Reflexão de Georgino Rocha
Este apelo convite surge na parábola do banquete narrada por Jesus na conversa à mesa com um fariseu que o havia convidado a tomar uma refeição em sua casa. Constitui uma espécie de resposta às atitudes dos comensais que buscam os primeiros lugares, sinal ritual da importância social e religiosa de cada um. Serve de contraponto e realça valores fundamentais a quem pretende ser discípulo e fazer parte da comunidade dos que o seguem. Define claramente as pautas da “corrida do cristão” na sociedade actual, da escala de valores a promover e das atitudes a vivenciar.
Estar à mesa e comer juntos tem um grande significado familiar, social e religioso: encontro amigo e fraterno, conversa e partilha de notícias e saberes, reforço de laços de proximidade, afirmação de estima mútua e de próxima ou igual categoria. Assim o entendiam todos os participantes. Por isso se observam mutuamente. Certamente com segundas intenções. Jesus não foge à regra, como o demonstram as parábolas, hoje, narradas.
A elaboração da lista dos assentos é delicada. Ainda hoje. E os organizadores manifestam a relação que cultivam com os convidados e a importância social que lhes reconhecem. Um engano pode ser fatal. O acerto na escala de distribuição faz transparecer a harmonia do conjunto em festa, a alegria e boa disposição de cada um, o reconhecimento da escala social que lhe é atribuída.
A procura dos primeiros lugares denota elevada autoconsideração e outros sentimentos superiores que nem sempre são aceites nem confirmados pelos outros participantes. Realça critérios pautados por interesses elitistas e clubistas. Constitui uma amostra de uma sociedade desigual, sem espaço nem abertura para os de fora, os filhos de ninguém. “Não posso aceitar a sua oferta, que agradeço, porque não tenho com que retribuir” – responde a mãe de uma criança a quem lhe oferece lugar no carro pessoal porque não havia já lugar para ela no autocarro comunitário da paróquia que ia em excursão. Que prurido estranho!
Na comunidade de Jesus as atitudes devem ser diferentes, convergindo todas na humildade e na verdade, na gratuidade e no amor desinteressado, na atenção preferencial e delicada ao esquecido e abandonado. Assim se manifesta a situação nova em emergência, o reino de Deus. Assim se abrem as janelas do futuro definitivo de toda a humanidade.O projecto de Jesus propõe-se transformar a “sociedade desigual”, acabar com a distinção de nobres e plebeus, desfazer a escala de primeiros e últimos, dar para receber, preterir o gratuito face ao interesse. A auto-estima moderada harmoniza-se com a humildade sincera e gratuita. O respeito pelos outros nasce da verdade pos si mesmo.
“Amigo, vem mais para cima”. Jesus faz uma proposta subversiva: atender a quem não pode corresponder, amar a quem não pode retribuir. Os cristãos, seus discípulos, assumem alegremente esta proposta e ficam encarregados de a viver e transmitir numa sociedade tão assustadoramente discriminatória. Vamos alinhar na corrida dos primeiros segundo os critérios de Jesus.