Rabanadas
Lá se foram dois dos mais bonitos e vividos dias do ano. Natal e Ano Novo, ambos a fechar o ano, já passaram à história. Esperados ansiosamente e vividos com azáfama à medida de cada um, sempre cheios de tradições, conciliadores e festivos, desta feita suportámos inquietações. Uns respeitando as normas da pandemia e outros, mais afoitos ou irresponsáveis, pondo o pé na argola armados em espertos.
Ficaram aqueles dias como registo de ameaças reais e possíveis, mas logo retomámos a vida a sonhar com os horizontes arejados e saudáveis. Outros Natais e Anos Novos hão de vir para serem gozados em pleno.
Olhando para trás, a minha memória levantou o pano do palco da nossa presença no mundo. Os brinquedos à medida das posses dos pais, os doces mais apetecidos do que os atuais, feitos a granel, ou, melhor dizendo, com outros sabores, os convívios sem televisões e a monotonia das rádios de então, sobrava tempo para as histórias, lendas e adivinhas, regadas, sobriamente, com um cálice de Vinho do Porto, mais para os adultos, que à malta juvenil até provocava tosse.
Recordo, com que saudade, o chá de folhas de laranjeira que a minha saudosa mãe fazia, para desenjoar da doçaria da época, ainda sem bolo rei. Eram rabanadas, filhós, bilharacos, aletria ou arroz doce, mais uma espécie de pão de ló que não faltava nos dias de festa na então aldeia da Gafanha da Nazaré da minha meninice.
Outros tempos, outras vidas, outros ares, outras formas de conviver há uns 80 anos. Daqui a uns tempos como será?
Fernando Martins