Que Sapienza?!
1. “Sapienza” é palavra italiana que significa “sabedoria”. A Universidade La Sapienza de Roma é uma prestigiada universidade, hoje pública, que nasceu a 20 de Abril de 1303 por decreto papal de Bonifácio VIII. É uma das mais antigas e maiores universidades do mundo, com cerca de 150 mil estudantes. À sua história pertencem momentos conturbados da própria história da Europa e, dentre as várias reformas de que foi alvo, destaque-se mesmo a Reforma Napoleónica. Na natural preocupação de confrontar conhecimentos com intelectuais de todas as épocas, a Universidade La Sapienza, aberta à pluralidade de expressões, desta vez convidara o teólogo papa Bento XVI. Saudavelmente, tal como vai convidando intelectuais de toda a ordem filosófica, política e religiosa, desta vez o livre convite dirigia-se a uma das personalidades do mundo cultural, que aceitara com o maior prazer.
3. O que não seria nenhuma notícia de especial acabou por sê-lo. Um grupo de professores, intelectualmente mais uma vez descontextualizado com afirmações (de há anos) deste pensador, mobilizou opinião contra a sua vinda. Rapidamente os estudantes foram apanhados na rede que ampliaram, gerando-se o mal-estar com proporções anuladoras da visita de Bento XVI. Muito para além de questões de religião, este cenário, primeiramente, diz-nos que qualquer personalidade que represente uma determinada comunidade corre hoje o perigo de não ser bem-vinda ao “espaço público” de todos. Sinal de intolerância das liberdades? Segundo, porventura, na falta de qualidade racional, pode-se abrir palco a ideias de ditadores mas fecha-se a porta à liberdade de expressão do confronto saudável de ideais e valores… Caminha-se “anti”, será laicismo intransigente? E a LIBERDADE proclamada?
3. É certo que existe uma factura histórica que se paga sempre no presente, quando as hegemonias de outros séculos foram impostas à força, tanto da parte de sistemas filosóficos, como de políticos e religiosos. Mas as intolerâncias crescem tanto mais quanto menos a cultura da racionalidade iluminar o pensamento. E é aqui que a exclusão de Bento XVI, como dizem vários pensadores ateus e agnósticos, acaba por ser sinal de desonestidade intelectual para onde deixámos cair os valores e a razão. Defensor dos princípios da laicidade, Ernesto Galli, editorialista do jornal Corriere de la Sera, escrevia que este gesto traduzia «uma laicidade oportunista, alimentada por um cientismo patético, arrogante na sua radicalidade cega». Correrá Ernesto Galli perigo de vida?! A este caso poderemos juntar (em âmbitos diversos) o da visita de Dalai Lama ou a famosa aula do papa na Universidade de Ratisbona do ano passado, onde as frases retiradas do contexto foram o que foram.
4. Independentemente de todas as histórias do passado, e de todos os lados da barricada, precisa-se de uma ordem da racionalidade justa e honesta que não se feche à pluralidade de opinião e compreenda o pensamento “lendo” até ao fim. Quando não, adeus liberdade ocidental! Claro, de tudo isto a única preocupação será a Liberdade, na Verdade, com Humanidade. Embora marcando o timbre do tempo, tudo passa; em tempo global, as aberturas são mesmo irreversíveis. Sejam ao serviço da Humanidade aberta.
Alexandre Cruz