Reflexão de Georgino Rocha
brilhará para sempre»
O domingo de Ramos constitui o pórtico da Semana Santa. Apresenta e celebra a Paixão gloriosa de Jesus. Faz ver as duas faces desta realidade histórica: a chegada à cidade de Jerusalém e o processo de condenação organizado por judeus e por romanos. Os rostos são muitos, embora os nomeados sejam apenas os que detém funções especiais: Lucas, o narrador do acontecido, recorre à sua fina sensibilidade e grande capacidade de observação e dá uma dignidade sóbria aos intervenientes e regista o alto sentido de cada passo daquele processo. Nele vão desfilando, um após outro, rostos em que o leitor se pode rever, por vezes, com grande precisão e clareza. Como num espelho. Nele se refletem os que, ao longo da história, sofrem o penoso calvário a que são são forçados: perseguidos, espoliados, indesejados, descartados.
Jesus mantém sempre uma postura digna e eloquente. A Judas que o beija, admoesta suavemente, denunciado a intenção do seu gesto; aos discípulos que pretendiam defendê-lo com violência armada aquando da prisão, ordena-lhes que guardem as espadas e aponta-lhes o proceder pacífico de Deus Pai; a Pedro que o nega três vezes sucessivas, olha-o com tanta ternura que o faz chorar lágrimas de arrependimento; ao soldado que o acusa e esbofeteia pelo que disse à autoridade, devolve a pergunta que busca a verdade; a Herodes envia uma mensagem desbloqueadora de manhas e interesses; a Pilatos, confirma a afirmação do que diz a respeito da realeza ( não de poder, mas de serviço).
Cruzam-se outros olhares no caminho do Calvário: o cirineu que instado a ajudar Jesus pega na cruz com determinação solidária; as mulheres de Jerusalém que condoídas pela figura do condenado choram em público lágrimas de compaixão a que Jesus corresponde dando um novo sentido; o bom ladrão que reconhece a malvadez das acusações contra Jesus e proclama a sua inocência, recebe a feliz promessa de vir a estarem juntos na vida futura; o centurião que ao ver a novidade do que ocorria faz uma expressiva profissão de fé; José de Arimateia e Nicodemos, homens justos e bons, acolhem os restos mortais e dão-lhe sepultura condigna; as mulheres que o acompanhavam têm a dita de testemunhar o enternecedor testamento final de Jesus: “Mulher, eis aí o teu filho”, afirma dirigindo-se a Maria e a João, o discípulo amado; e prossegue: “ Eis aí a tua Mãe”.
E a cruz ignominiosa erguida no Calvário transforma-se em cruz gloriosa em que o amor de doação total brilhará para sempre. E nela se podem rever todos os que pretendem amar ao modo de Deus vivido tão intensamente por Jesus.
Por isso, como diz o Papa Francisco: “Se nós queremos conhecer «a história de amor» que Deus tem connosco é necessário olhar o Crucifixo, sobre o qual está um Deus que se “esvaziou da divindade”, se “sujou” de pecado para salvar os homens”. Bela direcção do olhar contemplativo que pretende penetrar neste jeito novo de amar.