Andei, há anos, envolvido em tarefas de alfabetização de adultos. Eram tempos de sensibilizar as pessoas para aprenderem a ler, para posteriormente se habilitarem a fazer o exame da quarta classe, necessário para ingressarem num trabalho estável, dando acesso a carreira profissional, com algumas garantias de futuro.
Andei de terra em terra pelo Distrito de Aveiro, criando e apoiando cursos, com recurso, inúmeras vezes, aos professores e párocos das freguesias, muitos deles sensíveis à problemática da alfabetização. Isto antes do 25 de Abril e ainda depois dessa data histórica.
Um dia, numa aldeia, pastoreada por um prior idoso, lancei a ideia de abrir um curso para homens e mulheres. O prior concordou e tratei de tudo para que o curso começasse a funcionar o mais depressa possível. Tudo feito, era necessário avisar a população para se inscreverem em determinado lugar, para as aulas funcionarem à noite, depois dos trabalhos. E o prior ficou encarregado de avisar nas missas, lembrando a importância de saber ler, escrever e fazer contas.
Tempos depois, apareci na freguesia para saber o resultado. E dirigi-me ao senhor prior:
— Então, senhor prior, há muitas inscrições?
E ele saiu-se com esta:
— Fiquei a pensar… O senhor acha que eu ia colaborar numa saída de casa, depois do sol posto, de rapazes e raparigas, homens e mulheres, para aprenderem a ler? Não conte comigo.
Fernando Martins