Reflexão de Georgino Rocha
Jesus inicia na Galileia a sua missão em público. Escolhe esta região intencionalmente. É uma escolha emblemática do seu propósito de anunciar a novidade que traz consigo, o reino de Deus que está próximo. É uma escolha pelas “periferias”, onde se cruzam judeus e romanos, crentes fervorosos e indiferentes, comerciantes e soldados, gente simples, amiga da convivência em paz. É uma escolha pelos socialmente desconsiderados e silenciados, pelo “povo maldito que não conhece a Lei”. A Nicodemos que pede sensatez aos sumos-sacerdotes e aos fariseus (que estavam a ponto de condenar Jesus) estes respondem: “Estuda e verás que da Galileia não sai nenhum profeta”. É uma escolha que se distancia de Jerusalém, a cidade oficial de referência da religião judaica, o centro da vida social e política.
Marcos, que faz o relato deste início missionário, condensa a mensagem de Jesus dizendo: “Cumpriu-se o tempo e o está próximo reino de Deus. Arrependei-vos e acreditai no Evangelho” (Mc 1, 14-20); mensagem que será desenvolvida nos capítulos seguintes; mensagem que visualiza as duas faces da novidade anunciada: A proximidade do reino que Deus nos oferece e somos convidados a aceitar, assumindo livremente as suas exigências. E a confirmação de que o tempo está a esgotar-se. Não há mais delongas. Adiar é opção arriscada. Também para nós. Não percamos a oportunidade de beneficiar da Boa Nova posta ao nosso alcance.
Os pescadores que Marcos nos apresenta escutam a chamada de Jesus e logo o seguiram. A prontidão na resposta põe em evidência a força persuasiva de quem convida e a sintonia de quem escuta, sintonia que se irá afinando ao longo do tempo de convivência e da relação pessoal, da vida em grupo e da superação de quezílias, da partilha de experiências missionárias, de aprendizagem com Jesus a orar a Deus, nosso Pai, de o seguir para onde quer que vá.
E os pescadores do mar da Galieia fazem-se “pescadores” de pessoas, prontos a deixar o circuito estreito das suas rotinas e a embarcar na novidade de Deus, sempre surpreendente na história humana. Hoje, a leitura narra o primeiro episódio desta feliz aventura.
“Pescadores de pessoas” indica a mudança de sentido que a proposta de Jesus lhes faz: O mar será o mundo por onde avança o barco da missão; as redes da captura e o saco de armazenamento abrem-se à força persuasiva do testemunho e da palavra, ao apelo à aceitação, ao amor ao Evangelho e à liberdade enriquecida pela verdade; a brisa e a ondelução das marés cedem lugar ao sopro do Espírito e ao impulso missionário. E eles partem, percorrem os caminhos da história e chegam até nós. Agora é a nossa vez!
“O anúncio cristão, escreve Manicardi, Comentário à Liturgia, p. 93, proclama que Deus, em Jesus Cristo, procura alcançar o homem no seu quotidiano, afirma o primado da iniciativa e da misericórdia de Deus, mas comporta também o pedido das exigências do Reino: conversão e fé. Portanto: mudança de vida, coragem para reconhecer que o caminho que se está a percorrer é errado e voltar, inverter o sentido da marcha; a seguir, fé, adesão a Jesus Cristo, como Senhor da própria vida, da Igreja e da história”.
Os pescadores tém nome, família e profissão: Simão e André, Tiago e João, irmãos respectivamente, Sendo Zebedeu o pai dos últimos. Jesus está nas margens do mar e, como é normal, vai sonhando o futuro, talvez mesmo estabelecendo contornos ao seu projecto. Vive intensamente aquela hora, intensidade expressa no olhar e no apelo/convite ao seguimento. “Vinde comigo e farei de vós pescadores de homens”. Marcos, o autor do relato, anota a prontidão da resposta dos chamados. Jesus necessita de pessoas concretas, prontas para o trabalho missionário, dispostas a ariscar na aventura confiante. Também de mim. Também de ti.
Esta prontidão manifesta que a boa nova estava já no coração e faz nascer os desejos, apreciar as capacidades e dispor-se a ser companheiro de outros, s querer chegar a todas as suas galileias, sem medo. Estava já presente, mas vai desabrochar, crescer e amadurecer na escola apostólica do Mestre e no bom desempenho do mandato recebido.
“A missão que Jesus anuncia é apaixonante e libertadora, exige dedicação plena, entrega, liberdade, capacidade de compaixão e misericórdia”, afirma Miguel Mangas, na reflexão para este domingo. Homilética, 2018/1 p. 38. Para ser exclusiva, esta exigência comporta uma outra, a de nada antepor a Jesus e ao seu Evangelho. E Marcos visualiza esta opção radical no exemplo dos novos discípulos. E o Papa Francisco não cessa de o proclamar, bem como muitos outros rostos de misericórdia. Jesus chama. Também nós, vamos dar-lhe uma resposta pronta e generosa.