Reflexão de Georgino Rocha
para o Domingo XVIII do Tempo Comum
Jesus continua a viagem para Jerusalém e apresenta a sua mensagem em ensinamentos de vida, tirando partido das ocasiões que provoca ou aproveita. Os autores dos Evangelhos articulam, de forma literária bela, a sequência destes ensinamentos, desvendando o sentido mais profundo da viagem, enquanto escola de discipulado, itinerário de doação e espiritualidade, estágio de acção missionária. Lc 12, 13-21.
Uma das ocasiões surge ao ouvir o pedido de alguém anónimo que queria que ele interviesse numa questão de partilhas da herança familiar entre irmãos. Este pedido mostra que Jesus é reconhecido como rabino e, como tal, podia solucionar legalmente tais questões ( Dt 21, 15-17; Nm 27, 1-11). A resposta parece evasiva, embora afável, e tem a forma de uma interrogação: “Amigo, quem me fez juiz ou árbitro das vossas partilhas?” E a ilustrar a sua recusa, continua o ensinamento sobre o valor da vida que supera todos os bens. Termina com uma exortação: Guardai-vos de toda a cobiça; a vida não depende da abundância dos bens.
Está comummente aceite, afirma J. Maria Castillo, que foi a cobiça o factor que desencadeou a crise económica mundial, da qual nos dizem que estamos a sair, mas que em realidade continua a produzir o fenómeno criminoso da concentração nos mais ricos, ao passo que a grande maioria da população mundial sofre cada dia que passa: milhões de trabalhadores no desemprego e incontáveis famílias em casa, sem meios de subsistência e à beira do desespero total…
O argumento de Jesus contra a cobiça é contundente e simples: a cobiça pelo dinheiro é irracional, empurra a tomar as decisões mais desconcertantes, cega os cobiçosos até ao extremo de não verem o mais evidente: o capital que acumulam não lhes assegura nada nem lhes pode garanir que vão estar vivos amanhã ou que o êxito económico lhes vá durar mais de vinte e quatro horas… E nunca deveríamos esquecer que cobiçosos somos todos. José M. Castillo, La Religión de Jesús, Comentario Ciclo C.
Outrora, como agora, a avareza tende a apoderar-se do coração humano que fica sem espaço para mais nada nem ninguém; a fazer-se centro de preocupações absorventes e de atitudes invejosas; a transformar os bens no deus da vida a quem se sacrifica tudo: amizades, família, profissão, honestidade e integridade, futuro que se reduz ao presente fugaz, consciência que se cala perante a conveniência. A erguer celeiros de prosperidade para alguns e a deixar multidões “de mãos vazias”.
O Papa Francisco realiza esta semana a Peregrinação Penitencial ao Canadá onde se encontra com responsáveis de tribos indígenas para lhes pedir perdão, mais uma vez, pelo proceder da Igreja no campo da educação ao longo do século passado. Educação que foi de assimilação e europeização e não de atenção aos valores culturais e à sua promoção, impedindo a construção de uma sociedade de todos/as.
Jesus quer visualizar o seu ensinamento e narra uma parábola familiar aos ouvintes: O agricultor que consegue uma boa colheita, armazena-a e, (im)previdente, pensa que está provido para muitos anos e, portanto, pode cuidar apenas de si, descansando e regalando-se. Naquela noite, ocorre a sua morte. E os bens guardados no celeiro da fortuna para que servem? A quem aproveitam? De que lhe valem?
“Insensato!” – exclama Jesus, apontando a função dos bens ao serviço da vida, a felicidade de ser rico aos olhos de Deus, a alegria de saber repartir por quem precisa, de ter um coração amigo e benfazejo.
“Eu mostro-te onde podes guardar melhor o teu trigo – diz Santo Ambrósio, bispo de Milão no século IV – onde podes estar seguro de que não serão roubados pelos ladrões: Dá-o aos pobres”.
Pe. Georgino Rocha