para o Domingo XIX do Tempo Comum
A narração da leitura do Evangelho de hoje apresenta um novo passo de Jesus no seu discurso sobre o pão da vida. Jo 6, 41-51. E nos próximos domingos, também. São passos que conduzem à pergunta decisiva: “Também vós quereis deixar-me?” E a resposta pronta de Pedro: “A quem iremos, Senhor? Só Tu tens palavras de vida eterna”.
Hoje, vemos que os judeus caem em si. A condição social de origem não condizia com o reconhecido estatuto de Mestre e, menos ainda, com o seu discurso após a multiplicação dos pães. E, coerentemente, interrogam-se sobre o que está a acontecer: Um artesão de Nazaré da Galileia ser o enviado de Deus? O filho de José e de Maria, bem conhecidos na terra, declarar-se pão da vida? O deslocado de Cafarnaum ensinar, com linguagem dura, “coisas estranhas” na sinagoga? Donde lhe vem tal autoridade? Jesus não entra “no jogo” de pergunta-resposta. Os factos estão à vista, são públicos. A explicação é clara, persuasiva e respeitadora. Em vez de se deixarem atrair por Deus e entrar na novidade que o ensinamento de Jesus comporta, começam a murmurar e “estancam” no seu rígido pensar.
E. Despoints, autor De um comentário a este texto, adianta que a multidão que procura Jesus, saciada com o pão da vida, “questiona-o com insistência. Jesus, pacientemente, os ensina, ajuda-os a vencer as dúvidas para entrar nesta alegria dada: Eu sou o pão da vida”. E adianta: “Como a multidão não hesitemos em expressar a Jesus as nossas dúvidas, as nossas interrogações. Estejamos certos da sua paciência e da sua pedagogia para nos ensinar como fez com a multidão. Sim, digamos-lhe: Senhor dá-nos sempre desse pão. Este pão que nos alimenta para estarmos vivos com a sua parte de mistério e de surpresa. E a surpresa desta semana é a certeza da vida eterna. Vale a pena ousar, não?” Vers Dimanche
Retomando a nossa reflexão, damos conta que a atitude dos judeus constitui uma fase especial na vida de Jesus: é a hora da grande surpresa e interpelante novidade, do anúncio do desejo de ficar sempre connosco no pão novo, na eucaristia do seu corpo e sangue, da doação completa, a fim de que o mundo tenha vida em abundância e qualidade, do envolvimento de Deus Pai na realização plena desta entrega definitiva por amor. Jesus cala os seus sentimentos para nos deixar a possibilidade de os pressentir e auscultar, de os saborear em doce intimidade e proclamar em ousadia profética.
E aí está o registo da história e o testemunho vital dado por tantos cristãos, a confirmarem a riqueza daqueles sentimentos e a dar-lhe rosto em situações tão diversas. Sirva de referência, como “vozes” falantes desta diversidade, São Tarciso, o menino-mártir da eucaristia que o papa Sixto enviava às prisões de Roma a levar a comunhão, Óscar Romero, arcebispo de São Salvador, assassinado por um “pistoleiro” a mando do poder opressor do povo, na ocasião da celebração da missa e recentemente Carlo Danutis, beatificado pelo Papa Francisco e tantos que vão “levar o Senhor” aos doentes e idosos retidos em casa ou lares.
T. Radcliffe em entrevista intitulada “Cristãos, voltem a arriscar tudo” recorre a uma bela imagem para elucidar o funcionamento da comunidade paroquial. ”A missão da Igreja é como a respiração dos pulmões. Respiramos reunindo pessoas na comunidade. As paróquias ainda são comunidades locais importantes onde as pessoas podem descobrir uma casa local. Mas também respiramos para fora, e a Igreja nos envia em missão às pessoas que moram longe. As palavras finais da Eucaristia são ‘Ides!’ Nós somos enviados! Somos enviados para além do local e podemos usar todos os recursos da Internet para nos comunicarmos com pessoas que nunca encontraremos pessoalmente. Assim, respiramos dentro e reunimos as pessoas nas comunidades locais, respiramos fora e nos estendemos aos confins da terra”. Unisinos.
Não murmureis mais. Deixai-vos atrair por Deus Pai e vereis estas “coisas” com um novo olhar – o da fé confiante; compreendereis a relação que entre nós existe e apreciareis o pão que vos ofereço – o meu corpo na eucaristia – para ser o alimento que vos acompanha na vida e revigora as vossas forças debilitadas – continua Jesus a dizer-nos em surdina, para não provocar incómodo desnecessário a ninguém e para despertar os “ouvidos” do coração humano. Sobretudo os nossos!
Pe. Georgino Rocha