Reflexão de Georgino Rocha
para o Domingo XVI do Tempo Comum
Jesus continua a sua caminhada para Jerusalém e aproveita para fazer os seus ensinamentos, ora por gestos e palavras, ora por atitudes e parábolas. Acompanha-o o grupo dos discípulos. Avança por cidades e aldeias. Escolhe o ritmo da viagem. Atende a quem o procura e lhe manifesta um desejo. Toma, também, a iniciativa de ir ao encontro de quem quer. Para visitar amigos e fazer confidências. Para descansar e revigorar forças. Seja qual for a razão, Jesus faz, de cada passo, uma ocasião para dar a conhecer algum detalhe da sua mensagem. Lc 10, 38-42.
Lucas – o evangelista médico que narra a visita de Jesus a Marta e a Maria – coloca este episódio após a parábola do bom samaritano e antes da oração do “Pai Nosso”. Parece atribuir-lhe uma força emblemática: a situação marginalizada da mulher entre os judeus e a igualdade radical de todos os humanos, a urgência de caminhar para uma sociedade inclusiva que seja espelho do “nosso Pai”, da comum humanidade de todos. E define a correspondente regra de ouro: abrir a porta e saber acolher; escutar e entrar em sintonia, facilitar. Esta regra mantém um valor acrescido na cultura hegemónica que nos envolve.
Com admirável encanto exorta Santo Ambrósio: Abre a tua porta Àquele que vem, abre a tua alma, revela o interior do teu espírito, para que nele vejas afluir as riquezas da simplicidade, os tesouros da paz, a suavidade da graça. Dilata o teu coração, vai ao encontro do sol da luz eterna que ilumina todo o homem.
Abrir a porta da casa, construção material e lar familiar, espaço da consciência pessoal e da dignidade comum, âmbito do diálogo na verdade que liberta e faz crescer. A abertura desta porta pode estar condicionada por factores externos, mas é feita, sempre, a partir de dentro. A chave, por excelência, é a fé de adesão cordial e inteligente a Jesus Cristo, fruto da Palavra de Deus. Diz o Senhor: “Já estou à porta e bato. Quem ouvir a minha voz e abrir a porta, entro em sua casa e janto com ele e ele comigo” Ap 3, 20). Não força. Aguarda uma decisão livre.
A primeira leitura da Liturgia da Palavra do Domino XVI realça a atitude de Abraão que sabe acolher desconhecidos prestando-lhes generosamente os cuidados usuais. Como Marta, a incansável dona de casa, que se esmera na prática das regras da boa hospitalidade. Como Maria, a ouvinte dócil e atenta, que se senta aos pés de Jesus, qual discípula fiel.
Acertadamente afirma J. M. Castillo: Marta é “a ajuda”. Maria é “a escuta”. Marta representa “o ser para”. Maria representa “o ser com”. Marta é “o serviço”. Maria é “a companhia”. Todos os seres humanos necessitamos na vida de ambas as coisas, quer dizer, o que representa Marta e o que representa Maria. Marta é a representação do que cada um necessita dos outros. Maria é a representação do que cada um oferece aos outros. Isto explica porque é tão gratificante receber ajuda, mas é mais gratificante ter diante connosco alguém que nos escute. J. M. Castillo, La Religión de Jesús, Comentários Ciclo C 2018
Escutar e entrar em sintonia constitui a terceira fase daquela regra de ouro. Assim o mostram os modelos referidos. Escutar e decifrar as mensagens que são transmitidas por palavras e silêncios, por gestos e atitudes. E descobrir neles a pessoa e seu estado anímico e espiritual, o seu drama, a sua aspiração silenciada, o seu sonho adormecido. Entrar em sintonia para reagir positivamente, dar o passo possível e construir solidamente a vida. Como Maria, a jovem de Nazaré, que se abre à mensagem do Arcanjo e disponibiliza para o que Deus quer. Bela atitude de quem acolhe Jesus na sua própria casa.
Pe. Georgino Rocha