MaDonA |
O tempo é um bom tema de conversa, pois interessa a todos e qualquer um pode opinar sobre ele. Os britânicos até o usam, na falta de qualquer outro assunto.
Com a chegada da primavera, o sol voltou a convidar aos passeios pelo campo, às atividades de ar livre e às caminhadas pela nossa pitoresca vila. Com o ar lavado do pólen que a natureza explodiu em jorros, sabe bem deambular por entre ruas e ruelas que se cruzam. Os cheiros e sons misturam-se numa sinestesia dos sentidos.
À medida que me solto neste emaranhado de sensações vou-me envolvendo com este e com aquele que me interpela. Um conhecido que me saúda, a quem dou dois dedos de conversa, um antigo aluno que vem cumprimentar a teacher. Algum em quem a semente caiu em terra boa.
Há algum tempo, fui abordada pelo T. que me atirou dois beijos como o projétil de uma bala. Arremessado tinha sido ele de Herodes para Pilatos e a vida madrasta moldara-lhe um temperamento instável. Foi essa a ideia que me ficou dos tempos em que me passou pelas mãos, na sala de aula. Hoje, é um esbelto rapaz em que os traços masculinos são esteticamente harmoniosos.
Apesar da consciência lhe dizer que arreliou a teacher, não o molestaram os ralhetes e as repreensões que recebeu, considerando-os merecidos.
Num belo dia, durante uma caminhada terapêutica pela vila, sou surpreendida por uma bicicleta que para à minha beira. Era o T que vinha das compras “Recebi, hoje, o ordenado e fui comprar umas coisas.” Escutei, com atenção, e exerci o papel pedagógico de qualquer educador, sobre as opções que um jovem dever fazer na vida. Ouvia-me compenetrado, já que sentia afetividade nas minhas palavras. Sentia o aconchego que lhe falta no lar. Lar? Onde está o do T. que confessou, durante a conversa, que não tem ambiente em casa? Estivera sentado num banco, em frente da nossa igreja a ouvir música. Esta com todo o potencial e magia que envolve pode ser a chave para afastar a juventude de caminhos tortuosos que derivam para becos sem saída. Nós, adultos, temos as palavras logo, na ponta da língua, para condenar os desvarios dos outros sem indagarmos a origem dos problemas.
O T. não teve pressa de chegar a casa, seguiu-me com a bicicleta pela mão, apenas para continuar na companhia da teacher, receber aquele naco de carinho. Quando´esta recebeu uma chamada de tlm, até houve o ensejo de receber uma lição de TIC. Pouco habituada ainda com o seu smartphone, aprendeu, ali na rua, algumas funcionalidades que ainda não usara. Um raio de sol iluminou o rosto desta criatura que se sentiu útil e confortado a ensinar quem outrora assumira esse papel. Tinham-se revertido os papéis – agora era ele o mestre e a teacher a discípula. Quem não gosta de se sentir importante? O T. teve ali o seu tempo de antena, o seu protagonismo que faz tão bem à autoestima, sobretudo quando esta está em níveis baixos.
A construção do ser humano é estar sempre aberto a novas aprendizagens e nunca se dar por concluído o processo.
MaDonA
19.05.2018