quinta-feira, 10 de julho de 2008

REFLEXÃO TOTAL

Um poema de António Gedeão

Recolhi as tuas lágrimas
na palma da minha mão,
e mal que se evaporaram
todas as aves cantaram
e em bandos esvoaçaram
em torno da minha mão.
Em jogos de luz e cor
tuas lágrimas deixaram
os cristais do teu amor,
faces talhadas em dor
na palma da minha mão.

A MINHA ORQUÍDEA

Convivo diariamente com uma orquídea que marcou o seu lugar na cozinha onde apareceu bonita com uma coroa de flores brancas. Habituou-se ao espaço, gostou da luz, mas o tempo não perdoa e as flores foram caindo uma atrás da outra até que ficou sozinha pegada, apenas, à sua haste e sustentada por duas folhas. Fui acreditando que não seria o seu fim, mas, dia após dia, nada de novo acontecia. Cortei-lhe um pouco da haste e mantive a esperança, aliada à caridade, que me levava a olhá-la, pôr-lhe um pouco de água e acreditar que um dia... E esse dia aconteceu quando naquela manhã surgiu uma borbulha, depois outra e outra e a esperança avivou e as borbulhas foram crescendo, calmamente, insensíveis à vontade que eu tinha que fosse de um dia para o outro. Das borbulhas vieram botões, dos botões desabrocharam flores e lá está ela, junto da janela, a emprestar a sua beleza de três hastes que encanta quem pára para a observar. Como a orquídea é a minha Igreja a princípio florida na manhã da Páscoa depois feita caminho e amassada no pó e no sangue a que Pedro e Paulo deram vida com as suas vidas na esperança de que ela voltasse a florir. Tempo de espera e contrariedades, tempo de encontros e desencontros, mas tempo de esperança e certeza de que o Senhor, o justo juiz, compensará com a coroa da justiça mesmo que conquistada no cepo do cadafalso ou no patíbulo da cruz. Esta Igreja percorreu as estradas do Império e fez-se Aveiro pela mão de tantos, Bispos, padres, diáconos e leigos que lhe emprestaram beleza e a tornaram diocese, sempre mais renovada, em cada dia da Igreja Diocesana quando as suas flores invadem o Santuário da Senhora de Vagos e no vaso da comunidade, fiéis ao apelo do Sr. Bispo, nos tornamos mais Igreja porque mais ao serviço dos mais pobres. Por fim, esta Igreja tornou-se vizinha de cada um de nós e veio viver no meio das nossas casas, em terras da Vera Cruz. Como a orquídea, paremos para contemplar a sua beleza feita de tantos gestos e acções que este ano de pastoral envolveram a nossa comunidade e, em cada pétala, agradeçamos a beleza que saiu da inocência das nossas crianças, da alegria dos nossos jovens, do esforço e partilha dos adultos e do sofrimento e das lágrimas de cada doente. É assim a minha Igreja... como a orquídea.
Manuel J. Rocha

FESTA DA RIA - 11 a 20 de Julho

De 11 a 20 de Julho, a Festa da Ria, promovida pela Autarquia Aveirense, com o apoio da Região de Turismo Rota da Luz, pretende potenciar as mais-valias da Ria de Aveiro e do Barco Moliceiro, com a realização de diversas actividades junto à Ria – zona do Rossio – e outras que se desenrolarão nos canais – Regata de Barcos Moliceiros, Raid Cataramarãs “Ria de Aveiro”. Pretende-se proporcionar à população Aveirense e a todos os turistas diversas actividades, nomeadamente, divulgar mais-valias da Ria de Aveiro; dinamizar as noites de Verão, proporcionando-lhes acções relacionadas com a Ria de Aveiro; encher de colorido o Canal Central da Ria de Aveiro, através dos seus moliceiros; consciencializar a população para a importância da Ria de Aveiro; valorizar a cultura e o património existente relacionado com a Ria de Aveiro; dar a conhecer o artesanato da região aveirense; e dar possibilidade às Associações do Concelho de divulgarem os seus trabalhos. Fonte: “Site” da CMA Ver programa

OUVIR OS PROFETAS, UM CAMINHO DE RENOVAÇÃO

O profetismo verdadeiro é sempre um dom a favor de uma comunidade concreta, que vive e se constrói em cada dia, sente interpelações novas, é convidada a tomar iniciativas e a correr riscos, e se sente, pela sua missão, obra inacabada, mas nunca instalada, desanimada ou vencida. O Deus da fé, em relação ao Seu povo, serviu-se dos profetas para mostrar caminhos, animar percursos, julgar passos andados, convidar à fidelidade, corrigir desvios, acordar compromissos. A presença activa dos profetas no meio do povo, provocava alegria e gratidão, porque Deus continuava presente. O seu silêncio dava ocasião à tristeza e desolação, porque o povo se julgava esquecido e abandonado, embora nem sempre os ouvisse. Ontem, como hoje, na Igreja nunca faltaram profetas. Muitos deles sentiram, e sentem a indiferença e, por vezes, o abandono e o despeito dos chefes medrosos, detentores de uma autoridade que não dialoga, ou são esquecidos e perseguidos por um povo que não se quer converter e não suporta o incómodo de profetas que ousam dizer aquilo que não lhe agrada. Por vezes e só depois de muitos anos aparece quem acorde para as palavras do profeta. Então pode-se ver que alguns, ontem perseguidos, são reabilitados e até canonizados, como santos de altar. Recordemos Rosmini que ousou falar das chagas da Igreja. Foi por isso perseguido e agora elevado aos altares. Nos tempos que correram temos visto de tudo isto. Não era de esperar, dado que o Vaticano II deu consciência aos membros da Igreja de que, como baptizados, todos participam do profetismo de Cristo, acordando-os, assim, para o essencial, um aspecto em que o profetismo tem papel insubstituível. Não têm faltado, também, aqui e ali, falsos profetas com interesses que não são os de Cristo. Ele advertiu-nos disso.O cardeal Martini, arcebispo emérito de Milão, biblista reconhecido em toda a Igreja, optou por terminar os seus dias em Jerusalém, “a sua pátria antes da pátria eterna”. Com a liberdade interior que sempre teve e a humildade real e discreta que o torna corajoso e construtivo, continua a exercer o profetismo, como luz do Espírito e dom à Igreja. Assim o fez antes em sínodos, simpósios, congressos, no dia-a-dia do seu ministério episcopal em Milão e como presidente do Conselhos das Conferências Episcopais da Europa. Conheci-o ao longo de vários anos e de muitos encontros regulares. Aprendi com ele a crescer no amor à Igreja de Cristo e na liberdade de a servir. Vi no seu profetismo corajoso um modo de agir em consciência, sem depender de críticas ou de elogios e ousando sempre pagar o preço de todos os profetas. Diz-nos ele agora que “sonhou com uma Igreja que segue o seu caminho na pobreza e na humildade… uma Igreja que não depende dos poderes deste mundo… uma Igreja que dá espaço às pessoas que pensam mais longe… uma Igreja jovem, onde não há lugar para a desconfiança…” Anuncia uma série de temas em aberto, campo de muito sofrimento e alguma esperança, para os quais a Igreja deve de ter coragem profética e ser capaz de ouvir os profetas, que o Espírito suscita. De há muito vem falando neles. Insiste que não basta dizer, à maneira de Cristo, que o caminho da Igreja é o homem e que “as alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos homens do nosso tempo, mormente dos mais pobres e de todos os aflitos, são também as dos discípulos de Cristo, e que nada existe de verdadeiramente humano que não encontre eco no seu coração”. Nada disto se compadece com o alheamento em relação aos profetas, se por ventura se querem caminhos inovadores e não apenas a receita de conselhos piedosos. O cardeal Martini incomoda muita gente instalada, mas fala apenas, eu o posso testemunhar, por fidelidade ao homem e à missão da Igreja. São assim os verdadeiros profetas: livres, corajosos, comprometidos com o essencial, nunca desistindo. António Marcelino

NA LINHA DA UTOPIA

Chimpanzés Cidadãos?!
1. A notícia desperta e desafia a curiosidade do bom senso e do verdadeiro sentido de humanidade: «parlamento espanhol debate “chimpanzés como pessoas”». Confunde-se aquilo que são os maus-tratos, algo sempre a condenar seja em que realidade for, com a assumpção a uma qualidade de dignidade reservada para os humanos. A questão, embora parecendo simplista, é bem séria e profunda. A proposta do grupo Parlamentar Esquerda Unida junto com a Iniciativa Catalunya Verds, representa a fronteira do essencial debate contemporâneo sobre a hierarquia de verdades e sobre o lugar do ser humano no seio de todas as realidades criadas. São já muitos os sistemas de pensamento em movimentos internacionais que, defraudados com a maldade dos humanos, adoram tanto a natureza que detestam as pessoas; este próprio panteísmo vai-se assumindo, à revelia descomprometida das religiões que estimulam ao compromisso histórico, como nova forma de religiosidade, quase natural e misticista, que misturando de tudo um pouco dá um chamado “Cokteil”, uma miscelânia que pode ter o nome de New Age (a Nova Era do Aquário), nascida pelos anos 60. 2. Esta complexidade das novas formas de compreender a “liberdade” pós-humana, sem hierarquia de valores, tem mesmo fundamentação científica: está provado que os chimpanzés têm memória e que o homem partilha «98,4 % dos genes com os chimpanzés, 97,7 % com os gorilas e 96,4 % com os com os orangutangos. (…) Uma organização internacional com o mesmo nome do projecto procura uma declaração da ONU sobre os direitos dos símios e defende direitos iguais aos dos “menores de idade e aos incapacitados mentais da nossa espécie”, segundo os responsáveis do projecto.» Na internet, uma leitura de relance dos comentários ao projecto espanhol, é um profundo alerta sobre o que está a acontecer no mundo, nomeadamente em termos dos pilares fundacionais da humanidade. Por exemplo, o uso descontextualizado da dignidade da pessoa humana transferida para o mundo animal, ou mesmo dos seres vivos e coisas em geral, são reflexo de grave pobreza de valores e de humanidade. 3. Alguns manifestam que a ideia não é nova e que, finalmente, um país tomou a dianteira. Sublinhe-se que não chega o comprovar-se científico da comum pertença de genes entre o ser humano e o chimpanzé; ser humano científico que fica aí perdeu a noção do seu lugar. É indescritível e preocupante o significado (e as consequências) do que esta simples proposta espanhola representa como iceberg de uma imensa conjuntura de questões decisivas quanto ao futuro. É oportunidade para sublinhar e fundamentar o lugar único do ser (do sentir) humano como obra-prima de todas as realidades existentes, estas a merecerem todo o zelo e protecção, precisamente, por parte dos humanos. Estamos diante de uma questão de absoluta fronteira na qual a generalizada indiferença é o terreno favorável à perca da própria identidade humana. Os acontecimentos obrigam ao despertar ético para o que está a acontecer.

quarta-feira, 9 de julho de 2008

NA LINHA DA UTOPIA

Sacerdotisas?
1. A sábia prudência pode conduzir a não problematizar. Mas o encarar os horizontes de futuro obriga a reflectir. Nem seguir as euforias do progressismo nem o fechar da reflexão como se a história não fosse por essência (divina) aberta e à descoberta. Não é novidade para ninguém a matriz patriarcal como noção de “serviço/poder” do judeo-cristianismo, factor que presidiu à configuração das religiões monoteístas e igrejas ao longo dos tempos, mas que retardou mesmo a assumpção social e cultural do horizonte do feminino nas sociedades. A própria possibilidade de um debate teológico aberto, metódico e coerente, no seio das instâncias do Vaticano é ainda uma miragem; a noção de uniformidade de pensamento num dado tão acessório como a “ordenação de mulheres” é bem pesada, o que condiciona toda a estrutura eclesial a não poder dizer outra coisa senão o que diz a estrutura superior: que o assunto está bem como está e que não é sequer para pensar nele! 2. Se se fosse, efectivamente, a pensar a sério nestas questões concluía-se algo tão simples como que Jesus Cristo não fez acepção de pessoas em termos de género (masculino ou feminino) e que escolheu, naturalmente, condicionado pela cultura patriarcal sua contemporânea, e que hoje escolheria seis homens e seis mulheres; ou melhor convidaria culturalmente em função da competência e liderança e não de qualquer outro critério como o de género ou de raça. Esta conclusão, tão simples, a par de outras mais complexas obrigaria a terminar o “discurso da compensação”, quando se procura “iludir o sol com a peneira” ao dizer-se que «a mulher tem na Igreja um papel fundamental» e possui mesmo uma «visibilidade muito grande», como se refere nestes dias (pelo presidente da CEP), fundamentando a rejeição ao pensar da ordenação de mulheres e, ainda, dizendo que entre a própria comunidade protestante o assunto não é pacífico… 3. Sente-se que o mundo precisa mesmo de profetas. A admissibilidade da ordenação de mulheres (e referimo-nos exclusivamente a esta matéria), assunto sensível que vem à tona da água em momentos em que a comunidade anglicana antecipa o futuro, simboliza hoje a necessidade de ir à essência do Cristianismo. O ano dedicado a São Paulo, que faz 2000 anos de nascimento, poderia ser oportunidade de abrir, ao jeito ousado de Paulo, alguns “dossiers” de algumas “questões” absolutamente acessórias (que continuam a ser faladas nos bastidores), mas hoje mais importantes que nunca, em relação à força central da Mensagem de que as igrejas são na história o esforço da presença viva. A sociedade civil, nesta questão concreta da coerência de género, vai muitíssimo à frente. É, naturalmente, preciso coragem (Paulina) para aprender dos valores do bem comum sabendo situar-se no tempo cultural presente. É evidente que não dizemos que tudo o que é tido de “moderno” é bom, de maneira nenhuma… 4. Também há quem veja nesta questão uma dimensão de reivindicação feminista; de maneira nenhuma, não é isso. Será sim, a necessidade séria, coerente e urgente de aprofundar o essencial do Cristianismo, de “joeirar” o que foi sendo a “ferrugem” da história e aceitar a conversão no novo e desafiante tempo do séc. XXI (B. Haring). Esta questão do sacerdócio feminino, com seriedade e serenidade, talvez seja uma dessas questões decisivas. Não a querer ver, primeiramente como sério debate, é fechar a portas ao presente-futuro. E tanto que o mundo precisa de “ar fresco”! A prudência, quando apreendida da viagem da história, conduzirá à abertura de espírito nas grandes questões; até porque o que se deseja para o mundo tem de ser viver “ad intra”. Toda esta reflexão no “princípio da racionalidade” (ponto de contacto com o mundo que se procura servir), que tudo sabe fundamentar e debater, não é nada de novo…

FILARMÓNICA GAFANHENSE - 2

Os primeiros passos da que é hoje a Filarmónica Gafanhense podem ser lidos em Galafanha.