Reflexão de Georgino Rocha
para o Domingo III da Páscoa
Jesus, o Senhor ressuscitado, aparece aos discípulos na margem do mar de Tiberíades. Era o romper da manhã de um novo dia. E diz-lhes: “Rapazes, tendes alguma coisa de comer?” É neste cenário que surge a novidade que quer transmitir-lhes, a eles e a nós. Jo 21, 1-19.
O «Homem de Nazaré» não se deixa confinar: nem pelos laços familiares, nem pelo seu grupo de discípulos, nem pela Lei, nem pelas representações feitas dele, nem pela morte, afirma Jacques Gaillot. Ele não ficou prisioneiro do túmulo. Ressuscitado dos mortos, Jesus está vivo para sempre. A vida de Deus resplendece nele. Unissinos. Ele o Vivente é definitivamente livre.
O mar de Tiberíades é cenário aberto e expressivo da acção de Jesus ressuscitado. Acção que nos chega em forma de narrativa com fundo histórico e carácter simbólico. Comporta uma mensagem qualificada fazendo o relato da aparição/manifestação de Jesus aos discípulos pescadores.
Antes de serem discípulos, alguns dos que seguiam Jesus eram pescadores de profissão, conhecendo bem os tempos e as marés, o rumo previsível do peixe em movimento e, consequentemente, as horas propícias para a sua captura. Também lhes eram familiares a barca do trabalho, as redes da esperança, o saco repleto de sonhos alcançados ou de desejos adiados. Esta sábia experiência perdura, mesmo durante o acompanhamento de Jesus, em que tantas surpresas aliciantes acontecem.
Este domingo celebra também o Dia da Mãe, dia a que a Comissão Episcopal dedica uma expressiva mensagem. Dela, extraímos este precioso parágrafo: A história “está cheia de mães fortes” nos sacrifícios por causa dos filhos e “heroínas quando foi necessário protegê-los”, e neste Dia da Mãe de 2022, a Igreja Católica presta “a sua homenagem a todas estas ‘mães coragem’ de todos os dias, as que nunca desistem de cuidar, proteger e ensinar a crescer saudáveis os seus filhos”.
Retomando a reflexão que vínhamos fazendo, vemos que o desfecho de tudo isso – a condenação à morte do Mestre – desilude-os completamente, deixa-os desorientados e leva- os a regressar a suas casas, a retomar o trabalho do “ganha pão”, a “fazer o luto” pela perda do amigo em quem confiaram, a recompor-se interiormente, a reconstituir os laços solidários com a vizinhança e os companheiros da faina, a encarar o futuro ensombrado que, lentamente, se vai entreabrindo.
Após uma noite de labuta estéril, deparam-se com uma surpresa desconcertante. Era ao romper da manhã. Rapidamente chegaria a claridade do pleno dia. Jesus tinha em marcha um plano de regeneração das esperanças desfeitas e dos ânimos abatidos. Ele mesmo liderava o processo. “Rapazes, tendes alguma coisa de comer?” “Não” – respondem, dando voz à situação de privação em que se encontram e indiciando o vazio interior em que se sentem. “Lançai as redes para o lado direito do barco e encontrareis”.
Eles, homens calejados naquelas lides, confiam docilmente na palavra de um desconhecido. Nem sequer contrapõem a sua experiência amadurecida ao longo dos anos. E avançam pelo mar dentro. Entretanto, Jesus prepara-lhes uma recepção calorosa: brasas acesas na praia com peixe em cima e pão. E diz-lhes: “Trazei alguns dos peixes que apanhastes agora”, acrescentando: “Vinde comer”. De facto, a pesca, contra todas as expectativas, tinha sido muito abundante.
A cena desenrola-se com outros episódios significativos: João que intui ser Jesus ressuscitado a figura da margem; Pedro que se lança à água; barcas que são puxadas pelos pescadores; diálogo de amor e missão que Jesus tem com Pedro e o convite que lhe faz: “Segue-me”.
Em cenário de pesca marítima, o narrador “desenha”, com traços muito vivos, a relação de Jesus com os discípulos, com a comunidade eclesial, com Pedro e seus sucessores. Define a missão que lhes confia como um serviço de amor. Apresenta o mar da vida como horizonte e fronteira de acção. Vela com solicitude por todos e marca encontro/convívio na refeição/eucaristia. De facto, Jesus toma sempre a iniciativa e orienta a sua Igreja no desempenho da sua missão no mundo, na sociedade.
Pe. Georgino Rocha