Fidelidade e coesão social
1. Talvez possa parecer que uma coisa não tem nada a ver com a outra. Que tem a fidelidade conjugal a ver com a coesão social? Será entrar na esfera privada tirando ilações precipitadas para o terreno do que é público? Em última análise, a pergunta é: que tem a família como comunidade informal a ver com a sociedade em geral? Que fronteiras, implicações, possibilidade de laços (no respeito devido pelas autonomias) na compreensão justa daquilo que é a liberdade pessoal e o compromisso da vida em sociedade? As perguntas poderiam nunca mais acabar, em terreno de não fácil abordagem, onde não se quer nem que outrem entre pela casa dentro a impor uma qualquer lei, nem que cada pessoa e família vivam de tal modo afastados da sociedade que se tornem indiferentes àquilo que é o bem comum.
2. No recente dia dos namorados, que a propaganda foi inventando, exaltando, “impondo”, em Inglaterra foi publicado, no jornal The Guardian, um interessante estudo sobre a fidelidade e a evolução do homem. Johnjoe McFaden, professor de genética molecular, defende a sua tese de que foi a «fidelidade que permitiu aos nossos antepassados desenvolver a inteligência social e a coesão social», tendo os humanos a sorte de pertencer a espécie que se comporta de forma predominantemente monogâmica, revela o estudo. Também, destaque-se que alguns trabalhos recentes de investigação nesta área «sugerem que as exigências cognitivas requeridas para formar casais estáveis podem estar entre os factores para o desenvolvimento dos instrumentos de inteligência social que tornaram possíveis as nossas sociedades» (Público, 15 Fev.: 54).
3. Talvez nos possamos colocar no filme da história do processo da evolução do ser humano, mesmo desde os tempos pré-suméria, e concluir que as sociedades humanas na sua procura crescente de capacidade de coexistência em sociedade terão tido como modelo de referência a vivência familiar. Nada de novo, afinal esta é a comunidade primordial. Tal facto significará que a busca de coesão social, pela família, foi derrubando os muros do individualismo, do particularismo, do pensar só em si. Olhando para os tempos da actualidade, uma pergunta vai-se impondo: as sociedades ao esquecerem a família na sua realidade ancestral (chame-se: homem, mulher e filhos) perderão as capacidades de coesão social?...
4. Seja dito o que se vai dizendo (como constatação e preocupação): do ano 2000 para cá, já metade dos casamentos terminaram em divórcio. Muita da educação (possível) é monoparental. As raízes de pertença vão ficando cada vez mais superficiais, vivendo-se pouco ligado a alguma realidade de comunidade viva (?)... Neste cenário, e na pressuposta liberdade de tudo, quem se preocupa com o que acontece? Há quem a sério se preocupa e procura apontar caminhos… E há pais e educadores que descobriram o segredo das pertenças a um grupo / comunidade como alavanca para os valores fundamentais. Afinal, sendo tudo questionável, uma coisa não o é: quanto mais o valor Família semearmos, mais aconchego um dia colheremos! Quando não, será solidão…
Alexandre Cruz