A exploração, a dignidade do trabalho e o lugar do homem
No passado dia 10 de Junho, o Conselho Europeu dos Ministros do Trabalho e Assuntos Sociais aprovou uma proposta de directiva que permite que os 27 Estados-membros da União Europeia possam alargar o limite de trabalho semanal das actuais 48 horas para as 60 horas por semana, se os trabalhadores aceitarem, ou, em caso de acordo colectivo, até às 65 horas. O Documento ainda vai ter que ser aprovado pelo Parlamento Europeu, para entrar em vigor.
O ministro português do Trabalho e Solidariedade Social, Vieira da Silva, declarou que Portugal não fez parte da maioria qualificada que, aprovou esta directiva, por entender que, "apesar de haver uma evolução positiva", a directiva deveria ser mais "equilibrada" e ter mais em conta "a salvaguarda das condições de saúde, higiene e segurança dos trabalhadores".
Sublinhou, ainda, que este projecto de lei deverá sofrer algumas alterações, antes do voto dos parlamentares europeus, esclarecendo que a nova lei mantém a duração máxima de 48 horas semanais e 8 diárias, actualmente consagrada na UE, como regra, e apenas reformula as condições de excepção que pode levar alguns países, em certos sectores e actividades, a recorrerem a este tecto de horas de trabalho.
Em Portugal, a nível da Concertação Social, está-se a discutir a revisão do Código de Trabalho, onde está prevista a adaptabilidade dos horários de trabalho. No entanto, o ministro Vieira da Silva não apresentou, ainda, qualquer proposta sobre este assunto.
Seja como for, a precariedade laboral vai aumentar e vai-se trabalhar mais por menos dinheiro, na medida em que Portugal, mesmo que quisesse, não tem alternativas a esta política ditada pela União Europeia, em nome da concorrência globalizada.
Mais uma vez, a lógica da competitividade selvagem e a qualquer preço prevaleceu sobre o princípio da dignidade do trabalho e do trabalhador. São medidas como estas que vão, gradualmente, desumanizando o mundo, as pessoas e o trabalho. Numa altura em que, na Europa, se discute, a vários níveis e com toda a justificação, as inúmeras crises que a instituição familiar enfrenta e atravessa, não são políticas deste género que contribuem para o reforço da unidade familiar. Bem pelo contrário. Não é com pais ausentes dos seus lares, a chegarem ou a saírem à hora que as entidades patronais decidem, que a família se constrói, fortalece e se torna uma célula activa e solidária da sociedade. Da China e da Índia, ao longo destes anos, temos recebido informação, mais que suficiente, sobre as condições com que os trabalhadores destes dois países, entre outros, exercem os seus empregos, de onde se destacam os salários baixíssimos; a quase inexistência de direitos sociais; proibição de reivindicações; horários de trabalho que chegam ás 15 e 18 horas diárias; exploração infantil; falta de segurança laboral, entre muitos outros abusos desumanizantes que poderiam ser citados.
Nessa altura, alguns ilustres políticos e economistas ocidentais, para justificarem algumas medidas restritivas que eram já impostas aos trabalhadores europeus, em nome da dita “concorrência” asiática, argumentavam que eram países atrasados (hoje, já são “países emergentes”) e que, com o tempo, atingiriam os níveis de protecção (e de desenvolvimento) que, em regra, se aplicam (ainda) na Europa, pelo que tudo tenderia, com o tempo, para o equilíbrio justo, leal e concorrencial necessário. Afinal, bem vistas as coisas, são os dirigentes europeus que estão a começar a adoptar os padrões que antes condenavam nos outros. A prova está à vista e vê-se qual é o lado que está a vencer. Isto é perverso e só é possível de acontecer por falta da imposição de regras, mesmo que faseadas, para todos os intervenientes, a nível mundial, designadamente por parte da Organização Mundial do Comércio. A não ser que, o futuro, nos reserve a reposição da escravatura!
Vítor Amorim