para o Domingo XXX do Tempo Comum
"Quando experimentamos a força do amor de Deus, quando reconhecemos a sua presença de Pai na nossa vida pessoal e comunitária, não podemos deixar de anunciar e partilhar o que vimos e ouvimos.”
Papa Francisco
Esta exortação “faz a ponte” entre o grito confiante de Bartimeu e a atenção que Jesus lhe quer dispensar. Condensa e exprime o desejo recíproco do encontro, do diálogo pretendido, da compaixão suplicada. Evidencia a situação de quem está retido à beira dos caminhos da vida e dos que, livremente, vão fazendo o seu percurso, integrando-se nas multidões ou acolhendo-se a grupos de preferência. Mc 10, 46-52
Marcos narra o episódio do cego de Jericó, colocando-o, pedagogicamente, após a tensão surgida entre os apóstolos por causa de saber quem entre eles é o maior e antes de se “fazerem ao caminho” que o Mestre decididamente ia tomar rumo a Jerusalém. Aqui, se desvendará quem é o primeiro no reino de Deus: o que, por amor, a tudo se sujeita, mesmo à morte de cruz. O autor pretende “desenhar” o perfil do verdadeiro discípulo.
Bartimeu sente as limitações e sofre as consequências resultantes do seu estado, numa sociedade legalista e discriminatória, A necessidade força-o a pedir esmola, saindo para os caminhos por onde passavam os transeuntes. Um dia ouve dizer que Jesus de Nazaré ia a passar e dá largas à sua voz reprimida, gritando: “Filho de David, tem compaixão de mim”. Esta súplica mostra a sua confiança em ser atendido, pois, como outrora David protegia os seus súbditos necessitados, assim agora – pensa o cego – Jesus lhe iria valer, compadecendo-se da sua situação.
A multidão tenta abafar o seu grito, repreende-o e manda-o calar. Ele, porém, não está disposto a perder a oportunidade e insiste. Vence com a sua persistência as tentativas de o silenciarem. Que lição para os tempos que correm! Resistir à onda avassaladora da dignidade humana, do destino universal dos bens, da solidariedade subsidiária, do direito dos cidadãos à escolha da educação, da expressão pública da fé. Dar voz aos gritos abafados dos idosos solitários, às lágrimas dos espoliados dos bens de sustento, às dores das vítimas da conjuntura económica, aos gemidos dos “sem voz” nesta crise alarmante.
Jesus detém-se, manda-o chamar e espera. O recado chega depressa. Que dita não terá vivido Bartimeu naquele instante! E ainda por cima com o apoio amigo de quem lhe transmite a mensagem. Momentos únicos na vida. “Coragem! Ele chama-te”.
O encontro dá-se, o diálogo clarifica o pedido e a compaixão manifesta-se. Jesus declara-o curado, devido à sua fé confiante. O cego recupera a vista e segue Jesus pelo caminho, rumo a Jerusalém, onde verá “coisas maiores”: o amor feito doação que brilha na morte tenebrosa da cruz e na ressurreição refulgente da sepultura na manhã da páscoa.
O Papa Francisco na mensagem para o Dia mundial das Missões que hoje se celebra, afirma: “Quando experimentamos a força do amor de Deus, quando reconhecemos a sua presença de Pai na nossa vida pessoal e comunitária, não podemos deixar de anunciar e partilhar o que vimos e ouvimos.” Façamo-lo em forma de prece.
«Senhor, que eu veja» os que estão sentados à beira dos caminhos da vida, mendigando dignidade e alimentos, saúde e consideração, sofrendo de ansiedade e falsa informação.
«Senhor, que eu veja» os que escutam a voz dos marginalizados e silenciados, dos perseguidos e foragidos, dos solitários e náufragos, dos sem-trabalho e dos enredados nas teias da sociedade sem terem quem lhes dê a mão e encaminhe.
«Senhor, que eu veja» o Teu rosto espelhado no sorriso e na coragem dos missionários que deixam a sua acomodação e partem a anunciar o Evangelho, a promover as pessoas pela educação libertadora, a humanizar relações de trabalho, a dignificar o cuidado das criaturas e a respeitar o meio ambiente.
«Senhor, que eu veja» a minha consciência e os seus critérios de valoração, o meu coração e seus afetos, a minha mente e a sua saúde funcional, a minha abertura a Vós e ao vosso amor que a todos cura as feridas e perdoa os pecados.
«Senhor, que eu veja» e com novo olhar, como o cego de Jericó, Vos siga no caminho de Jerusalém que leva ao calvário onde se consumará a doação na morte por crucifixão, acompanhada pelo rasgar do véu do Templo, aurora da vossa ressurreição.
Pe. Georgino Rocha