quinta-feira, 18 de junho de 2020

Gafanha na Literatura


“É certo que de cada popa se vê um Portugal diferente, conforme a latitude: verde e gaiteiro em cima, salino e moliceiro no meio, maneirinho e a rilhar alfarroba no fundo. Camponeses de branqueta e soeste a apanhar sargaço na Apúlia, marnotos a arquitectar brancura em Aveiro, saloios a hortelar em Caneças, ganhões de pelico a lavrar em Odemira, árabes a apanhar figos em Loulé. Metendo o barco pela terra dentro, é mesmo possível ir mais além. Assistir, em Gaia, à chegada do suor do Doiro, ver transformar em húmus as dunas da Gafanha, ter miragens nos campos de Coimbra, quando a cheia afoga os choupos, fotografar as tercenas abandonadas do Lis, contemplar, no cenário da Arrábida, a face mística da nossa poesia, ou cansar os olhos na tristeza dos sobreirais do Sado. Mas são vistas… Imagens variegadas dum caleidoscópio que vai mudando no fundo da mesma luneta de observação.”

Miguel Torga

In PORTUGAL

Nota: Foto publicada na revista "Aveiro e o seu Distrito", nº 5, para ilustrar um trabalho de Frederico de Moura (Médico e licenciado em Letras - História e Filosofia), intitulado "Apontamentos para um trabalho sobre a paisagem de Aveiro". A foto mostra um batatal na Gafanha. O guarda-sol protege um bebé que deve estar a dormir numa canastra, berço típico das Gafanhas, nos ambientes agrícolas.

Sem comentários:

Enviar um comentário