Reflexão de Georgino Rocha
Jesus aproveita a oportunidade que a pergunta insidiosa dos saduceus proporciona para mostrar quem é Deus e afirma sem rodeios que é o Deus dos vivos e da vida. Procura assim “configurar” o rosto de Deus Pai, fonte de vida e de felicidade, aliado incondicional de cada ser humano que trata com seu filho querido. Mesmo quanto este vive situações indignas e degradantes, vítima de si mesmo ou de condições sociais e religiosas, consciente da dignidade perdida e desejoso de a ver reabilitada ou resignado na sua passividade induzida.
A pergunta dos saduceus, elite aristocrática de Jerusalém, pretende “entalar” Jesus sobre uma questão delicada: a ressurreição dos que morrem, a relação entre eles, a compreensão da vida futura. Assunto em que eles não acreditam, mas que lhes dá jeito pelas questões que envolvem. E recorrem a um suposto caso de vida em que uma família tem sete filhos que, sucessivamente, vêm a casar com uma mulher que vai ficando viúva à medida que cada um deles morre. Finalmente morre também ela. “A quem pertence no futuro, uma vez que foi esposa dos sete?
Jesus eleva a questão ao seu verdadeiro nível e diz-lhes com apoio na tradição bíblica em que eles também acreditam que Deus é Deus dos vivos, que para Ele todos vivem, que a todos oferece a ressurreição feliz. Fica desmontada a armadilha e esclarecida a verdade a respeito de Deus, do ser humano, da vocação da humanidade: acolher a vida como dom de Deus e missão nossa. A ressurreição não é um regresso, nem um prolongamento da vida presente. É novidade completa garantida por Deus e acontecida em Jesus de Nazaré, que ressuscita após a sua morte de cruz.
Os saduceus aduzem, a seu favor, a lei do levirato ( Dt 25, 5-10) que ainda subsistia no século I. Esta lei não pretendia proteger a viúva, mas garantir a descendência ao marido e defender a herança familiar. O relato é “descaradamente” machista: o “varão” é quem toma a mulher e o que espera dela é que dê à luz. (J. M. Castillo). Trata-se de uma situação humilhante de descriminação. Não há nada mais para a viúva: submeter-se até procriar. Para garantir o nome de família do homem e a sua herança. Situação da mulher que ecoa na história, apesar do silêncio induzido pela cultura imperante. Situação que faz lembrar todas as “periferias” como gosta de dizer o Papa Francisco que, neste domingo, acolhe em Roma os representantes dos movimentos populares e os reclusos em peregrinação jubilar.
Os movimentos populares realizam o seu III encontro mundial em que tomam parte cerca de 200 delegados de 92 organizações que actuam em 65 países e, na celebração final, em que intervém o Papa, cerca de 5.000 pessoas. O seu objectivo principal é a promoção da justiça social, o diálogo sobre o processo de mudança, a intervenção criativa e ousada. A sua meta mais próxima é que todas as famílias possam ter casa, trabalho e terra.
O delegado do Pontifício Conselho da Justiça e da Paz, Silvano Tomasi, afirma que é intenção do Papa “sensibilizar as pessoas sobre a situação dos que vivem nas periferias da sociedade”, particularmente os refugiados e migrantes. São estes os novos rostos dos pobres, dos silenciados, dos instrumentalizados. Como a pobre viúva dos sete maridos.
O domingo, dia 6, é de um significado muito especial, afirma o coordenador nacional da pastoral nas prisões portuguesas, P. João Gonçalves, pois em união com o Papa Francisco viveremos, em alegria e entusiasmo, a misericórdia, como dom e apelo. Vamos a Roma para que o Papa Francisco nos apoie no nosso trabalho e nos estimule. Estamos muito confiantes que faça uma comunicação de fundo que possa, depois, mobilizar-nos para a nossa programação de intervenção nas prisões. Estamos muito esperançados.
“Apelo à consciência dos governantes, declara o Papa Francisco, para que se chegue a um consenso internacional pela abolição da pena de morte e proponho aos que entre eles que são católicos cumpram um gesto corajoso e exemplar: que nenhuma condenação seja executada neste Ano Santo da Misericórdia”.
E prolonga o seu apelo com gestos de inexcedível alcance. “Muitas vezes, revelou Rino Fisichella, arcebispo presidente do Conselho Pontifício para a Nova Evangelização, organismo responsável pela organização dos eventos do Jubileu da Misericórdia, o Papa Francisco esteve em contacto telefónico nos últimos meses com condenados à morte”.
Jesus quer continuar a sua missão, hoje. E fazê-lo por meio da comunidade eclesial que se organiza em serviços e ministérios. Inicia-se, hoje, a semana dos seminários. Pretende como nos recorda o nosso bispo, António Moiteiro, avivar a certeza de que o Seminário é “o coração da Diocese”, e representa para a Igreja local um dos bens mais preciosos… Exorto a todas as famílias e comunidades a deixarem-se mover pela misericórdia de Deus, tendo em vista as necessidades do nosso Seminário, mesmo as de ordem material.
Os apelos aos vivos do Deus da vida são muitos e interpelantes. Abramo-lhe o coração! E demos as mãos.