Reflexão de Georgino Rocha
para o Domingo XXXII do Tempo Comum
Afirmação clara e conclusiva que desmonta a armadilha que os saduceus lançaram a Jesus e que visava ridicularizá-lo em púbico. Alegre notícia, portadora de fé e de esperança, para o coração humano inquieto com o futuro da vida. Mensagem encantadora que desvenda o rosto autêntico de Deus, o Senhor da vida, no qual todos vivem para sempre. Resposta feliz e apelo solícito que partem de Jerusalém e, ao longo da história, se prolongam por todo o mundo, despertando energias adormecidas em toda a humanidade, abrindo-lhe horizontes novos e definitivos. Resposta com garantia comprovada na ressurreição.
O Papa Francisco, na exortação apostólica «Alegria do Evangelho» 278, afirma que “a ressurreição de Cristo produz por toda a parte rebentos deste mundo novo; e, ainda que os cortem, voltam a despontar, porque a ressurreição do Senhor já penetrou a trama oculta desta história; porque Jesus não ressuscitou em vão. Não fiquemos à margem desta marcha da esperança viva!
Acreditamos na acção misteriosa que o Evangelho apresenta como “Reino de Deus já está presente no mundo, (que se vai) desenvolvendo aqui e além de várias maneiras: como a pequena semente que pode chegar a transformar-se numa grande árvore (cf. Mt 13, 31-32), como o punhado de fermento que leveda uma grande massa (cf. Mt 13, 33), e como a boa semente que cresce no meio do joio (cf. Mt 13, 24-30) e sempre nos pode surpreender positivamente: ei-la que aparece, vem outra vez, luta para florescer de novo”.
O grupo dos saduceus configura, de algum modo, o conjunto de pessoas que pretende garantir a sobrevivência do ser humano por meio da descendência. E daí, apoiados na lei do levirato (cf. Dt 25,5-10), a historieta que inventam. Morre o marido e não deixa filhos. Como fazer para que os bens não se dispersem e, sobretudo, a sua memória perdure longamente? A resposta encontrada esgota as hipóteses plausíveis. Sete é número de plenitude. A descendência é a forma mais nobre encontrada pela razão humana, superando modos muito apreciados por outras culturas: plantar árvores, gravar nomes em pedras, construir monumentos, escrever pergaminhos ou livros. (Ainda não se falava de clonagem, nem de reprodução medicamente assistida, nem de coisas no género). Esta diversidade põe em evidência a aspiração fundamental do ser humano que nasce para viver e não para morrer, para conservar a sua integridade original e não para se dissolver na podridão final.
Esta aspiração vital é satisfeita, plenamente, na comunhão com o Deus da vida, de que fala Jesus Cristo. Para Ele todos estão vivos. A prová-lo fica o testemunho dos patriarcas e do próprio Moisés, que havia prescrito a lei do levirato. A razão é simples: se eles estão em Deus fonte da vida, todos vivem, todos participam desta fonte inesgotável.
Alguns saduceus, ao ouvirem o ensinamento de Jesus, comentam: “Foi uma boa resposta, Mestre” e sobre o assunto ninguém mais tem coragem de fazer qualquer outra pergunta. Para os discípulos a questão é assertiva e estimulante. A vida humana, sendo nossa por natureza, é dom de Deus, sagrada; doada, portanto. A natureza pessoal tem ritmos no tempo e vai-se consumindo. Chega a hora de passar ao ritmo novo e definitivo, qualitativamente diferente: o ritmo da vida eterna, da comunhão plena na família de Deus, onde se encontram todos os humanos que deram resposta positiva, embora com modalidades muito plurais e diferenciadas, ao amor que Deus nos tem. Buscar outras saídas para o nosso futuro pessoal e colectivo é fruto apreciável da razão humana que fica, sempre, às portas do grande mistério, desvendado por Jesus, na magnífica resposta que dá aos saduceus.
A única morte que Deus conhece é resultante do pecado, recusa consciente e livre do amor que Deus nos tem e se manifesta em opções indignas da condição humana revelada por Jesus Cristo. Recusa que desvirtua o projecto original com práticas de mentira em vez da verdade, de corrupção em vez da integridade, da marginalização em vez da inclusão, da aversão e do ódio em vez do acolhimento e do amor.
Para Deus, todos estão vivos. Alegre notícia a comunicar a todos. Verdade sublime a envolver-nos sempre e em tudo.
Pe. Georgino Rocha