Georgino Rocha |
Jesus acolhe os discípulos no regresso do trabalho missionário. Vêm exultantes. Querem estar uns com os outros e com o Mestre. Trazem boas notícias do que havia ocorrido. Nem era para menos! Sentiram-se com autoridade sobre as forças do mal que lhes obedeciam, sobre as doenças que eram curadas ou suavizadas. Sentiram a eficácia da mensagem que anunciavam. Agora, reconhecem que vale a pena o risco assumido e a pobreza de recursos usados. Agora reconhecem a sensatez dos conselhos dados de gerir bem o tempo face à reacção de quem os recebe. Agora reconhecem que o cansaço é o preço de tão bom desempenho apostólico. E nós, como nos sentimos após os trabalhos que Jesus nos confia e a Igreja, a paróquia ou movimento, reconhece? Com quem fazemos a partilha dessa experiência? Oxalá saibamos procurar e encontrar quem nos acolha, disponha de tempo para nos ouvir e para nos dar o eco da alegria da missão.
Jesus, enquanto ouve os relatos, presta mais atenção aos mensageiros recém-chegados. Dá conta que estão fatigados. E diz-lhes prontamente: “Vinde comigo para um lugar isolado e descansai um pouco”. Merecidas férias, diremos nós. Vamos ver de que estilo, segundo o Evangelho de Marcos 6, 30-30.
A seguir ao trabalho vem o descanso. É a lei universal do agir humano que conhece a verdade do seu ser e é coerente. Assim faz Deus ao dar início à criação. Descansa. Vê que tudo é bom e belo. Visita o casal humano a quem tinha confiado o cuidado da sua obra. Recria-se passeando nos jardins da humanidade, respira a brisa da tarde, relaciona-se com as criaturas, dialoga com os humanos. E aponta-lhes o descanso definitivo na sua morada eterna. Deixa assim impressa a sua marca na história, com o ritmo binário a alternar e a definir as regras do são funcionamento das pessoas em sociedade.
Respeitar e precisar estas regras ajuda a humanizar as relações humanas em todos os âmbitos. Hoje, de forma especial é preciso saber descansar, ter tempos para o repouso revigorante, dispor de locais apetecidos e regeneradores das energias depauperadas. Sobretudo para realinhar o sentido humano da vida, para auscultar a voz da consciência, para dar resposta aos apelos do coração “eterno peregrino” de Deus e do seu amor. Sobretudo para recarregar de energias espirituais “as baterias” que alimentam as razões da esperança que somos chamados a dar.
As pausas para descansar antecipam e ajudam a apetecer os “sabores” do repouso eterno. A Igreja recorda frequentemente este desejo do ser humano e pede ao Senhor a sua bênção de misericórdia. Este é o objectivo final de toda a vida humana que vai sendo realizada, dentro dos ritmos originais revestidos pelas tradições, culturas e religiões. E tantas vezes pelo ordenamento jurídico/legal de povos.
O grupo de Jesus acede imediatamente. Não pede explicações nem faz perguntas. Confia. Diz o nosso texto: “Partiram de barco para um lugar isolado, sem mais ninguém”. Finalmente libertos do “assédio” das multidões, com tempo para si, em viagem de recreio pelo mar de Tiberíades. Com o sonho posto no local onde iriam aportar. A sentir a desejada distensão nervosa e muscular. A usufruir do alívio que vai chegando e tende a envolver todo o seu ser. Tão concentrados vão que nem sequer dão conta que estão a ser acompanhados à-distância pelo olhar de tantas pessoas atraídas por Jesus.
O descanso faz parte da mensagem evangélica bem expressa pelo convite de Jesus também noutras ocasiões: “Vinde a Mim todos os que andais cansados e oprimidos, e Eu vos darei descanso …porque sou manso e humilde de coração… e encontrareis descanso para as vossas vidas” (Mt 11, 28-29). Como é bom aprender a descansar na sua escola para amar a vida e irradiar mansidão e humildade, para se libertar de todas as opressões e fadigas, para estar atento aos outros e dispostos a ajudá-nos na busca do seu bem integral.
O Papa Francisco ergue a sua voz em defesa das multidões exaustas e de tantos que se arrastam na vida “sem pena nem glória”, que se sentem sós e cansados por dedicação de serviço. E aconselha os cristãos a terem uma intenção especial pelos que trabalham na missão pastoral, pedindo: “Para que os sacerdotes que vivem o seu trabalho pastoral com dificuldade e na solidão se sintam ajudados e confortados pela amizade com o Senhor e com os irmãos”. Como os padres, tantas outras pessoas que estão na mesma situação. Rezemos por elas. E, se possível, marquemos presença na sua solidão esquecida.
O barco do grupo apostólico aporta à outra margem. Os discípulos encontram a multidão em rebuliço. Agitada e atraída por Jesus que se compadece visceralmente e “esquece” do que ia para fazer. “Ele viu-os sem pastor e acompanhou-os, viu-os perdidos e liderou-os, viu-os desorientados e guiou-os” afirma Prat Cambra, na Homilética, 2018/4, p. 443. O grupo faz o descanso merecido. Outra missão o espera: A de se fazer solidário com esta multidão faminta, e com Jesus lhe dar de comer. Maravilha! Descansar para servir. Oxalá aprendamos nesta escola de sã humanidade.