Georgino Rocha |
João, o primo de Jesus, tem um nome que significa “o Senhor faz graça”. É filho de Isabel, a idosa estéril, e de Zacarias, sacerdote em idade avançada. O seu nascimento é motivo de alegria para os familiares e vizinhos por o Senhor lhes ter feito tão grande benefício e usado de misericórdia para com eles. Lucas, no seu relato (Lc 1, 57- 66 e 80) narra com pormenores elucidativos a escolha do nome, aquando da apresentação no Templo e da circuncisão do menino e destaca a atitude expectante de quantos ouviam contar o sucedido. “Quem virá ser este menino? Na verdade, a mão do Senhor estava com ele”. Interrogação que, para nós, ressalta com redobrado sentido. Como vivemos as surpresas que a vida nos traz? E com quem as partilhamos? Sinto a alegria do que acontece à minha volta? Depois de responder, posso preparar uma lista e rezar pelas pessoas envolvidas, fazendo circular a solidariedade que nos une.
As circunstâncias da natividade de João denotam uma mensagem singular. Deus não abandona quem n’Ele confia e faz, do que parece impossível, uma oportunidade de sucesso. O nome de João significa isto mesmo: O Senhor manifesta a sua graça, usa de misericórdia, faz maravilhas pelo seu povo, resgata a dignidade humana ofuscada pelos dramas do pensar comum: A esterilidade como maldição, pois não havia filhos, sinal de bênção, como inferiorização na escala da consideração pública e religiosa, como risco de exclusão, de abandono, sem nome nem herança. A libertação deste ferrete social dependia de Deus que age pelas mediações sagradas. As ciências da vida eram ainda muito incipientes nesta área da vida e a morte por parto era algo frequente.
“João, na sua vinda ao mundo, narra a misericórdia de Deus aos seus pais: o seu nascimento é para Zacarias e Isabel dom inesperado que acontece contra toda a esperança e previsão. E a experiência da graça, quando se habita na impotência, infunde coragem”, afirma Manicardi, no seu Comentário à Liturgia Dominical e Festiva, p. 163. Coragem que leva Isabel a tomar a iniciativa de dar o nome de João ao seu filho, apesar do peso da tradição e dos pareceres contrários dos familiares. Coragem de Zacarias que confirma a decisão tomada pela esposa, seguindo a indicação que lhe fora dada pelo Anjo Gabriel no Templo. “Decerto, continua Manicardi, é a coragem que nasce de se ter passado por muitas tribulações, de se ter sido humilhado e posto à prova, chegando-se a conhecer aquilo que na vida da fé é verdadeiramente essencial: a misericórdia de Deus”
O nascimento de João provoca encontros humanos de grande valor simbólico. Familiares e vizinhos visitam Isabel e fazem eco da feliz notícia. Zacarias vê chegado ao fim o “tempo de penitência” pela sua hesitação aquando do anúncio, tempo em que digere com a esposa a desejada surpresa que dá encanto às suas vidas, sente a língua soltar-se e bendiz o Senhor Deus de Israel que visita e redime o seu povo. Maria de Nazaré, a mãe de Jesus, acorre mais tarde a congratular-se com eles pela graça recebida.
Tem vindo a decorrer a semana nacional dos migrantes, a pedido da nossa Conferência Episcopal e, nela, a celebração do Dia Mundial do Refugiado a 20 de Junho, proposta pela ONU. A finalidade deste Dia é contribuir para que se enraíze entre nós a cultura do encontro que se manifesta em atitudes de quem sabe “acolher, proteger, promover e integrar”, lembra o Diácono Francisco Conde dos Santos, responsável pelo Departamento Diocesano da Mobilidade Humana e Turismo. Com esse objectivo, este Departamento em colaboração com as Florinhas do Vouga realizou a iniciativa “Vem e partilha o teu pão”. A semana referida facilita o encontro de pessoas de várias procedências e quer aproximar os que parecem estranhos e distantes, quer ajudar a vencer medos e desconfianças, quer contribuir para o enriquecimento de todos na convergência do bem geral e no respeito pelas diferenças legítimas.
Por sua vez a Cáritas Internacional, que assumiu a animação da campanha “Partilhe a viagem” lançada pelo Papa Francisco em 2017, declara pela voz do seu presidente Cardeal Luís Tagle que é possível “demonstrar com as acções, não com as palavras, o que é dizer cuidar dos migrantes”.
O simbolismo dos nomes abre horizontes à missão de cada um. Lucas, o evangelista narrador, fornece elementos que preanunciam o futuro de João, ele que precede Jesus no nascimento preparará os seus caminhos, será a voz da sua Palavra, o arauto do seu Reino. Ora por contrastes, como o estilo de vida, ora por semelhanças, o relato evidencia a grandeza de João, o maior dos nascidos de mulher que é o menor no Reino dos Céus, como afirma Jesus, seu primo. É que a preparação da festa antecede a novidade da sua realização. E o amigo do noivo cede o lugar ao noivo. Expressões lindas para dizer o indizível: a relação de João com Jesus no plano de salvação de Deus.
“Dar o nome é fazer uma promessa e atribuir uma responsabilidade: viverás a tua vida, viverás em teu nome, realizarás a tua unicidade. Dar o nome é exercer um poder e uma autoridade dispondo-se a despojar-se dessa autoridade e desse poder” atesta Manicardi no citado Comentário. Que alegria e responsabilidade! Que quer dizer o teu nome e que missão encerra para ti? Como a tens vindo a realizar ao longo da vida? Que te propões fazer de hoje em diante? João, o abençoado de Deus, abre-nos o caminho. Avancemos, confiantes!
Georgino Rocha