de Georgino Rocha
Georgino Rocha |
«O amor a Jesus concretiza-se
em atitudes e gestos de serviço
e misericórdia»
Jesus está a despedir-se dos seus apóstolos. Diz-lhes as confidências que guarda para a hora derradeira. João, o evangelista da narração, faz deste momento uma bela construção literária e teológica em que vão surgindo perguntas dos amigos preocupados e curiosos. Após Simão, Tomé e Filipe, surge Judas não o Iscariotes com a sua: “Senhor, porque vais manifestar-Te a nós e não ao mundo?” A resposta de Jesus está centrada no amor de quem guarda a sua palavra, na promessa do Espírito que recorda e ensina, no dom da paz que liberta e serena a perturbação do coração.
Os discípulos fiéis constituem agora a manifestação de Jesus. Em todas as circunstâncias e lugares: sendo homens/mulheres de palavra cimentada no Evangelho e iluminada pelos ensinamentos da Igreja, dando testemunho de honradez cívica e de rectidão ética, cultivando o olhar do Espírito Santo em relação às pessoas e aos acontecimentos, enraizando cada vez mais a fé em Jesus ressuscitado que se “esconde” nos sinais dos tempos e nas formas discretas da sua presença.
O amor a Jesus concretiza-se em atitudes e gestos de serviço e misericórdia: dar a vida, alimentar quem tem fome, perdoar ofensas e estar disposto a receber o perdão, curar feridas emocionais ou físicas, ser paciente e bondoso, terno e misericordioso. Como a Mãe de família, que precisamente hoje é evocada e homenageada! Como tantos outros que conjugam a sabedoria, a firmeza, o espírito construtivo, o serviço desinteressado, a presença activa no mundo da cultura e da política. São espelhos do rosto de Cristo, revestindo-se de paciência e confiança. Que o digam os trabalhadores, hoje em festa pelo seu Dia Mundial e em luta por uma profissão digna e estável.
Os cristãos cidadãos não são seres solitários nem estão abandonados. Jesus promete-lhes o envio do Espírito Santo. E cumpre, como a Igreja celebra no dia de Pentecostes. É Ele que dá alento e força para prosseguirem a missão de Jesus e realizarem a obra que o Pai lhe confiou: crescer no meio dos limites, procurando as suas energias potenciadoras, gerir tensões portadoras de desafios de superação e de gestação de situações mais humanizadas, participar na busca da verdade em diálogo com outros, exercer o discernimento prático da proposta mais adequada e organizar os recursos indispensáveis para que a decisão tomada se torne efectiva e oportuna.
O testemunho das primeiras comunidades é, a este propósito, notável e aliciante. Uma tensão forte surge entre os cristãos, tão forte que provocou “muita agitação e uma discussão intensa”. A questão girava à volta do que era preciso para ser cristão: fazer-se judeu e praticar os correspondentes ritos? Aceitar Jesus como Salvador e fazer-se baptizar, entrando na comunidade e levando uma vida coerente, sem distinção de raça ou nação? Sem passar pelo ritual judaico.
Paulo e Barnabé e outros discípulos da igreja de Antioquia vão a Jerusalém apresentar o diferendo. O impasse era grande. As posições pareciam atingir os limites. Era urgente uma intervenção decisória. O enfrentamento resolve-se numa assembleia que segue um processo que fica como referência histórica: convocam-se os envolvidos, escutam-se as diversas posições que suscitam “uma longa discussão”, Pedro, Paulo e Barnabé dão testemunho do que lhes havia acontecido e Tiago, a maior autoridade na Igreja de Jerusalém, também se pronuncia. Com todos estes elementos, chegam à conclusão que consignam na carta a enviar aos irmãos perturbados e perseguidos. Carta em que surge a solene afirmação: “Decidimos, o Espírito Santo e nós…”. E fazem chegar a Antioquia e, depois,, às comunidades eclesiais de outras cidades o que havia sido resolvido.
Que bom seria que em todas as instâncias de decisão se tivesse em conta as referências do “concílio” de Jerusalém. Que ousadia, liberdade e segurança poder viver na certeza de que as nossas decisões são as do Espírito e têm o seu selo de identificação.