Uma reflexão de Georgino Rocha
A causa dos outros, a nossa, é a razão de ser da missão de Jesus. Assim o afirma ele ao explicar aos discípulos o sentido da voz vinda do Céu que dizia: “Já o glorifiquei e tornarei a glorificá-l’O”. Jo 12, 20-33. Deus Pai intervém a favor do seu Filho que está perturbado pelo iminente e dramático desfecho da vida. São João, o narrador do diálogo, menciona uma série de interrogações que perpassam na mente de Jesus: “Que hei-de fazer? Pai, salva-me desta hora?” E conclui: “Mas por causa disto é que cheguei a esta hora. Pai, glorifica o teu nome”. É a hora de Deus!
A Igreja assume e professa no credo da missa – o de nicea-constantinopla – esta mesma convicção: “Por causa de nós homens e da nossa salvação desceu dos céus”. A mensagem cristã vive, celebra e transmite o sentido de tudo quanto acontece em Jesus Cristo e é confiado aos seus discípulos para realizarem. A Igreja surge como Igreja voltada para os outros, tendo como referência a humanidade e, nela, os preferidos de Deus, os sobrantes da sociedade, os sem voz e sem nome, os malditos da lei e contagiosos intocáveis, “as periferias existenciais” em todas as suas dimensões. O centro da sua instituição é a missão, a solicitude não apenas pelos pouco que ainda restam “no redil”, mas por todo o mundo que é preciso refazer – desde os seus alicerces, a fim de deixar de ser selvagem e se torne mais humano, isto é, mais conforme ao projecto sonhado por Deus, Pio XII,
Por nossa causa, Deus glorifica Jesus através dos sinais da sua vida pública: o vinho novo das bodas de Caná, a saúde recuperada do filho do funcionário imperial, a cura regeneradora do paralítico, a multiplicação do pão partilhado, a caminhada matinal sobre as águas, a vista dada ao cego de nascimento, a vida restituída a Lázaro, seu amigo, o lava-pés aos apóstolos na ceia de despedida. São sinais claros da glória de Deus que resplandece no agir de Jesus de Nazaré e que nós somos convidados a compreender e a actualizar. Os preferidos de Deus marcam o centro da missão da Igreja, de cada comunidade cristã, de cada baptizado honrado e coerente. Avivemos a nossa fé e deixemos que a glória de Deus brilhe no nosso proceder. Que alegria e responsabilidade!
Por nossa causa, Jesus ultrapassa a perturbação interior dos seus sentimentos e vence a tentação que, mais uma vez, o assaltava. E vai em frente. A promessa da voz vinda do céu será cumprida. Deus Pai glorificá-lo-á nos acontecimentos da paixão, morte e ressurreição. A cruz infamante faz-se cruz vitoriosa, florida. A morte aniquiladora cede lugar à vida nova do ressuscitado. O servo desprezado e aniquilado é agora credenciado como o Senhor da glória. A sua opção pelos “feridos da vida” é definitivamente confirmada e elevada a credencial do amor de Deus Pai pelo mundo. Que felicidade poder ver estes sinais no seu sentido profundo!
Também nós, como outrora, alguns gregos, “queremos ver Jesus” e dirigimos o nosso pedido aos sucessores de André e Filipe, à Igreja e a todos os que nela exercem funções de responsabilidade.
Queremos ver e glorificar Jesus na pessoa que se cruza connosco, nos caminhos da justiça e da solidariedade, na prática da misericórdia e do perdão, na doação generosa que, morrendo, gera vida nova, como o trigo lançado à terra. A sementeira da primavera antecipa e garante a futura seara de pão abundante para todos.