De passagem pelo aeroporto de Colónia, lá estava. Lançado nos finais de Outubro, é best-seller há semanas. Estou a referir-me ao livro Das Kapital ("O Capital"), de Marx - desta vez, porém, não Karl Marx, mas Reinhard Marx, arcebispo de Munique. Ele foi professor de Ética Social Cristã e, antes de chegar a Munique, passou seis anos como bispo auxiliar de Trier, a cidade na qual Marx, o Karl, passou a meninice e a juventude e conheceu a sua futura mulher, Jenny.
Reinhard Marx abre com uma carta ao seu homónimo, esperando que, após a morte, tenha verificado que se enganou quanto à não existência de Deus e, assim, possa ser mais benevolente para com um homem da Igreja. O diálogo pode ser frutífero, pois consta que, pouco antes de morrer, terá dito: "Só sei que não sou 'marxista'."
Karl Marx enganou-se, quando pensou que o seu programa se podia resumir na "abolição da propriedade privada". Também não se realizou, no conflito entre o trabalho e o capital - concretamente na Alemanha e outros países industrializados -, o seu vaticínio de uma revolução radical. Contra as suas previsões, a revolução acabou por ter lugar onde não devia: a Rússia.
Mediante contratos sociais de trabalho, sindicatos activos, toda uma regulação sócio-jurídica e a participação dos trabalhadores, criou-se uma sociedade na qual estes passaram de vítimas do sistema de mercado a participantes dos seus sucessos. "Pareceu possível o bem-estar para todos", a ponto de o próprio J. Habermas ter escrito: "O designado portador de uma futura revolução socialista, o proletariado, dissolveu-se enquanto proletariado."
Mas isto foi uma ilha com sol de pouca dura. Com a globalização, as novas possibilidades de troca de informações, bens e serviços a nível global tornaram o antigo conflito indiscutivelmente favorável ao capital, tanto mais quanto, como disse Manuel Castells, na actual sociedade em rede, está em vigor a fórmula: "O capital é essencialmente global, o trabalho é em geral local." Aumentam assim as possibilidades dos investidores e especuladores. O lema é: "Demolição do Estado social e desregulação."
O abismo entre ricos e pobres é cada vez mais fundo no mundo e nos países. Mais de 2, 5 mil milhões de pessoas têm de viver com menos de dois dólares por dia, mas há mil milhões em pobreza extrema, pois têm de sobreviver (?) com menos de um dólar. Mais de metade da riqueza mundial está nas mãos de dois por cento da Humanidade.
Parece que Marx tinha razão quanto à sua tese da acumulação e concentração progressivas do capital. De facto, de ano para ano sobe o número dos super-ricos. E a crise financeira internacional veio mostrar a força com que "já hoje o capital anónimo determina o nosso destino". Os bancos e os fundos com as suas especulações deitaram a perder milhares de milhões. Mas, agora, depois de tanto se ter propagandeado a necessidade de o Estado se não intrometer no mercado, "tem de ser o contribuinte a responder pelas perdas especulativas". "Os lucros são privatizados e as perdas, socializadas."
Será a História a dar razão a Marx? O capitalismo vai afundar-se por si próprio? Responde o bispo Marx: "Dr. Marx, espero que não. E por várias razões." Ele sabe que não foi o seu homónimo, mas os seus discípulos bolchevistas a pôr em marcha o comunismo soviético. Mas o que é facto é que o programa da socialização dos meios de produção levou à estatização, desembocando numa ditadura política, por vezes totalitária.
É necessário distinguir entre um capitalismo sem limites e uma economia social de mercado. Um "capitalismo primitivo" é injusto, contra a pessoa, e, por isso, não aceitável. Mas um capitalismo enquadrado politicamente, no sentido de uma economia social de mercado, foi "o único caminho correcto, e este caminho continua hoje sem alternativa razoável".
Há uma pergunta que preside ao livro: as pessoas são para o capital ou o capital deve estar ao serviço das pessoas? A resposta é: "Um capitalismo sem humanitariedade, solidariedade e justiça não tem moral nem futuro."
Anselmo Borges
sábado, 10 de janeiro de 2009
sexta-feira, 9 de janeiro de 2009
Aos católicos do Ocidente

No discurso de Ano Novo que o Papa fez ontem ao Corpo Diplomático, há várias preocupações. Sublinho a que se refere directamente aos católicos no Ocidente.
Primeiro, recorda o Papa que uma sociedade que discrimine os cristãos está doente, sofre de pobreza moral. Pode até ser rica de bem-estar material, mas é uma sociedade moralmente pobre porque não reconhece o valor da fé na construção de uma sociedade mais livre e justa.
Mas o Papa vai mais longe ao desejar que o mundo ocidental não cultive preconceitos nem hostilidades contra os cristãos, simplesmente porque, nalgumas questões, a sua voz é incómoda. Aos cristãos vítimas do laicismo, Bento XVI pede que não percam a coragem e que, apesar das tribulações, testemunhem que a salvação de Cristo é para todos e que, por isso, não se pode confinar à esfera privada.
Belo conselho também para nós, portugueses!
Aura Miguel
Fonte: Página 1 da Renascença
Na Rádio Terra Nova

SOLTAR A CORRENTE
SOLTAR A CORRENTE é o novo programa da Pastoral Juvenil da Diocese de Aveiro na Rádio Terra Nova. Quinzenalmente, às sextas-feiras, entre as 21 e as 22 horas, em 105 FM. Entrevistas, ligações em directo com os grupos de jovens da diocese, sugestões para os teus fins-de-semana e a música dos teus ritmos. E, claro, o tal minuto e meio de reflexão. Porque a semana terminou, vem daí SOLTAR A CORRENTE. Podes acompanhar o programa online em http://www.terranova.pt/
O programa tem apresentação de João Matos, com repórteres que vão percorrer a diocese, Sónia Neves, Priscilla Cirino e Álvaro Ramos. A condução técnica é de Márcio Conceição e a produção de Catarina Pereira
Leituras

FM
Calor humano
Quando eu era menino o frio vinha e ia sem ninguém dizer nada. Sentia-se no corpo e na alma e sofria-se em silêncio. As escolas não tinham aquecimento nenhum, e o vento, húmido e gelado, entrava por todos os cantos. Os mais pobres, sem calçado e sem roupa que agasalhasse, tiritavam o tempo todo.
Recordo-me dos truques de que o meu professor, Manuel Joaquim Ribau, de saudosa memória, se servia para enfrentarmos o frio. Antes de abrir a porta da escola, mandava-nos correr, na que é hoje a Av. José Estêvão. E a corrida aquecia. Mas dentro da sala de aula o frio atacava de novo, com força. Então, quando as mãos enregeladas não conseguiam pegar no ponteiro com que se escrevia na lousa, todos de pé, a um sinal do mestre, de braços estendidos, abraçávamo-nos a nós próprios, com genica, para que as nossas mãos nos batessem no corpo. E assim passava o tempo.
Uma ou outra vez fizemos uma fogueira no caminho de terra batida, onde nos aquecíamos. E quando havia temporal, com vento, chuva e frio de rachar, a escola era triste. Mesmo muito triste.
Hoje, com tantas comodidades, merecidas e justas, outros problemas haverá que também, por vezes, a tornam triste. Mas não há, julgo eu, tanto frio como antigamente, onde só o calor humano pontificava.
FM
quinta-feira, 8 de janeiro de 2009
AMIGOS E AMIZADES

Há tempos especialmente propícios para apreciar melhor o que na vida teve, tem e terá sempre, um valor de excelência para nós, os mortais. Esses tempos não se encomendam. Vão acontecendo sem que a vida os possa engolir. Um coração sensível e atento dá por eles e deles sabe tirar as lições de ser e de saber que lhe são proporcionadas.
Disse alguém que “um belo ancião é a mais formosa de todas as ruínas”. Formosa, rica e sábia, porque sempre capaz de discernir e apreciar, com rectidão, o que a vida lhe foi e vai proporcionando, por força da sabedoria adquirida no tempo, da experiência de ultrapassagem das portas estreitas da vida e da finitude dos túneis, por longos e lúgubres que sejam. E, também, pela vivência libertadora das mais complicadas contingências humanas, que acompanham todos os resistentes da vida no seu dia a dia, e persistem, encorajados e com sentido, para ir um pouco mais além.
Os amigos, que sempre o foram e o são de facto, e as amizades advenientes por força das mais variadas circunstâncias, constituem privilegiados elementos de interesse dessa leitura da vida, que o tempo e os tempos vão permitindo fazer.
Diz a sabedoria da Escritura que “um amigo é um tesouro”. A vida mostra que os tesouros são raros e de leitura nem sempre unívoca. Alguns amigos volatilizam-se quando os julgávamos de sempre e para sempre. Outros foram deixando que o coração se endurecesse aos apelos de ajuda e aos desabafos de compreensão. Ainda outros desaparecem rápidos como os tempos em que nasceram. Restam sempre poucos que, presentes e ausentes, mantêm o mesmo tom de voz, o mesmo calor das palavras, a mesma abertura de alma, a mesma disponibilidade para estar ou para vencer, num instante, distância de quilómetros. Mantêm a mesma alegria incontida, a mesma capacidade de alegria e de dor, vividas em comum, a mesma certeza do ontem e do hoje. São estas atitudes de vida que traduzem a verdade de que “um amigo é um tesouro” e de que os verdadeiros amigos não são como o vento que dá sinal de si, mas passa à frente e depressa.
Das amizades e encontros que surgem ao longo da vida, tanto nascem amigos verdadeiros, coisa rara, como expressões de respeito que só enraizaram por tempos de relação necessária e que logo passam, como atitudes que escondiam interesses e não foram além da satisfação destes. Há, ainda, amizades de honra, propaladas por um tempo, que depois se transformaram em indiferença ou desconhecimento..
A vida de hoje, com padrões de relação mais frequentes mas mais superficiais, vazada em interesses imediatos a que repugna toda a gratuidade, não é propícia nem ao respeito pelas raízes mais antigas, mesmo as humanas, nem à conservação duradoira daqueles que o tempo parece ter tornado mais ou menos inúteis, senão mesmo desvalorizados, assim se diz, por incapazes de ler e falar o presente fluido, que a muitos seduz.
Nesta depreciação entraram também instituições respeitáveis, por vezes mais propícias a ser museu de velharias inúteis, peças de ontem em prateleiras douradas, que salva guarda cuidadosa e carinhosa de gente a respeitar pela riqueza humana que nela perdura.
As festas cíclicas não são mera tradição. Constituem ocasião de reforço das amizades verdadeiras. Os amigos, porque então, de alguma maneira, se manifestam sempre, ficam ainda mais amigos. Os que o não são, vão caindo e saindo, deixando recordações, nem sempre as melhores. Amizades por interesse ou respeito que não chegam ao coração.
O verdadeiro tesouro conserva-se como presentes de amor, que é isso que de facto é. Um amigo verdadeiro dá segurança e alegria de viver. Tesouro raro. Mas o pouco é muito, quando verdadeiro, e o muito é nada, quando lhe falta o rosto e calor de verdade.
Em cada ano não faltam ocasiões para agradecer os amigos e para pesar o valor das amizades de circunstâncias e, também, das utilitárias e compostas para a ocasião.
António Marcelino
Situação absurda

Um estudo recente revela que o número de habitações praticamente duplicou em Portugal nos últimos 30 anos. Sendo o nosso país um dos mais pobres da Europa, no entanto é o segundo com maior número de casas por habitante. Um enorme desperdício de recursos num país que não é rico.
Este absurdo não é novidade. Como também se sabe haver mais de meio milhão de casas desocupadas em Portugal, ao mesmo tempo que inúmeras pessoas não possuem habitação digna desse nome.
Ou, ainda, que muitas famílias estão com a corda na garganta por causa do empréstimo que fizeram para comprar casa. Este é o resultado desastroso de décadas em que faltou coragem política aos governos para reanimarem a sério o mercado de aluguer.
O que implicaria uma revisão realista das rendas antigas. E uma justiça rápida e eficaz, não permitindo que um inquilino permaneça numa casa anos e anos sem pagar renda.
Mas ninguém espere uma correcção a curto prazo desta situação absurda, apesar de o crédito estar agora mais caro e difícil. 2009 é ano de eleições.
Ponto de Vista de Francisco Sarsfield Cabral na Renascença
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