Reflexão de Georgino Rocha
para o domingo da Transfiguração
A caminho da Páscoa
Jesus proporciona aos seus amigos mais íntimos uma experiência profunda, surpreendente e gratificante. “Que bom estarmos aqui” – diz Pedro em nome do grupo. A experiência inicia-se quando Jesus os toma consigo e, na sua companhia, sobe à montanha. Que terão pensado no percurso, eles que não se haviam refeito do susto do anúncio da paixão e permaneciam abatidos perante o desabar das suas alimentadas ilusões! Confiam mais uma vez no Mestre, acolhem o convite/apelo e lançam-se na aventura. Acontece algo de extraordinário que lhes provoca tal satisfação que Pedro se propõe “armar” tendas, para assim continuarem indefinidamente. Da desilusão ao encantamento!
Era o coração humano a falar, a expressar o desejo intenso de felicidade, a antecipar o sonho de estar sempre com o Senhor. Era a voz da consciência a libertar as aspirações mais profundas que, tantas vezes, permanecem caladas ou são mesmo silenciadas. Santo Agostinho salienta esta marca indelével do ser humano que vive inquieto e peregrino enquanto não encontra Deus e se senta no seu colo de Pai.
Os amigos de Jesus surpreendem-se pelo que vêem e ouvem: rosto cheio de fulgor e vestes repassadas de brancura. O narrador da Transfiguração recorre às imagens do sol refulgente e da luz irradiante para expressar a novidade do que está ocorrendo, imagens simbólicas que apontam para realidades sublimes e originais. Jesus deixa ver a dimensão profunda da sua figura humana de modo que os amigos se deparam com a realidade divina que os deslumbra. E ficam cheios admiração e encanto. Mt 17, 1-9.
“Não estamos perante experiências místicas reservadas a poucos eleitos, observa Manicardi, monge italiano, mas perante a comum experiência de fé do crente, que, escutando a Palavra de Deus, através da fé, vê o rosto de Cristo, toca a sua presença que Ele lhe oferece, saboreia a consolação do Espírito, chora de arrependimento, respira o sopro de Deus, ou seja, consegue viver a sua existência quotidiana, que é existência no corpo, sob a luz transfiguradora da graça”. Que riqueza nos é proporcionada!
A transfiguração do Mestre infunde nos discípulos novo ânimo e renovada esperança. Afugenta as tentações de desistência e abandono. Revigora a força da opção feita de seguir em frente. O testemunho de Pedro, Tiago e João é claro e aliciante: Contemplar o rosto de Jesus é fonte de transformação interior com enormes consequências na vida. “Nascemos com olhos; não com o olhar, observa o autor do comentário da Homilética. O olhar é preciso cultivá-lo, tendo em conta o modo de olhar do Senhor Jesus”.
Seguir em frente, rumo a Jerusalém, onde irão ter lugar os acontecimentos pascais que adquirem sentido pleno com a ressurreição, agora vislumbrada na transfiguração e em tudo o que a envolve. Seguir em frente e acolher a voz de Deus Pai, escutar Jesus, o seu Filho muito amado. Seguir em frente e libertar-se de todos os medos que prostram e inibem, deixar-se tocar pela mão amiga que reconforta e aproxima, erguer o olhar e fixá-lo em Jesus humanizado. Seguir em frente, levantando o ânimo e comunicando entusiasmo, mostrando a bondade e a beleza que há em nós, transformando, em boa notícia, as atitudes generosas de tantos voluntários da vida digna, do trabalho adequado e para todos, do preço justo, do salário “decente”.
Seguir em frente. A humanização das relações pessoais e dos laços familiares, a ética na economia e na política, a cultura da vida e a civilização do amor fazem brilhar, na sociedade, o rosto sorridente de Deus Pai. E a transformação do mundo acontece sempre que o coração se converte e transfigura.
“Os cristãos devem estar na linha da frente, no interesse pelo bem da sociedade em que vivem, afirma D. José Traquina, bispo de Santarém, na sua mensagem para a semana que, hoje se inicia, dedicada à “Caritas é amor”, amor que abraça a todos/as e se deseja atento e criativo. O responsável pela Comissão Episcopal da Pastoral Social e Mobilidade Humana destaca o «amor traduzido no cuidar do outro», amor que se expressa em 100 mil atendimentos em 2019. Este responsável insiste na necessidade de angariação de verbas, na oportunidade de contacto directo com as pessoas necessitadas, com os que dão apoio ou são beneficiárias.
Georgino Rocha