “ofertas para o Menino Jesus”, como diz o povo, porque o que conta é esta alegria, este interesse e este respeito pelas nossas tradições, que fazem parte da nossa cultura e da nossa identidade.
FM

Tecendo a vida umas coisitas – 113

BACALHAU EM DATAS - 3
ATÉ FINAIS DO SÉCULO XV
Caríssima/o:
1371 - «Já em 1371 el-rei D. Fernando dispunha uma lei que dizia: “As naus que forem das vilas de Aveiro e de Viana e de qualquer parte de meus Reinos e Senhorios à pescaria de bacalhau, irão armadas e elegerão entre si, ao tempo que partirem, capitão-mor.”» [M-FM II, 43 (Murtosa- FotoMemória II, por Alexandra Farela Ramos, 2005)] 1415 - «Uma prova da importância do seu valor [do sal], nessa época de transição [da Idade Média] para a Idade Moderna, é-nos dada pela utilização do sal no pagamento dos fretes das tropas para a tomada de Ceuta. Foi a única mercadoria, das que Portugal importava [exportava?] durante a Idade Média, que não se ressentiu com as alterações introduzidas pela chegada de novas mercadorias ultramarinas, aumentando mesmo a sua importância.» [Oc45, 67] 1470 - «O pai de Gaspar, João Corte Real, tomou parte numa expedição nos mares do norte, mandada efectuar por Cristiano I, Rei da Dinamarca, a pedido do Rei de Portugal, D. Afonso V. Esta expedição comandada por Pinning e Pothorat realizou-se por volta de 1470 e atingiu a Gronelândia e a “Terra do Bacalhau”, tal é a opinião de Sofus Larsen expressa na sua importante obra Dinamarca e Portugal no Século XVI. Se a terra foi chamada “do Bacalhau” sem dúvida que a pesca já aí seria praticada antes.» [HPB, 20] 1472 - «É no contexto das navegações para ocidente que vamos encontrar dois navegadores portugueses – João Corte Real e Álvaro Martins Homem – integrados numa expedição luso-dinamarquesa, saída de Reykjavick, em 1472. Naquela exploração, verificaram a existência de cardumes que, de tão compactos, faziam lembrar o fundo, ilusão desmentida pelas sondagens feitas com os prumos de mão. [...] Quando chegaram a Portugal, os dois navegadores comunicaram ao seu rei tudo quanto tinham visto, falaram-lhe da nova terra descoberta e o nome com que a tinham baptizado – Terra dos Bacalhaus - , devido à incrível abundância deste peixe que tanto os impressionara.» [HDGTM, 24] 1477 - «[...] Colombo terá falado português antes de ter aprendido o castelhano, pois era casado com uma portuguesa, e conhecia a fundo os avanços cartográficos portugueses e as suas viagen em navios portugueses – que incluíram, segundo pesquisas recentes efectuadas pelo explorador norueguês Thor Heyerdahl, a participação numa expedição luso-dinamarquesa em 1477 que partiu da Gronelândia através do estreito de Davis e se dirigiu ao Norte do continente americano – lhe forneceram um conhecimento prático sobre correntes e ventos que lhe assegurou que, se viajasse para Ocidente da Europa, os ventos do Atlântico Norte favoreceriam o seu regresso.» [in Um Mundo em Movimento- Os Portugueses na África, Ásia e América (1415-1808), de A. J. R. Russell-Wood, DIFEL- Difusão Editorial, S.A., Lisboa, 1998, pp. 7-8.] Século XV (finais) - «Desde finais do século XV, os portugueses navegavam nas águas da Terra Nova. A pesca do bacalhau terá começado a interessar os pescadores portugueses na viragem do século XV para o século XVI, como mostrou Mário Moutinho.» [Oc45, 67 e 77] Manuel

sábado, 10 de janeiro de 2009

Janeiras na Gafanha da Nazaré

O Grupo Etnográfico da Gafanha da Nazaré cantando as Janeiras, na noite de hoje. Aqui fica uma singela prenda para os gafanhões espalhados pelo mundo, em vésperas do Cortejo dos Reis, de tantas tradições entre nós.

Janeiras na Gafanha da Nazaré

Grupo Etnográfico canta Janeiras
Cumprindo a tradição, o Grupo Etnográfico da Gafanha da Nazaré veio esta noite cantar as Janeiras a minha casa. Sabe quanto aprecio o respeito pelas tradições, e, por isso mesmo, brinda-me todos os anos com cânticos que vêm dos nossos pais ou avós. Ainda bem. E o mais curioso é que, no grupo, há jovens que asseguram a continuidade das tradições entre nós.

O Foral Manuelino de Ílhavo


A Carta de Foral, ou Foral, é um documento concedido unilateralmente pelo Rei ou por um senhorio durante a Idade Média. Era atribuído para concessão de aforamento ou foro jurídico próprio, a título perpétuo e hereditário, aos habitantes de uma povoação que se queria libertar do poder senhorial, não tendo os cidadãos qualquer intervenção na elaboração e aprovação do mesmo. Os Forais Antigos concedidos pelos primeiros monarcas, após a Reconquista Cristã, constituíam uma medida para promover o povoamento e defender os territórios conquistados aos muçulmanos. Eram diplomas que consagravam direitos, privilégios e obrigações, específicos aos habitantes de uma dada comunidade, sob o ponto de vista económico, social e político que, com o passar do tempo, acabou por originar fragmentação, ou seja, cada município regia-se pelas suas leis particulares, desajustadas já da sua época, sobrepondo-se o foro e privilégio dos senhorios ao direito público, o que gerava muitas injustiças e constituía uma fonte de conflitos, principalmente a partir do séc. XV. A este suceder de contrariedades, adveio a reforma manuelina dos forais contra os abusos praticados pelos alcaides e governadores dos castelos, no que respeita à aplicação da justiça, cobrança indevida de impostos, opressões às populações e falsificação ou interpretação errada dos forais medievais, mormente nas questões relacionadas com a cobrança de direitos reais, em que a coroa acabava por sair prejudicada. Assim, num contexto de modernização do país e centralização do Estado, D. Manuel advoga a aplicação de leis gerais e uniformizadoras para todo o País, consignadas nas Ordenações Manuelinas, substituindo os Forais Antigos obsoletos na linguagem (escritos em latim) e introduzindo preceitos regulamentares na vida económica com a aplicação do sistema tributário, um dos seus principais objectivos desta reforma. Os Forais Novos pretendem ajustar os conceitos normativos à realidade político-social do séc. XV, em que a sociedade portuguesa conhece profundas transformações estruturais com a ascensão da burguesia e o comércio da Expansão Ultramarina, já muito aquém do contexto político-social da Idade Média. Assim, por alvará de 20 de Julho de 1504, D. Manuel mandou que, de cada foral, fossem realizados três exemplares: um para a câmara do concelho, outro, sendo caso, para o senhorio ou donatário do mesmo e, finalmente, um terceiro, em registo de chancelaria, para o próprio arquivo real. É neste contexto que surge o Foral de Ílhavo, concedendo autonomia legislativa, fiscal e económica ao concelho, marco de uma nova idade na vida municipal. Manuscrito lavrado por mãos de exímio calígrafo, em fólios de pergaminho e encadernado com planos de tábua, coberto de couro lavrado com ferragens evocativas da simbólica áulica de D. Manuel, Ílhavo é presenteado com a entrega deste documento, assinada pelo punho do próprio soberano, no dia 8 de Março de 1514. No entanto, só dois anos mais tarde, a 2 de Setembro de 1516, seria entregue ao juiz e vereadores do concelho. Preservando no seu arquivo camarário este precioso original da carta de foral assinada pela mão do próprio Rei D. Manuel, a Câmara Municipal de Ílhavo decidiu, em tom de desfecho das comemorações dos 110 anos da Restauração do Município, lançar no dia 13 deste mês uma publicação com a respectiva transcrição e reprodução em fac-símile, num acto de partilha deste precioso documento com toda a comunidade.
Fonte: "Viver em...", da CMI

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