Reflexão de Georgino Rocha
para o Domingo XXII do Tempo Comum
Na comunidade de Jesus, as atitudes devem ser diferentes, convergindo, todas, na humildade e na verdade, na gratuidade e no amor desinteressado, na atenção preferencial e delicada ao esquecido e abandonado.
Este apelo-convite surge na parábola do banquete, narrada por Jesus, na conversa, à mesa, com um fariseu que o havia convidado a tomar uma refeição em sua casa. Constitui uma espécie de resposta às atitudes dos comensais que buscam os primeiros lugares, sinal ritual da importância social e religiosa de cada um. Serve de contraponto e realça valores fundamentais a quem pretende ser discípulo e fazer parte da comunidade dos que o seguem. Lc 14, 1. 7-14.
“Jesus contrapõe à conduta regida pela lei da reciprocidade comercial – dou-te se me dás… e para que me dês também – a atitude da generosidade gratuita. Esta é a do discípulo: amar a fundo perdido. Jesus quer que os discípulos colaborem na construção do Reino para ir forjando o mundo mais humano e fraterno querido por Deus”. J. Casanova, Homilética 495, Ano C.
Estar à mesa e comer juntos tem um grande significado familiar, social e religioso: encontro amigo e fraterno, conversa e partilha de notícias e saberes, reforço de laços de proximidade, afirmação de estima mútua e de próxima ou igual categoria. Assim o entendiam todos os participantes. Por isso se observam mutuamente. Jesus não foge à regra.
A elaboração da lista dos assentos é delicada. Ainda hoje. E os organizadores manifestam a relação que cultivam com os convidados e a importância social que lhes reconhecem. Um engano pode ser fatal. O acerto na escala de distribuição faz transparecer a harmonia do conjunto em festa, a alegria e boa disposição de cada um, o reconhecimento da escala social que lhe é atribuída.
A procura dos primeiros lugares denota elevada auto-consideração e outros sentimentos superiores que nem sempre são aceites, nem confirmados, pelos outros participantes. Realça critérios pautados por interesses elitistas e clubistas. Constitui uma amostra de uma sociedade desigual, sem espaço nem abertura para os de fora, os filhos de ninguém.
A introduzir a ambientação musical da nossa celebração, o referido autor afirma que a liturgia de hoje nos traz preciosos ensinamentos. Deus manifesta-se na pequenez, na debilidade. Ele olhou assim a sua humilde serva, Maria. A grandeza do pequeno, da humildade, do ser um de tantos, irmão com os irmãos, de não nos crermos os melhores, o pensar que os outros necessitam mais que eu, o aceitar o que são por si mesmos não pelos cargos que ocupam, pelas qualidades e virtudes que tem, e não pelas aparências… Ensinamentos preciosos, necessários e actuais sobretudo numa sociedade em que o que conta é figurar, competir e destacar-se nos primeiros lugares.
Na comunidade de Jesus, as atitudes devem ser diferentes, convergindo, todas, na humildade e na verdade, na gratuidade e no amor desinteressado, na atenção preferencial e delicada ao esquecido e abandonado. Assim se manifesta a situação nova, em emergência, o reino de Deus. Assim se abrem as janelas do futuro definitivo de toda a humanidade.
“Ei ", diz o Papa Francisco, acolhendo uma criança que se aproximou dele na audiência geral de 17 de Agosto de 2022. A criança “enganou” a segurança do Papa, subiu as escadas e ficou ao lado dele: “Ei, como vais, qual é o teu nome”, diz-lhe o Papa. E acrescenta a saudação com outra pergunta: “Gostas de estar aqui? – Sim. Senta-te ao pé de mim". A audiência, exultante, aplaude efusivamente. Zenit.org 17 de Agosto de 2022.
“Amigo, vem mais para cima. Ocupa o lugar que é o teu”. Jesus faz uma proposta subversiva: atender a quem não pode corresponder, amar a quem não pode retribuir. Os cristãos, seus discípulos, assumem alegremente esta proposta e ficam encarregados de a viver e transmitir numa sociedade tão assustadoramente discriminatória.
Pe. Georgino Rocha