Diante das atuais dificuldades e desafios lançados é necessário que se renove e cresça o desejo de se fazer caminho em conjunto
Estamos em Jerusalém. No coração do Templo. Para mais um ensinamento de Jesus. “Em frente à arca do tesouro” é o local escolhido por Ele para observar as atitudes dos que se aproximavam para fazer as suas ofertas. Mc 12, 38-44.
Sentado, é a posição normal do corpo que, nestas circunstâncias, adquire um simbolismo cheio de riqueza humana: observação e escuta atenta, acolhimento solícito, reflexão profunda, discernimento lúcido, sabedoria interiorizada, autoridade moral, transmissão da mensagem colhida e assimilada. A ilustrar este simbolismo, que pode facilmente ser ampliado, estão os episódios de Jesus no monte das bem-aventuranças, de Maria ao ouvir os magos e os pastores em Belém, de certas parábolas dos Evangelhos, de Abraão junto ao carvalho de Mambré, e tantos outros.
Sentado a observar dá conta dos escribas que se exibem, no meio da multidão dos ricos que depositam grandes quantias, da pobre viúva que apenas traz uns cêntimos; das grandes vestes de uns e da roupinha melhorada para ir ao Templo; dos gestos vistosos e da simplicidade discreta. Dá conta e comenta, em género de ensinamento, que fica para todo o sempre. A cena narrada perante os discípulos parece provocante: Escribas e o seu estilo, a viúva e a sua discrição. Parece dizer: cuidado com o que ensinais; o pequeno é a medida da entrega.
A exibição dos escribas abre “janelas” para o mundo da imagem, da sociedade mediática, da religião imponente, de quem vive das aparências e esquece a realidade do ser humano e das suas aspirações silenciadas e insatisfeitas. A ostentação dos ricos mostra o valor dos seus bens – única fonte de preocupações - e o desejo de serem reconhecidos pela sua generosidade, deixando a claro o vazio do seu coração. A discrição da viúva e a magreza da sua oferta – “perdida” na multidão e insignificante na quantia, mas de enorme alcance simbólico – abrem horizontes à confiança radical de quem se entrega com tudo o que tem.
O Papa Francisco, ao comentar as bem-aventuranças, na Festa de Todos os Santos, afirma a propósito: “Isso significa uma outra pobreza, ser pobre por dentro, esvaziar-se de si mesmo para dar lugar a Deus. Quem se julga rico, bem-sucedido e seguro, baseia tudo em si mesmo e fecha-se para Deus e os irmãos”, assinalou, mas quem permanece aberto a Deus e ao próximo “encontra alegria”. Esta mensagem é o anúncio de uma “felicidade inaudita”.
O estilo de vida das viúvas, de que fala a liturgia, faz-nos reler com redobrada atenção a 2ª leitura, da carta aos Hebreus. Nele se espelha a atitude heróica de Jesus Cristo que se entrega ao Pai. Oferece-se a si mesmo e não apenas o que tem para dar a salvação aos que O esperam Heb 9, 28.
O contraste é evidente e significativo. Jesus faz os seus ensinamentos, a partir de situações concretas. É a vida que diz quem nós somos. Só a coerência humaniza. Só a confiança dá consistência à vida em sociedade. Só a entrega radical oferece garantias seguras de um futuro melhor, alicerçado num presente solidário. Os discípulos – de todos os tempos – estão chamados a captar esta mensagem.
No entanto, observa o Bispo de Aveiro a propósito da Semana dos Seminários que está a decorrer: “A falta de uma adesão pessoal e viva a Jesus Cristo e de ligação maior com a comunidade eclesial coloca-se entre as causas que explicam o facto de serem poucos os jovens que decidem entrar no Seminário.
Diante das atuais dificuldades e desafios lançados é necessário que se renove e cresça o desejo de se fazer caminho em conjunto. Estamos, pois, perante um "desafio" que está ligado a um "apelo" que Deus faz ressoar no coração de todos nós e está de acordo com os desafios que o Papa Francisco pede a toda a Igreja: a renovação do rosto da Igreja passará por ser mais sinodal e menos clerical, e será o de uma comunidade cristã, em que se articulam os ministérios do presbítero, do diácono e dos leigos”.
Pe. Georgino Rocha